Sétimo Andar (76)
Certa vez, peguei-me a olhar pela janela, rebatendo os pingos da chuva que insistiam em cair naquela noite. Parecia que o mundo já havia chorado tudo que podia (ou precisava), mas continuava.
Pensei que estivesse em um filme, ou fosse o protagonista de um livro dramático, uma tragédia da minha vida. Nem sequer cogitei a possibilidade de ter um papel secundário na trama, eu já achava estar sofrendo o bastante, e que ninguém poderia sofrer mais que isso.
De tudo que me doía, o que mais pulsava a feriada era ver as luzes da cidade do alto do sétimo andar. Elas cintilavam na velocidade em que a cidade respirava. Inspirava música, e expirava poluição sonora. Pelos poros, suava arte, e quem soubesse se banhar desse suor, entraria nesse enorme organismo vivo: a cidade.
No céu não era diferente, aviões passavam a todo momento levando pessoas, amores, e sonhos. Quando os meus iriam decolar?
Em dias de céu claro, as coisas pioravam. Eu observava estrelas, e crescia o meu sentimento de que ainda mais pessoas poderiam estar realizando sonhos, vivendo amores, conhecendo lugares, do que eu.
Se eu estava na ficção, essa era a hora em que meu personagem cairia na real, faria alguma coisa difícil parecer simples, e mudava de vida.
O trabalho tido como humilde, se transforma em orgulho e subsídio para a mudança. A ficção faz parecer que a luta pelo ideal é fácil, e que depende só de você.
Quantos pensamentos pessimistas para meras estrelas!
Voltemos a minha tragicomédia.
Como posso lidar com o fracasso, sendo que ainda não o aceito como destino?
Penso que sou genial, e que só preciso de um Pedro Álvares Cabral. Alterno também entre momentos em que acredito piamente que sou o pior ser do universo, sem talento e sem propósito. E então percebo que sou como todos.
Não irei me diminuir! É só a melancolia que me sufoca, a vontade de viver e presenciar momentos importantes, de ser importante. Eu quero ser lembrado!
E se for para olhar as luzes da cidade, que seja para se inspirar. Se for para respirar, que seja no ritmo da cidade, e se for para chorar, que seja em forma de chuva.