MORRO E NÃO VEJO TUDO
Esse título não vem de um lamento pessoal e nem é para fazer afirmações de estranhezas, de modo geral. Vem de uma constatação perfeita que ainda não tinha me dado conta. Impossível morrer só depois de tudo ter visto, tido, sentido, passado e sofrido. Como não percebi isso antes? Apenas me dei conta quando recebi de um precioso amigo, estimado as pampas, autor da frase “morro e não vejo tudo”, um perfeito “estudo proctológico”, no dizer dele, mas que me pareceu transcender esse caráter científico. E observando atentamente cada “capítulo” desse, digamos assim, formidável e memorável trabalho - algumas pessoas, que também já o viu, usam adjetivos bem mais cheios de entusiasmos - deparei-me com um curioso e sutil detalhe que transcende o objetivo do referido estudo, e, portanto, de seu caráter científico. Com contida ironia posso afirmar que se trata da incomum e talvez individual distância existente no intervalo entre dois pontos significativos e de preciosa utilidade; o anus e a vagina. A distância não é a mesma. Cada indivíduo, fêmea certamente, apresenta distâncias distintas entre esses dois necessários e estimados orifícios. Essas distâncias variam de um a sete centímetros, sendo essa a mais comum em praticamente 90% dos conjuntos de orifícios verificados. Como podem os seres humanos serem tão iguais em sua estupidez, em sua audácia, em seus sentimentos, e serem tão diferente em pequenos detalhes que se agigantam diante de olhos atentos e surpresos! Aos que estão habituados a contemplação à curtíssima distância, o comprimento do intervalo entre um e uma, ou entre a e o, pode não ser perceptível dada a essa proximidade do observador. Todavia ao ser contemplado com olhos de langor, à distância mais comumente utilizada para observação enquanto são exercidas outras atividades, o intervalo não tem nenhuma relevância científica, nem técnica. Mas, sim, estética e, principalmente, funcional. Esse intervalo, ponte de ligação entre pontos com funções primárias específicas, mas apreciadíssimos para a prática descontraída e desobrigada de momentos inesquecíveis, é de inestimável importância quando se busca um ou outro ponto de seus extremos, às cegas. É ele que orienta se é mais embaixo ou se mais em cima que deve dirigir-se o interessado. A expressão “o buraco (forma grosseira de tratar um dos orifícios ligados pelo intervalo aqui tratado) é mais embaixo” origina-se do peculiar e variável comprimento desse intervalo que determina a distância. O alerta, portanto, é como um farol invisível, porém, sonoro e de relevante importância; tanto que serve de metáfora para outros alertas e veladas ameaças.
De fato, morre-se e não se vê tudo. Porém há sempre uma nova descoberta a cada dia; essa, por exemplo. Quantas pessoas, em todas as partes desse mundo, têm avaliado mal o tamanho desse “intervalo” em momentos decisivos e se lançado em furioso e incontrolável avanço sem saber que “o buraco é mais embaixo”? E por isso ter errado o rumo, muitas vezes irremediavelmente, indo agasalhar-se em outro aconchego? Erro que, felizmente, pode tornar-se opção, em outras ocasiões, como variáveis anti-rotina.