Um tanto quanto pretensioso estava ele naquele dia. Veio remexer nas gavetas tão bem arrumadas nos últimos anos. Sem cheiro de mofo, sem umidade e no fundo, um papel manteiga para evitar contato direto com o que tinha guardado.
Veio com ar autodidata, como se as escolhas dependessem somente dele. Invasivo que só, trouxe umas imagens em preto e branco, guardadas a sete chaves, debaixo do tapete vermelho pulsante entre sistólica e diastólica.
Aquela menina que cantava fuscão preto, retratada naquelas imagens, nasceu num lar onde a família era o único alicerce. Conheceu bem cedo a palavra controle para evitar desperdício: cada centavo era um número a menos no valor líquido, visto no holerite impresso em papel recortado, tão usado por ela como rascunho.
Aprendeu também que Deus a resguardava ao longe, mesmo caminhado por aquele longo trajeto até a escola, sem companhia. A mãe que sofria de preocupação, vivia se munindo de calmantes, o que a impedia de tomar sorvetes gelados nos fins de tarde de domingo.
Era o presente que por um deslize ia voltando no tempo e mostrava para aquela menina de sonhos doces empacotados em caixinha dourada que tudo passa, inclusive a necessidade de guardar algumas tralhas, porque não é à toa que passado se escreve assim.

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Mônica Cordeiro
Enviado por Mônica Cordeiro em 01/05/2019
Código do texto: T6636675
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