Beleza hidrossolúvel e a ilusão de ser bela!
Bastou-lhe apenas um banho para que toda sua beleza fosse dissolvida pela água e perdida pelo ralo. Agora, desprovida das artificialidade, ela era quase irreconhecível.
Sua voz permanecia a mesma; por isso, e unicamente por isso, era possível ter certeza de que se tratava da mesma pessoa.
Aquilo que era, até então, um fator atrativo, era agora algo a ser ocultado, devido a repugnância que lhe causava. Incomodava-lhe deixar a luz acesa.
Depois de uma hora, após realizar com mestria aquilo que se propusera a fazer, dirigiu-se ao espelho, abriu a bolsa e começou a cobrir o rosto com as artificialidades que há pouco a água dissolvera. Após concluir, sorriu : voltou a se achar bela! E realmente tinha ficado bela! Mas que alegria poderia proporcionar uma beleza escravizada pela artificialidade?!
– “ Toda alegria nasce da ilusão'', disse-me ela como se tivesse lido meus pensamentos.
Pensei em travar uma discussão filosófica a respeito da beleza, da alegria e da verdade, mas como poderia acabar uma discussão filosófica com alguém que teme mostrar a cara, alguém que sempre se esconde camuflando-se?!
Não!! Não deveria eu dizer coisa alguma!
Talvez ela tenha realmente razão ao afirmar que toda alegria nasce da ilusão: a dela, da ilusão de ser bela; a minha, da ilusão de não saber verdade!