O menino que fazia fogo
Sinal vermelho. Carro brecado. E um menino. Que parecia um artista de rua. Um pouco desajeitado, tentava segurar as tochas nas mãos, que escorregavam, mesmo tendo lambuzando de um pó branco. No rosto, um sorriso com uma boca cheia de dentes brilhantes, à mostra, as mãos trêmulas o faziam vacilar na primeira tentativa, mas ele permanecia ali, irremediavelmente feliz, apesar da frustração assistida de perto pelos motoristas dos carros que transitavam naquela avenida, em horário de pico. E como para ele a tentativa era a técnica foi de novo fazer sua arte. Por um minuto talvez, de delírio, parti de dentro do carro indo até ele, como se o fogo fosse uma obra minha. Fui me vendo nas dezenas de vezes que insisti em tentar colocar fogo na chama da vida. Não demorou muito e já vinham as visões das cenas em que carreguei fogo, coloquei brasa, as que, por inexperiência, diminuí a intensidade e perdi no tempo. Enquanto ele passava o pozinho mágico para evitar incidentes, ao contrário, eu atiçava o álcool. Ele era tão diferente de mim. Tão dele. E como se tivesse cometido um crime, desperto com uma sonorização impactante: eram os carros buzinando, porque o semáforo abriu. Tentei sair, mas os apressados corriam pelos cantos, até que o menino do fogo deixou cair suas tochas no chão que, ao se chocarem, pegaram fogo. Tentou apagar e não conseguiu. O semáforo abriu de novo e como não consegui lugar para parar, na tentativa de ajudá-lo, dei outra volta no quarteirão, chegando àquele lugar para oferecer-lhe uma ajuda, dar um trocado. E para a minha surpresa estava lá o menino que fazia fogo, fazendo malabarismo. Com o mesmo sorriso solto cumprimentou e fez sua apresentação. Quando fui lhe dar a moeda, ele disse que fazia parte do projeto “sorriso cutuca a alma” e não recebia donativos, a não ser o riso. Era seu primeiro dia... Olhei pra ele com o dinheiro na mão e com um riso solto, mas preso estava meu coração, àquele menino, porque o que ele tinha, eu já tinha perdido. Carro passou. A fila andou. E o menino que fazia fogo agora era malabarista.
Sinal vermelho. Carro brecado. E um menino. Que parecia um artista de rua. Um pouco desajeitado, tentava segurar as tochas nas mãos, que escorregavam, mesmo tendo lambuzando de um pó branco. No rosto, um sorriso com uma boca cheia de dentes brilhantes, à mostra, as mãos trêmulas o faziam vacilar na primeira tentativa, mas ele permanecia ali, irremediavelmente feliz, apesar da frustração assistida de perto pelos motoristas dos carros que transitavam naquela avenida, em horário de pico. E como para ele a tentativa era a técnica foi de novo fazer sua arte. Por um minuto talvez, de delírio, parti de dentro do carro indo até ele, como se o fogo fosse uma obra minha. Fui me vendo nas dezenas de vezes que insisti em tentar colocar fogo na chama da vida. Não demorou muito e já vinham as visões das cenas em que carreguei fogo, coloquei brasa, as que, por inexperiência, diminuí a intensidade e perdi no tempo. Enquanto ele passava o pozinho mágico para evitar incidentes, ao contrário, eu atiçava o álcool. Ele era tão diferente de mim. Tão dele. E como se tivesse cometido um crime, desperto com uma sonorização impactante: eram os carros buzinando, porque o semáforo abriu. Tentei sair, mas os apressados corriam pelos cantos, até que o menino do fogo deixou cair suas tochas no chão que, ao se chocarem, pegaram fogo. Tentou apagar e não conseguiu. O semáforo abriu de novo e como não consegui lugar para parar, na tentativa de ajudá-lo, dei outra volta no quarteirão, chegando àquele lugar para oferecer-lhe uma ajuda, dar um trocado. E para a minha surpresa estava lá o menino que fazia fogo, fazendo malabarismo. Com o mesmo sorriso solto cumprimentou e fez sua apresentação. Quando fui lhe dar a moeda, ele disse que fazia parte do projeto “sorriso cutuca a alma” e não recebia donativos, a não ser o riso. Era seu primeiro dia... Olhei pra ele com o dinheiro na mão e com um riso solto, mas preso estava meu coração, àquele menino, porque o que ele tinha, eu já tinha perdido. Carro passou. A fila andou. E o menino que fazia fogo agora era malabarista.