Decepcionado com a Igreja
Decepcionado com a Igreja
Jurandir é filho de mãe luterana e de pai católico-romano. Seus pais - típicos pagãos batizados -, não se importavam com educação religiosa, mas achavam que disciplina erra fundamental ao pequeno Jura. Assim, foi matriculado numa instituição religiosa mantida por freiras franciscanas para cursar o primário e parte do ginásio. As freiras eram rígidas nos estudos e em questões disciplinares e foi lá que Jura teve, também, as primeiras lições de que não se deve procurar por caridade nem por amor ao próximo no seio da santa madre Igreja.
Jura foi crescendo, chegou o dia de sua primeira comunhão e, tempos depois recebeu o sacramento do crisma - ou confirmação -, como preferia a mãe. O jovem Jura mantinha-se orbitando em torno da paróquia que frequentava e, logo, foi chamado pelo pároco para servir como coroinha. Nem precisou de muito treinamento, pois em casa, já encenava suas celebrações, improvisando uma túnica com uma saia velha da mãe.
Jura era assíduo, pontual e dedicado. Servia com vontade e devoção. Quando caminhava pelo presbitério, fazia-o com reverência e ar circunspecto. Os mais idosos se encantavam com a vocação do Jura e comentavam entre si “esse jovem dá pra padre”.
Depois de muitas idas e vindas, Jura conversou com seu pároco – que já era outro – para tratar de sua vocação sacerdotal. Os dois concluíram que ele deveria se apresentar ao bispo, como candidato às sagradas ordens. Assim foi feito e Jura passou a integrar o programa propedêutico.
Até então, seus pais estavam tranquilos pois isso seria mais um dos modismos do Jura. Logo, logo, desistiria. Mas foram surpreendidos quando Jura lhes disse que, no ano seguinte, passaria a cursar filosofia seminarística. A expressão do olhar do pai era traduzia algo como “preferia o Jura nas drogas, do que na Igreja”. Mas Jura já era maior de idade e teria de assumir as consequências das suas decisões.
Muita coisa mudou durante os anos de filosofia. Jura não era da periferia, tinha carro e um certo padrão de vida. Seus colegas de faculdade eram, em sua maioria, recrutados de regiões mais carentes onde imperava forte viés ideológico. Os padres-professores eram em sua grande maioria comunistas. Jura tinha notado que a retórica sobre democracia, diálogo e inclusividade que imperava pelos cantos da faculdade significava “democracia é o que nós achamos certo; diálogo é seguir o que nós queremos; inclusividade é um tudo-pode”. Jura era sistematicamente perseguido pelos colegas e padres, por não se alinhar com a ideologia predominante.
Depois da filosofia veio a teologia. Como seus superiores não tinham motivo para exclui-lo criavam situações insuportáveis para que ele pedisse para sair. Jura também notava que havia seminaristas e padres gastando do dinheiro da coleta, frequentando saunas gays e mantendo namorados. E os superiores só sabiam repetir: “a Igreja é santa, mas os homens são pecadores”.
Antes de concluir o curso de teologia, Jura largou tudo. Não conseguia mais entrar numa Igreja sem se lembrar dos escândalos de pedofilia envolvendo padres, bispos, a cúria. Um nojo!
Recuperado do choque, Jura decidiu que deveria processar a Igreja. Processá-la por discriminação. Jura nunca foi molestado por um padre ao longo desses anos todos! Como pode?