EUROPA.GREVE NO LOUVRE. MASSIFICAÇÃO.

Fui seguidamente à Europa por quarenta anos até recentemente. Uma injeção de arte para quem tem o sangue da renascença. Ia apreciar “vis a vis”, ver, tudo o que nunca será superado no mundo pelas artes novas e seus artistas. Nunca!! E não foi nem será.

Nada se verá mais como o “Rapto de Preserpina” na Galeria Borghese (onde não se consegue mais entrar, só com reservas a partir do Brasil, ou na praga das tais excursões), Roma, ou Caravaggios, ou em Amsterdã um Museu Van Gogh, de sofisticado modernismo na proteção contra fungos nas suas telas, herdadas por seu sobrinho, o maior acervo do artista único, negociado em longos anos a feitura protetora das telas, para construir o museu, com enormes tubos de ensaio de água fervente atrás das pinturas, entre elas e as paredes.

Minha biblioteca de arte é farta, comprada a bom preço, além de não ter no Brasil, por preço razoável, aqui de preço impraticável. Vale a pena, embora pesados os livros para transporte. Do clássico ao barroco, da inércia ao movimento, como de Michelangelo a Bernini, no que mais gosto, escultura, até o mundo diversificado da arte e seus tesouros, da pintura que passa por tantas escolas, pontilhismo, arte “pompiers,” expressionismo, impressionismo trazido por Monet em mostra de Nadar, que trouxe ebulição na época em Paris, cubismo, surrealismo e vertentes, até o mobiliário nouveau e outros compartimentos do talento criativo, inumeráveis, livros antigos feitos como jóias, peças em geral, etc.

Todos entram no Louvre em filas crescentes, quase impossível hoje, a ponto de semana passada seus vigilantes fazerem greve por exaustão, tal o número de turistas visitantes. Uma foto mostra centenas, sim, CENTENAS de pessoas em frente à feia tela da Monalisa com as mãos para o alto umas atrás das outras por sobre as cabeças de massa de gente, com celulares tirando fotos. Lá estava Lisa de Gerardini, que seria o rosto da procurada tela. Pela literatura é seu retrato a óleo.

Francesco Del Giocondo, seu rico marido, teria encomendado a Leonardo Da Vinci.

Lisa de Gerardini estava com todas as discussões sobre a tela e seu entorno sendo disputada pelos que nada sabem de sua história, nem vale a pena.

E entram nessa parte do museu passando sob a fantástica escultura de Nike de Samotracia, FOTO DA MINHA PÁGINA, e nem olham para ela, A VITÓRIA DE SAMOTRACIA, de escultor desconhecido, gigantesca, de asas abertas, achada nas profundezas do mar da Grécia. Estava na proa da embarcação vista hoje na Escadaria Darú, Louvre, por onde passam indiferentes milhares de pessoas às suas vestes esvoaçantes em realidade inimaginável.

Ficou difícil ingressar hoje nos bons museus do mundo, felizmente quando não havia essa demanda pude frequentá-los com a calma para apreciar e avaliar as grandes obras e seus criadores. Sentar na frente do Cipreste no Trigal, de Van Gogh no Metropolitan, NY, e se deixar ficar, admirando a exclusiva e singular pintura em fortes camadas, forma de pintar direto com a bisnaga extraindo beleza fulgurante.

Entrava e saia por Paris pela Varig, destruída por governos passados, e saia de qualquer lugar da Europa, pois a boa empresa tinha locação por todo o mundo, e desse ponto de carro ou nos incríveis trens europeus varria toda a Europa. Depois só com outras empresas, principalmente Air France ou Alitalia.

Paris, a cidade que chamo de minha segunda cidade, que conheço andando a pé tanto ou mais que onde nasci. Sou um andarilho até hoje, e sacrifiquei minha mulher em andanças de até dez quilômetros/dia pela cidade. Mas vi tudo que queria que só se vê andando por seus segredos e maravilhas arquitetônicas, desde Corbusier às formas diversas na edificação monolítica de Haussaman que remodelou a cidade “boulevarizando-a”, modificando suas vias a partir de projeto de Napoleão, o III, sobrinho do conquistador Napoleão. Seria seu o projeto do magnífico "Ópera de Paris", que se destaca na cabeça da Avenida do Òpera, teatro com indescritível abóbada pintada por Chagal e seus mármores e escadarias com esculturas de ficarmos boquiabertos.

Mas assisti o declínio de Paris ano a ano, com a invasão dos imigrantes trazendo violência e sujeira na cidade, trombadinhas do leste europeu para os trens do metrô, e terrorismo surpreendendo seus habitantes e todos que lá estão.

Os trens na Europa têm horários infalíveis. Chegar nos horários é imprescindível. Inexpugnáveis em horários; parte às 10,32, e duvida-se, e é confirmado, o mesmo na chegada, mesmo os TGV, “train gran vitesse”, que seguram suas velocidades de bólidos para chegarem no tempo certo, quando se adiantam.

Na verdade de carro se desfruta de pequenas cidades por onde passando-se motiva paixão. E fica-se. Como fiquei em vários lugares, em toda a Europa.

Certa vez em Gruyère, saindo dos altos montes do Wungfrau, de um pedaço do céu chamado Grindwald, Vale de Grindel, e descendo pelo Vale da Aosta na Itália, passando pelo famoso Passo de São Gotardo, com túnel de dezessete quilômetros, eixo de França em Chamonix, entrando na Itália por baixo do Mont Blanc, parei ainda na Suiça o carro para tirar retratos com minha mulher na parte ao lado da estrada, local um pouco mais alto de onde se avista o Lac du Gruyère logo abaixo.

Um gramado corrido, de onde a cem metros adiante vimos mesas no gramado e pessoas almoçando. Pegamos o carro e paramos nesse local avistado. Vamos almoçar aqui? Perguntei a minha mulher. Sim respondeu. Atendidos prontamente pedi um “pichet de rosso”. Estava dirigindo e ia para a Itália, para Navona, litoral, para de lá ir para Nice. Depois para Florença de sempre. Pouco vinho então.

Olhei para trás e divisei um grande “chalet” suiço de quatro andares. Era um hotel e almoçávamos nele em seus gramados. Com vontade de andar na beira do lago e tomar mais vinho indaguei se tinha lugares para passar a noite, se havia como reservar um quarto. Imediatamente resolvido. Mais vinho desceu para prazer da degustação com o famoso “fondue de Gruyère” e seus queijos. E após o almoço passeio na beira do lago, já de bermuda trocada.

Jantar dos deuses e cama de pena de ganso, o paraíso. Dia seguinte Nice, após Itália.

Na Itália a Piazza de La Signoria em Florença, cidade berço da renascença e ponto central de convergência turística, onde se flanava dez anos atrás com mais facilidade, voltando sempre como fiz inúmeras vezes. Hoje parece entrada de fla x flu no maracanã. Impraticável.

E assim tudo mais. Visitar o mecenato dos Médicis só para alienado hoje, ou armado de muita paciência. Em Barcelona a invasão turística chegou a tal ponto que se vê nas vidraças de apartamentos a frase “tourist go home”. Isso porque além das cheias em todos os lugares, aumentados estão os locativos diante da atuação da AIR BNB, empresa que aluga apartamentos de particulares para turistas em todo o mundo, inflacionando o mercado de aluguéis para cidadãos locais, apartamentos onde cabem muito mais pessoas de uma família por exemplo e custam infinitamente mais baixo que preços de hotéis. E disputando espaços nos restaurantes e todos os lugares.

Ficou difícil ir a esses centros de lazer, mesmo conhecendo meios de entrar nesse locais, como na Galeria Ufisi, Museu da Academia e incontáveis pontos de arte na incomparável Firenzi.

O mesmo em qualquer lugar. O Metropolitan em Nova Iorque ainda escapa um pouco dessa massificação. É bom para a cultura se fosse um ver sem estar cego pelos retratos disparados, como se estivessem no lugar para tirar retratos sem serem fotógrafos, para mostrar...e só isso, talvez, sem usufruir realmente.

Quase escapo para em julho fazer um pequeno périplo, mas diante dessa avalanche recuei. Prefiro ir com toda a família para Orlando nas férias conjuntas de todos, onde a alegria é enorme, temáticos restaurantes, e os serviços perfeitos com novidades a cada ano que se vai, e impostos aplicados em uma região que era um charco faz trinta anos, e hoje um exemplo, como em Down Town de Orlando, uma pequena Las Vegas, fora os incríveis parques. Uma alegria só. Sem greves. Ou ir para serra onde mora meu filho ou no meu cantinho em Búzios. Mas a velha Europa está lá, berço do mundo. Para quem tem paciência.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 05/06/2019
Reeditado em 05/06/2019
Código do texto: T6665621
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