Centena de trilhão
A felicidade é cara e deve ser vivida discretamente.
A felicidade é uma espécie de pequena soma total momentânea quando não convertemos a felicidade em seriedade. Ficaria feliz com muito dinheiro? Era para cada qual ter uma vez na vida a sorte grande obtida pela lâmpada mágica do cartão nominal contendo três bilhões.
Nem vou parcelar a imaginação. Procuro a base do sistema de felicidade composto pelo hedonismo dosado com “aproveite seu dia!” (carpe diem) invocado de Horácio. O gerente olharia para a ordem da transferência murmurando “estamos ricos!”, participando do sonho.
Seus olhos multiplicaram mulheres, cigarros, danças, sorrisos enfeitados de vitória.
Três bilhões pularam da imaginação para o seu efeito de soma bombástica em sujeito sempre subtraído. Mal a gordura começava e logo cediam em taxas, tarifas, impostos, remédio para gastrite e até motéis cor de laranja. Assim que se convertem as unidades das diferentes ordens na mais doce e pura filosofia. (Utilizaria o palavrão mais próximo em lugar da mais “pura” filosofia).
Senhor é claro... Como valor expresso se tem mais oportunidades... Para receber do alto, três bilhões, desta maneira segura, sem nenhuma contrapartida, este prêmio adorável da garrafa onírica... Tossiu: O senhor agora possui três bilhões. Acanhei o sonho. Daria para obter um cavaquinho novo.
De volta ao tempo real observo a garrafa repleta de promessas compostas de lúpulo, malte e cevada. Únicos gênios reais na ausência de três bilhões. Se eu, mero mortal, cumpridor de horário, ganhasse “três bilhões”... Ouviria vozes infinitas da central de máquinas da felicidade trabalhando para mim.
A felicidade tem menor tempo específico na pobreza, pois quase de imediato ocorre a voz moral que começa a nos despir ainda mais no frio. Se ao menos um pingo de comunismo pingasse no iludido... Quem lhe daria um centavo, quanto mais três bilhões. Pequeno burguês diante do deslumbramento doentio pela felicidade a custo de três bilhões... Ó mesquinho, mísero e vil criatura! Esqueces a dureza da vida porque tens o desejo intrínseco de possuir três bilhões.
Escravo sem tempo para desculpar a felicidade composta de nova condição sofre até em condições de êxito. Os amigos então me tratariam com rigor. Talvez os mais camaradas compreendessem a dor que leva o sujeito a desejar automaticamente três bilhões. O Supremo Tribunal federal olharia lá do alto e diria: sim, é seu, pode pegar esses três bilhões. Você ganhou honestamente. O governo não deveria tomar para si o dinheiro dado de mãos beijadas. Nunca. Nunca se sabe, tinha medo até de sonhar.
Lícito sem ilícito. Sujeito desconhecido (mas por acaso é proibido receber dinheiro anônimo?) enviou para o cavalheiro X a soma de trêa bilhões. De alguma parte da terra resolveu a bondade me dar três bilhões. Certa mocinha da imprensa me procurou para a seguinte pergunta, bem pontual e direta: Queres a paz na felicidade sensual? Bonitinha. Balangando brincos de ouro. Certas frases exigem circunspecção. Firmeza de caráter. Sim, levaria dezenas de mulheres para a Rua Aura da Piedade, 8025. Escolheria as alegres, com risinhos, carinhos bobinhos, tatuadas que dançam. A Festa de Lingerie duraria alguns meses. Essas coisas boas herdadas por mim de um grande nomadismo. Depois, quem disse que estaria ferrando alguém no caso da posse doada de três bilhões? Por quê? Alguém realmente poderia me dar três bilhões se quisesse? Provavelmente para provar que pode me dar sem nada em troca. O que diz a legislação do meu país?
Com três bilhões eu deixaria o hospital público remodelado, esperando por mim novamente enquanto atendesse os demais.
Eu, Ricardo, ajeitaria a vida de muito sorriso heróico advindo do fracasso. Essa fome nutritiva dos “Três bilhões” que bate na gente, rende ao sonhador, dias de euforia. Como quem espera do jogo um breve cartão de possibilidade.
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