Não há maior desalento do que redescobrir o Brasil diariamente, a nossa história é uma ficção romântica quando comparada à realidade cotidiana. No Rio, caminhar pelas ruas é uma experiência de medo, prostração e paranoia. Aquela alegria hospitaleira do carioca, se é que existiu, agora é uma lenda urbana afogada pela horda de andrajos cinzas sob as marquises, andrajos que escondem um ente aniquilado pelo nosso fracasso social. Por falar em marquises, nesta cidade cada vez mais inóspita, elas representam as ruínas do nosso amor, o horizonte da pobreza, são as marquises que abrigam e protegem os refugos humanos que a nossa insensibilidade produz com eficiência industrial. É sob as marquises que encaramos o retrato de Dorian Gray. Como é enfadonho ser pessimista, a melancolia é monótona, talvez por isso estejamos escolhendo o ódio, as armas, a vontade tomar um revólver e disparar contra o espelho. Enxergar-se na miséria é repulsivo, é uma das experiências mais apavorantes da alma. O capitalismo dispensou o pudor e mostra sua face definitiva, cria uns poucos senhores isolados em palácios inacessíveis e tritura tudo o que possa lembrar a ideia de humanidade.