Publicações anteriores desta série: (pesquise pelo nome do autor)

  Crônicas de Brandão - Introdução
  Crônicas de Brandão - 1) O Mico da Lanchonete
  Crônicas de Brandão - 2) O Brado Retumbante
  Crônicas de Brandâo - 3) A Gincana da Torta de Maçã
  Crônicas de Brandão - 4) RRRaii RRRoberrrt!!!
  Crônicas de Brandão - 5) Putz...Melou!!
  Crônicas de Brandão - 6) Perseguindo a Polícia
  Crônicas de Brandão - 7) Acabou em Pizza! 
  Crônicas de Brandão - 8) Louça Suja se Lava em Casa!
  Crônicas de Brandão - 9) A Velhinha de Taubaté
  Crônicas de Brandão - 10) Matusa... para os Íntimos!!

Crônicas de Brandão
11 - Rainbow...
  
       Era o nome da lancha de Brandão, inscrito com imponência a bombordo e a estibordo, nas laterais do barco.
       
       Ele construiu uma casa no Lago Sul, próximo ao local onde hoje majestosamente a ponte JK liga aquela região ao Eixo Monumental, atravessando o Lago Paranoá. A casa, uma das três que ele construiu no decorrer da vida, tinha em torno de seiscentos metros quadrados e era equipada com todos os itens de conforto que na época eram comuns às casas desse padrão. Foi financiada em boa parte com ganhos de capital obtidos pela venda de terrenos à beira do lago que Brandão adquiriu ainda jovem, quando aquelas terras tinham pouco valor. O terreno da casa terminava nas águas do lago, onde Brandão construiu um atracadouro, item fundamental para as casas com fundo para o Paranoá.

       
       Faltava a lancha.


       Na época em que Brandão terminou sua obra no Lago Sul, eu morava também próximo às águas de uma represa: a Represa de Guarapiranga, na Zona Sul de São Paulo. Essa proximidade de ambos a represas de portes semelhantes, uma em Brasília, outra em São Paulo, fazia parte da lista de coincidências que colecionamos ao longo de nossas vidas. Próximo à minha residência havia um estaleiro de barcos que faziam sucesso nas águas da Represa.

       Durante uma visita, das tantas com que Brandão me presenteou durante o período em que morei às margens da Guarapiranga, quando seu ancoradouro já reclamava a presença de um barco, fomos visitar o estaleiro. Lá estava ela, linda, Carbrasmar 15 pés, motor de popa Jonhson 40, imponente, espaço para 5 pessoas e vários containers de comidinhas e cervejinhas.

       Brandão se apaixonou. De fato, era linda. Só faltava uns retoques que seriam dados pelo proprietário do estaleiro na semana seguinte. E o preço contratado incluía a carreta.


       O negócio foi fechado, entre o comprador e o vendedor, num clima de muita cordialidade e satisfação de ambas as partes. Naquele momento senti que alguma coisa não fechava.  E, curiosamente, percebi que estava sendo acometido por uma ansiedade.  Aí, caiu a ficha, descobri o que era: como transportar uma lancha de 15 pés, com motor de popa Jonhson 40, da Represa do Guarapiranga, em São Paulo, para o Lago Paranoá, em Brasília?

       Mas Brandão tinha solução para tudo. E era isso o que me fazia suar de ansiedade naquele momento. A pergunta natural e espontânea que eu esperava não tardou a chegar:

       - Compadre, tem como você providenciar o transporte da lancha pra mim? 

       Eu trabalhava umas dez horas por dia em cargo de diretoria numa empresa multinacional e lecionava à noite, quase todos os dias da semana. Teria que pesquisar transportadora e preços de frete; conseguir um engate para a carreta; alugar um veículo robusto o suficiente para puxar a lancha a reboque e cruzar São Paulo com a lancha atrás de mim até o depósito da transportadora, em meio a um trânsito que na época já era problema para qualquer veículo sem uma lancha pendurada na traseira. E mais, eu não tinha experiência em manobrar veículo com dois corpos engatados. Seria pelo menos um dia de ausência ao trabalho e uma aventura única e inesperada. Claro, todos os custos por conta do interessado.

       Mas eu fiz. E com muito carinho. “Amigo é para essas coisas! ”

       Para sedimentar a convicção expressa na frase anterior, dois anos depois, por algum acidente, o motor Jonhson 40 da Rainbow quebrou. Eu estava com passagem marcada para os Estados Unidos, a trabalho. Brandão sabia disso. Uns dias antes da viagem me ligou:

       -Compadre, se não for te atrapalhar, tenho uma listinha de peças para o motor da lancha que não se encontram aqui no Brasil. Eu teria que importar. Mas os impostos são altíssimos. Você sabe, artigo de luxo.

       Para encurtar a história, as compras foram feitas a muitas milhas do hotel onde eu me hospedava numa praia da Flórida, no único dia de folga que eu teria naquela semana de trabalhos. Precisei comprar mala extra, pagar excesso de peso e ainda carregar a hélice e o eixo diferencial entre as bagagens de mão, por que não havia onde acomodá-los.

       Mas a lancha foi salva. Afinal, para quem fez chegar uma lancha inteira ao seu destino, o que é carregar apenas o motor Jonhson 40, em pedaços, na bagagem de um voo comercial?