Zé Ninguém

Quinta-feira a tarde, levantei-me da cadeira e aproximei-me da janela de vidro. Dela podia ver o mundo do lado de fora. Estava na biblioteca, no terceiro andar entre as voltas com Machado de Assis, Camões, Eça de Queiroz, Pepetela, Alan Poe, John Keats, Dalcídio jurandi, André Nunes, ... escritores ilustres, obras díspares, e com jeito próprio e singular de falar da vida, do amor ...Algo me chamou a atenção, e pedir licença aos nobres escritores para olhar de perto pela janela. Do alto podia ver a pracinha com mangueiras frondosas e um lindo jardim. Por um momento fiquei entre meus pensamentos sobre a condição humana, o amor... muitas pessoas são desprovidas desse sentimento, pensei!. Voltei-me e observei com pena aquele maltrapilho sentado debaixo do pé de mangueira, parecia um walking dead.

Meus sentimentos deram nó entre eles. Medo, pena, impotência... Aquele maltrapilho tinha suas feições perdidas em algum lugar, em algum canto dentro dele! As pessoas não o enxergava, parecia algo sem importância, que pelo acaso do destino, encontrava-se como um objeto descartável. Observei-o por alguns minutos, estava perdido entre o seu vazio. Voltei para Keats, apesar de me envolver com a separação dele com Fanny Brawne, da tragédia que cercou sua vida, perto de mim algo de trágico também acontecia; não conseguir chorar junto com Fanny Brawne a partida de jonh Keats, porque minhas lágrimas se voltaram para o velhinho da praça que parecia morto, sem nenhum resquício de sonhos. Era invisível aos olhos do mundo, agora estava entre os pombos, jogava restos de pães que ganhara de uma senhora.

Fiquei consternada! Mas apesar de tudo, sentia-me impotente diante da miséria que o acometia. Como muitos, senti medo também. Hoje em dia se tem medo do desconhecido! E voltei a minha realidade, lugar onde meu sorriso se alarga e não sinto tristeza, medo ou pena. Na manhã seguinte, sentei-me com Machado de Assis e comecei a pensar sobre o olhar oblíquo de Capitu; A condição humana, as mazelas da sociedade, Machado escreveu com realismo. Todos os dias sentava com um ícone da literatura, mas meu pensamento vez em quando se voltava para o velho barbudo que perambulava como um cão perdido. Sua identidade! Essa se perdera, poderia ser chamado de Zé ninguém se alguém conseguisse enxergá-lo.

Ginalda Azevedo Tabosa
Enviado por Ginalda Azevedo Tabosa em 14/05/2019
Reeditado em 14/05/2019
Código do texto: T6647062
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