JOANA D'ARC, UMA SANTA DIFERENTE - PARTE II
5---JOANA D'ARC, A NOVA MUSA MEDIEVAL DA FRANÇA - Baixinha, pescoço curto, seios firmes... Aproximada imagem física de JOANA conforme relatos de aparência, mas não é apenas essa imagem na cabeça de LUC BRESSON (diretor, produtor e argumentista de cinema francês) para "JOANA D'ARC", o filme do mito da heroína virgem; tema revisto por historiadores virou em 1999 uma obsessão nacional, uma 'joanadarcmania' - enxurrada de livros, peregrinações a cidades por onde ela passou e discussões de como saiu de herege para heroína. Hoje ela também representa comércio e turismo - em Rouen, onde foi queimada, 37 estabelecimentos comerciais e nome de uma rua. Passos históricos da moça adotada como símbolo pelo partido de extrema direita, Frente Nacional, são: nasce em 1412; em 1429, recebida por Carlos VII, a quem promete dar a vitória do trono; torturada no ano seguinte; em 1431, queimada viva na praça do Mercado Velho, em Rouen. ----- Conceito de patriota surge com a Revolução Francesa - fabricação da heroína, século XIX. Palavras do controverso filósofo e matemático francês ROGER CARATINI: "Da fogueira à lenda. Ela foi uma menina muito religiosa, que deve ter crescido ouvindo "se não dormir agora, os ingleses vão te pegar". Era banal. Foi manipulada na época e fabricada pela propaganda política do século XIX." ----- Por muito tempo, nos livros escolares a imagem da heroína virgem vestida de homem, a que salvou a França da Inglaterra na GUERRA DOS CEM ANOS, de 1337 a 1437, a que foi morta pelos ingleses... Excitou o Romantismo, introduzindo o mito no agora ensino obrigatório. O livro de Caratini, "Jeanne d'Arc - de Domrémy a Orléanset du bûche à la legende", da fogueira à lenda, começa derrubando ideias comuns - primeiro, JOANA D'ARC teria se intrometido na briga entre dois grupos, o 'armagnac', conservador, contra o 'borgonhês', reformista, optando pelo primeiro (direita X esquerda, guerra eterna no mundo ainda em 2019!!!). Nunca foi pastora - no processo de condenação, dizia não ter corrido atrás de carneiros; foi vítima não dos ingleses, mas da Universidade de Paris unida à Inquisição. ----- A história dela surge com a disputa entre dois senhores feudais franceses, LUÍS DE ORLÉANS, e o DUQUE DE BORGONHA. O duque mata o inimigo e acirra a luta entre os dois grupos, mas os ingleses organizam uma invasão e os franceses resolveram se unir. Radicais matam o negociador borgonhês, volta o conflito entre os franceses e os reformistas se aliam aos ingleses. JOANA salva o herdeiro francês CARLOS VII: "O rei era divino, por isso ela estava convencida de que, enviada das vozes, precisava defendê-lo." ----- Para republicanos, simboliza a traição da aristocracia. "JOANA - diz o escritor - foi usada como estandarte e ao misticismo da época interessava uma mulher que dizia receber mensagens. Seus resultados como guerreira foram escassos e CARLOS VII rapidamente se desinteressou. Por isso, quando capturada, não é vendida para o grupo do rei coroado (prisioneiros de guerra podiam ser comercializados), mas vendida, mas vendida aos ingleses que autorizam o processo religioso dirigido pelo bispo PIERRE CAUCHON e ela termina na fogueira. ----- Esquecida, volta recauchutada no século XIX e os republicanos se apropriam da sua imagem, fazendo dela uma mulher do povo traída pela aristocracia e pela Igreja, que depois a canonizou em 1920 como heroína nacional. ----- SAGA MOVIDA A EROTISMO E HISTERIA - Ambiciosa, magra e alta (contradição?!) - seios firmes talvez sejam o único ponto comum com a JOANA real e a modelo-atriz MILLA JOVOVICH no filme do ex-marido BRESSON, que em duas semanas atraiu 1,6 milhões de espectadores em Paris, segundo preferido do público, segundo a publicação "Le film français" - produção de US$ 55 milhões por ser ficção, tudo transformado numa saga movida a erotismo-histeria-sangue-vilões-heróis... A atriz e o diretor se separaram no meio das filmagens, como "ótimos amigos" (?) e a moça garante às vezes ser tão voluntariosa quanto JOANA; e se diz feliz por ganhar dinheiro como modelo, o que lhe permite fazer filmes e se dedicar à sua banda pop. ----- Intermináveis as três horas de projeção. Efeitos especiais, uma JOANA D'ARC louríssima corre em meio a flores, cabelo escurece até se tornar negro momentos antes do fogo - boca entreaberta, como numa sessão de foto - JOANA histérica, pouco a dizer em diálogos escassos. ----- Seis meses e meio de filmagem entre França e República Tcheca, BRESSON saiu do refúgio no interior da França. DUSTIN HOFFMAN no escuro, como a consciência da heroína, que desaparece sob o fogo num excessivo ritmo sinfônico. - FONTE: Rio, jornal O GLOBO, 14/11/99.
F I M