VISITA A VIRGEM DO PENHASCO

Ele passava dos 60 anos de idade e a alguns anos já acompanhava a famosa Romaria dos Homens que sempre acontece no sábado anterior a festa da Penha, na maior festa religiosa do Espírito Santo. A festa em homenagem a Nossa Senhora das Alegrias sempre acontece na semana seguinte a páscoa e se estende até na segunda feira posterior. Já havia nele o hábito de participar da romaria masculina, mas decidiu que queria fazer diferente. Seria um momento mais particular, mais íntimo. Por isso resolveu subir o penhasco na hora de menor movimento. No sábado pela manhã mal o sol tinha se posto colocou-se a subir a íngreme colina que no seu alto abriga o convento de 1570. Em vez de escolher o caminho por onde passam os carros, mais largo e espaçoso, decidiu logo depois de atravessar, o portão que iria pela viela, feita de pedras, estreita e mais em aclive, atravessando a mata que tem ao redor da montanha. Com passos lentos ia observando tudo ao redor. Era a primeira vez que aquilo lhe chamava atenção, desde os primeiros raios do sol que banhavam o mar azul lá embaixo, até o canto dos pássaros que se aninhavam nas copas das árvores. Por um segundo se esqueceu até que subia uma montanha. Sentiu-se leve, alegre, em paz. Lembrou da famosa música da Senhora que habita lá no alto do morro: Virgem da Penha, minha alegria, Senhora Nossa. Ave Maria. Parecia que ouvia as vozes de milhares de romeiros que a mais de 400 anos entoam a mesma canção sempre que nos primeiros dias posteriores a páscoa. Continuou a subida e parece que os sentidos se aguçaram. Sentia o cheiro do mato, das grandes árvores, que circundam o convento, ouvia já mais baixo o barulho das ondas quebrando na areia e uma roda de congo que podia se perceber parecia estar subindo do outro lado o morro, cantando os louvores a mãe de Deus. Em momentos mais rápido, em outro mais lentos, estava num momento só, ele, Deus e a Senhora do alto do morro com manto rosa e com uma criança no colo. Sequer dava conta de pessoas que passavam por ele e ora acenavam, olha lhe sorriam. Era ele, com a sua fé, sua simplicidade, querendo ao seu modo fazer uma homenagem a Senhora do Penhasco. De repente estava lá em cima. Olhou e viu o gigantesco terço armado entre as duas palmeiras. A grande cruz por um momento parecia lhe chamar atenção e não conteve a sua emoção. Ali mesmo, na grama, com os pés doloridos, ajoelhou-se e pôs-se a chorar. Não lhe importava ser visto chorando. As lágrimas no rosto, salgadas como a mesma água do mar lá embaixo. A roupa da virgem, azul como o mar que circunda a montanha. Um raio de sol atravessou as árvores se colocou entre ele e o terço a sua frente. E foi assim que ele orou baixinho: Obrigado Virgem do Penhasco por me trazer a certeza do amor do teu filho que carrega no colo. Silencioso abaixou-se, ascendeu a vela que carregava nas mãos e virou-se. Hora de voltar para casa com a vida renovada pulsando em seu peito. Sorriu tranquilo. tinha certeza que a Senhora do Penhasco lhe havia escutado e estava feliz com a sua humilde visita a sua casa.