O Encontro
O Encontro
Ângelo era aposentado, já com boa idade. Morava numa casa assobradada junto com alguns familiares. A convivência oscilava entre satisfatória e boa. Ângelo não era de se meter em assuntos alheios e tinha temperamento dócil. Era disciplinado. Gostava de acordar cedo, em qualquer época do ano, e preparava seu café da manhã, sempre muito simples. Depois, recolhia-se para ler ou ia ao computador para se atualizar sobre o que corria pelo mundo afora. Também respondia mensagens no celular.
Cuidava, com esmero, do jardim na parte da frente da casa: removia folhas mortas e galhos secos, examinava cada planta para detectar alguma praga. Abria caminho para as trepadeiras poderem se alastrar. Aqui e ali fazia pequena poda para, por último, regar tudo com água decantada. O jardim, embora de pequeno porte, era exuberante porque recebia cuidados diários e, segundo Ângelo, tudo respondia porque ele falava com as plantas uma linguagem de amor.
Emitia dezenas de bom-dia diariamente, bem-humorado e confiante. Parecia ser feliz com a vida simples que levava.
No dia 25 de julho fez tudo como de costume, mas avisou os que estavam em casa que aquele dia seria o mais importante de sua vida, pois teria um Encontro.
Embora fosse cedo, já estava de banho tomado e barba meticulosamente escanhoada. Até loção empregara naquele dia.
Os da casa logo perguntaram que encontro seria esse, mas ele respondeu que teriam de aguardar. As horas foram passando na rotina, até o almoço, quando pediu que, no jantar, fosse servido um pudim de leite com calda de caramelo. Era para o Encontro?
Será que haveria convidado para o jantar? Não, mas ele insistiu no pudim que amava.
Naquele 25 de julho nada ocorreu que chamasse a atenção de alguém da casa. Era mais um dia como os demais. À noitinha, como em muitos lares, nem todos estavam presentes para o jantar. Ângelo parecia um pouco apreensivo, talvez minimamente inquieto ou ansioso. Falou menos que de costume, mas deliciou-se com o pudim. Comeu mais que de costume, com bastante calda. Disse que era um manjar “dos deuses”.
Após o jantar, Ângelo ajudou a levar tudo para a pia da cozinha e tratou de guardar as sobras na geladeira. Recolheu-se para ler e ouvir música, sempre em volume suficiente para si mesmo.
Na hora de costume, despediu-se de todos para se recolher. E o tal Encontro? Ninguém quis perguntar em voz alta, mas a pergunta permanecia estampada nos olhos dos da casa.
O tempo estava nublado e frio, típico dessa época do ano. Ângelo no seu quarto, alguém ao computador, alguém ao celular e mais alguém assistindo à TV. Como de costume. Telefone mudo; campainha, também. Nada.
Lá pelas 23h00 as luzes foram apagadas, pois que todos já se haviam recolhido para o dia seguinte. Ângelo havia dado o Encontro como certo, mas nada acontecera. Como explicar?
Nada de estranho ocorrera durante a madrugada até que o novo dia clareava. Alguém notou que Ângelo não havia tomado café, pois não havia louça no escorredor. De certo estava examinando as plantas, primeiro. Talvez o tal Encontro se referisse a uma brotação ou floração há muito esperada.
No meio da manhã, alguém procurou por ele. Não estava na cozinha nem no jardim. Também não na saleta onde ficava o computador. Não houve resposta quando seu nome foi chamado. Mas onde estava Ângelo? De certo, havia saído para dar uma volta, já que o sol resolvera aparecer depois de ter estado meio encoberto pelas nuvens.
Alguém da casa se deu conta de que ele poderia estar no quarto. Foi verificar e, só então, entendeu o significado do Encontro.