Tratei de buscar recursos pra justificar um coração desacelerado, nestes últimos dias. A vida é fugaz, meus caros. E quando menos se espera ao pó voltaremos.
- Na cabine acolchoada não cabe raiva, nem desalento. Aliás, é lá que enterram nossos sentimentos e a natureza come, sem dó, nem piedade.
Sábia era D. Cacilda, doninha de bem que morava ao lado da casa de minha mãe no interior. Toda vez que alguém tratava sua raiva, tipo alimentava mesmo, ela docilmente dizia a frase acima.
No caminho da esperança sempre brota uma erva daninha. Conheci Alice, menina serelepe e ativa, quase seis anos, capaz de voluntariamente se enfiar no elevador e ficar subindo e descendo, enquanto a mãe, desesperada, tentava parar o equipamento. Quando conseguiu, a menina ria como se fizesse um showzinho. E fazia!
A mãe, já justificando, vinha se assentar ao meu lado, dizendo que a menina era assim porque foi molestada pelo pai, um advogado alcoólatra que conheceu numa festa de cerveja artesanal.
Olhei pra menina, como quem lhe desse um abraço acolhedor e tentei uma prosa, sendo extirpada de forma brutal com um você não manda em mim, nem meu pai. Tentei de novo, e agora vinha o pior, ela xingou a mãe de puta.
Naquele momento, fui abduzida para minha infância e lá me encontrei com minha menina anterior, calada e serelepe, brincando de casinha e fazendo bolo de barro. Vi minha mãe de avental com um biscoito de polvilho frito na mão e ouvi os gritos para que chamasse os amigos pra comer, mas que não saísse do portão. Fui generosa e continuei a viagem à infância, até que a mãe da Alice começou a contar sua história. Afirmando que o pai da criança havia ofertado ovos no fim de semana para ela, com o intuito de fazê-la morrer, já que possuía alergia. Chocada, perguntei: - Mas você foi à polícia? Não denunciou? Ela disse que já havia um processo contra ele e estava aguardando. Das muitas coisas ditas por ela, vi um pai ausente, mal sucedido, criminoso e uma filha doente, sofrida, revoltada. Ela entrou no banheiro e pediu que ficasse com a menina. Tentei sugar dela alguma esperança e perguntei:
- Você sabe que quem não come ovo faz parte da Liga da Justiça e é um herói? A menina desarmou e veio me dizer que ontem, na visita assistida só pai, tinha doce de leite e ela sonhava em experimentar e o pai dela, a deu uma colherzinha pra não morrer de vontade, mas ela não passou mal porque era heróina.
A mãe saiu, contou mais umas seis histórias e em cinco, o pai era um vilão. Que espécie de doador de esperma era aquele? Como foi escolher tão mal? Ela foi embora.
E naquele intervalo entre o meu compromisso e a saída dela fui tomada por um sentimento triste, doloroso, afinal aquela criança estava e vive sob uma pressão assustadora. Não conhecia o seu pai, nem queria julgá-lo, mas independente da relação dele com o mundo e com a filha, a forma como a mãe falava dele, por si só, já produzia um monstro, mesmo que não fosse. Além do mais, tinha uma criança a assistir, em público, a desconstrução de um pai, a ruptura de uma figura fraterna.
Mas o pior estava por vir. Dia seguinte, encontro no elevador uma amiga advogada que estava esgotada e triste por ter recebido um pai de uma criança que foi denunciado por abuso e estava desesperado, afinal amava a filha profundamente, fez corpo delito, faz visita assistida, mas o pior de tudo é que a ex mulher, por vingança, simulou tudo, mas que ele tinha guardado alguns áudios gravados durante as crises dela, num deles, ela dizia que ele seria preso por abusar da filha, porque ela faria o que fosse para afastá-lo, já que ele não a queria mais. Que sua vingança seria certeira, sob tom de ameaça. Mas o temor é a lentidão da justiça. Não me aguentando perguntei o nome da menina, ela disse Alice. Coincidências não acontecem.
E depois disso, fico aqui a pensar na D. Cacilda e sua frase. Nem desalento, nem raiva permanecem vivos no caixão. Mas já calúnia, a difamação e a injúria, estas jamais se enterrarão.
Torço pela justiça, mais ainda para que esta criança tenha o direito de ser feliz, embora duvide.
Estes novos tempos...
- Na cabine acolchoada não cabe raiva, nem desalento. Aliás, é lá que enterram nossos sentimentos e a natureza come, sem dó, nem piedade.
Sábia era D. Cacilda, doninha de bem que morava ao lado da casa de minha mãe no interior. Toda vez que alguém tratava sua raiva, tipo alimentava mesmo, ela docilmente dizia a frase acima.
No caminho da esperança sempre brota uma erva daninha. Conheci Alice, menina serelepe e ativa, quase seis anos, capaz de voluntariamente se enfiar no elevador e ficar subindo e descendo, enquanto a mãe, desesperada, tentava parar o equipamento. Quando conseguiu, a menina ria como se fizesse um showzinho. E fazia!
A mãe, já justificando, vinha se assentar ao meu lado, dizendo que a menina era assim porque foi molestada pelo pai, um advogado alcoólatra que conheceu numa festa de cerveja artesanal.
Olhei pra menina, como quem lhe desse um abraço acolhedor e tentei uma prosa, sendo extirpada de forma brutal com um você não manda em mim, nem meu pai. Tentei de novo, e agora vinha o pior, ela xingou a mãe de puta.
Naquele momento, fui abduzida para minha infância e lá me encontrei com minha menina anterior, calada e serelepe, brincando de casinha e fazendo bolo de barro. Vi minha mãe de avental com um biscoito de polvilho frito na mão e ouvi os gritos para que chamasse os amigos pra comer, mas que não saísse do portão. Fui generosa e continuei a viagem à infância, até que a mãe da Alice começou a contar sua história. Afirmando que o pai da criança havia ofertado ovos no fim de semana para ela, com o intuito de fazê-la morrer, já que possuía alergia. Chocada, perguntei: - Mas você foi à polícia? Não denunciou? Ela disse que já havia um processo contra ele e estava aguardando. Das muitas coisas ditas por ela, vi um pai ausente, mal sucedido, criminoso e uma filha doente, sofrida, revoltada. Ela entrou no banheiro e pediu que ficasse com a menina. Tentei sugar dela alguma esperança e perguntei:
- Você sabe que quem não come ovo faz parte da Liga da Justiça e é um herói? A menina desarmou e veio me dizer que ontem, na visita assistida só pai, tinha doce de leite e ela sonhava em experimentar e o pai dela, a deu uma colherzinha pra não morrer de vontade, mas ela não passou mal porque era heróina.
A mãe saiu, contou mais umas seis histórias e em cinco, o pai era um vilão. Que espécie de doador de esperma era aquele? Como foi escolher tão mal? Ela foi embora.
E naquele intervalo entre o meu compromisso e a saída dela fui tomada por um sentimento triste, doloroso, afinal aquela criança estava e vive sob uma pressão assustadora. Não conhecia o seu pai, nem queria julgá-lo, mas independente da relação dele com o mundo e com a filha, a forma como a mãe falava dele, por si só, já produzia um monstro, mesmo que não fosse. Além do mais, tinha uma criança a assistir, em público, a desconstrução de um pai, a ruptura de uma figura fraterna.
Mas o pior estava por vir. Dia seguinte, encontro no elevador uma amiga advogada que estava esgotada e triste por ter recebido um pai de uma criança que foi denunciado por abuso e estava desesperado, afinal amava a filha profundamente, fez corpo delito, faz visita assistida, mas o pior de tudo é que a ex mulher, por vingança, simulou tudo, mas que ele tinha guardado alguns áudios gravados durante as crises dela, num deles, ela dizia que ele seria preso por abusar da filha, porque ela faria o que fosse para afastá-lo, já que ele não a queria mais. Que sua vingança seria certeira, sob tom de ameaça. Mas o temor é a lentidão da justiça. Não me aguentando perguntei o nome da menina, ela disse Alice. Coincidências não acontecem.
E depois disso, fico aqui a pensar na D. Cacilda e sua frase. Nem desalento, nem raiva permanecem vivos no caixão. Mas já calúnia, a difamação e a injúria, estas jamais se enterrarão.
Torço pela justiça, mais ainda para que esta criança tenha o direito de ser feliz, embora duvide.
Estes novos tempos...