MACHADO NA HISTÓRIA - PARTE II
Ah, o eterno MACHADO... Conhecer a obra de MACHADO DE ASSIS é viajar na máquina do tempo... e voltar ao Rio de Janeiro do século XIX. ELE foi jornalista, poeta, teatrólogo, contista, cronista, romancista, tudo, enfim (não, dentista era o alferes sonhador de Ouro Preto, no século XVIII, e futebolistas famosos são centenas!)... uma das expressões máximas da nossa literatura. Foi redator e fazia a cobertura do Senado, mas não anotava coisa alguma, gastar papel e lápis com quem muitas vezes não merecia? - guardava de cabeça nomes, roupas e depoimentos que só depois relatava quando chegava à redação do Diário do Rio de Janeiro - sete anos ali. Casou com uma moça que gostava de poesia e literatura. Grande cumplicidade! Bom, é que sem asa não é xícara... casados por 35 anos felizes. ----- Com traços românticos e tentativa de um primeiro romance psicológico, "Ressurreição" (1872), a dúvida de um indeciso amoroso, e depois "Iaiá Garcia" (1878), ambiente familiar no Segundo Reinado, consciência moral, fato exigente para personagens de MACHADO DE ASSIS. ----- AH, Brás Cubas! Publicado em folhetins na Revista Brasileira entre março de 1879 e dezembro do ano seguinte, livro em 1881. E as interrogações polêmicas de editores e leitores: romance? - e escrito ao contrário, da morte para a vida, de trás para a frente? - tom irônico e sarcástico n estória em primeira pessoa de um... autor defunto ou defunto autor? ----- "Quincas Borba" foi melhor recabido em 1891, já dois anos de República, mais rico de substância humana, estória do coitado Rubião que perdeu a fortuna, o amor e a razão - oh, sem dúvida alguma, "ao vencedor, as batatas". ----- Até hoje existem Bentinhos ciumentos imaginativos sobre a Capitu das suas casas... ----- Contou também sobre personagens atemporais - eternos! - mesclados a fatos históricos temporais e lugares por onde passou, sem sair do país. Nasceu no primeiro dia de inverno, 21de junho, o que implica na 'reclamação' da minha braba AMIGA carioca Geminiana porque é uma data um tanto duvidosa, discutível, em alguns horóscopos último dia de Gêmeos ou primeiro dia de... ----- Em janeiro de 1897, fundou a Academia Brasileira de Letras - a ABL -, ocupando a cadeira 23, patrono JOSÉ DE ALENCAR (escolheu de propósito!), figura que ELE muito apreciava, e foi o primeiro (grande mérito) presidente - o edifício-sede é uma réplica do Palácio de Trianon, de Versalhes - França. ----- Ironia e pessimismo caminhando juntos no escritor - mesmo personagem que ressalte o lado negativo da vida, carrega sempre /como todo bom brasileiro/ uma relativa dose de (às vezes bom) humor... Brás Cubas, humor negativo e amargo. Bentinho tornou-se por conta própria um velho solitário amargo e resmungão, um casmurro, melhor dizendo, que tenta resgatar sua estória... Conflito de triângulo amoroso? Ambiguidade? Mais tarde, NELSON RODRIGUES, também teatrólogo, irá 'secular' a frase "perdoa-me por me traíres". ----- Subvertendo as características doces e suaves dos romances da época, apesar de ter transitado pela escola do Romantismo (mulheres em papel de dependência), suas figuras femininas são fortes, objetivas e decididas, diante de homens frágeis que se deixam dominar por elas... e como deixam! (ELE já previa a onda universal de feminismo no século XXI?) Elas conduzem a ação... Em "Ressurreição", por diferença de temperamentos, parte da moça a quebra de compromisso. Em "A mão e a luva", a heroína escolhe racionalmente quem lhe satisfaça as ambições. A heroína Helena (nome forte para o novelista MANOEL CARLOS, o MANECO) frauda sua identidade para receber parte de uma herança e acaba se apaixonando pelo falso irmão. Em "Iaiá Garcia", a personagem mais atuante promove a felicidade dos que a cercam. na fase realista/naturalista, tempo dos estudos da consciência do homem através de seus personagens, eis Capitu, sensual, "olhos de cigana oblíqua e dissimulada", a mais emblemática pela dúvida ao longo da narrativa, tendo seu lugar assegurado na nossa história (agora, com agá) literária, personagem atemporal do mundo urbano burguês que se pode encontrar em qualquer família - ainda adolescente, seduziu o galã, 'quase' (ou já era formado?) doutor advogado. Virgília, assumidamente adúltera, e daí? Sofia leva Rubião no lero-lero... até abandoná-lo na ruína. Em "Memorial de Aires", último romance do escritor carioca, Fidélia renuncia à viuvez e casa novamente. ----- Euzinho /cauteloso-temeroso-desconfiado.../ não gostaria pessoalmente de encarar nenhuma destas mulheres, ao vivo e em cores, expressão popular, com ou sem cores. ----- MACHADO é o queridinho dos cineastas (cinema, 'sétima arte', expressão mais sofisticada), estórias adaptadas de forma literal ou, num duplo sentido, com roupagem e roupa moderna. (Imaginem Capitu num bustiê dourado e jeans apertado.) Sim, porque os temas são eternos - amor, ambição, adultério, nas rodas de tagarelices úteis ou inúteis, entre amigos... espelhados inimigos (eu sou você, ao contrário). Fina ironia e dramas presentes em todas as estórias. Não há limites para a criatividade na tela........ ----- Alguns poucos exemplos (há muitos mais!): "Capitu", de PAULO CÉSAR SARACENI, 1968. // "O Rio de Machado de Assis", de NELSON PEREIRA DOS SANTOS, 1965, curta de 13 minutos, depois "Azyllo muito louco", 1971, baseado como ponto de partida no conto "O alienista", desenvolvimento livre, objetivo falar sobre quem é louco e quem não é, estória de um padre que ganha antipatia dos poderosos de uma província à beira-mar, por construir um asilo para loucos, e "A missa do galo", do conto homônimo, 1982. // "Memórias póstumas", de ANDRÉ KLOTZEL, 2001, que abre com o cadáver sobre o qual se fecha a tampa do caixão, vem a cena do enterro e o defunto abre diálogo com a plateia sobre o trocadilho 'autor defunto, defunto autor'. // "Dom", de MOACYR GOES, 2003, que conta a estória do engenheiro Bento que vive uma rotina confortável em São Paulo - trabalho, casa, noiva que o ama - e a vida se transforma quando reencontra o amigo Miguel e Ana, seu amor de infância - acaba o noivado, reconquista Ana, porém é dominado pelo ciúme e por um machismo voraz, desentende-se com a mulher após o nascimento do filho. // "A cartomante", de WAGNER ASSIS e PABLO URANGA, 2004, mesmos personagens Rita-Camilo-Vilela, dias atuais. // "Quanto vale ou é por quilo?", de SÉRGIO BIANCHI, 2005, livre adaptação do conto "Pai contra mãe", do livro "Relíquias da casa velha" e das "Crônicas históricas do Rio de Janeiro", de NEREU CAVALCANTI. // "Brás Cubas", de JÚLIO BRESSANE, 1985, imagens ousadas, esqueleto deitado, microfone no orifício do olho - "A erva do rato", 2008, relação de um homem com a morte, filme inspirado nos contos "A causa secreta" e "Um esqueleto".
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LEIAM meus trabalhos sobre INTERTEXTUALIDADE.
NOTAS DO AUTOR:
No 'resistente' prédio do antigo Senado, construído em 1819, antigo Palácio Conde dos Arcos, tempo de D. Pedro I, muito visitado por Pedro II, funciona a Faculdade de Direito da UFRJ. --- Num tempo de bota-antigo-nisso, uma das provas finais no curso primário era declamar o soneto machadiano "A Carolina" de 1904 - "Querida, ao pé do leito derradeiro........." --- Cemitério da nobreza, bairro de Catumbi - sexta-feira de agosto de 1869, 2 da tarde, pneumonia, apenas 11 amigos no enterro de Brás Cubas. --- Capitu - nome de personagem, duplo comportamento, numa novela de Manoel Carlos, "Laços de família". --- Sétima arte - termo usado para designar o cinema estabelecido pelo intelectual italiano Ricciotto Canudo no "Manifesto das sete artes", em 1912, publicado apenas em 1923, após música (som), artes cênicas (teatro/dança/coreografia - movimento), pintura (cor), escultura (volume), arquitetura (espaço) e literatura (palavra) --- cinema (audiovisual) contém várias artes anteriores --- posteriormente, fotografia (imagem), HQ (cor, palavra, imagens), video games (elementos de outras artes) e arte digital (artes computadorizadas).
FONTES:
"Histórias de todos os gêneros" e "Mulheres conduzem a trama" - Rio, SME, revista NÓS DA ESCOLA, n.59/08 --- "O preferido pelos cineastas" - Idem, n.64/08.
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