O SUBJUNTIVO DO TERMO - (século 18,19 na Bahia antiga)

Nas minhas andanças em passos incertos nas Bibliotecas, Arquivos e Centros de Memórias, encontrei muitas páginas cujos conteúdos amarelados pelo tempo mostraram-me um passado de expressões verbais que faziam parte do vocabulário da época, pronunciadas por pessoas qualificadas, era o português de Portugal com mistura de termos criado na nova terra. O Brasil ainda não era Brasil e o nativo não era brasileiro. Era a Colônia Portuguesa. Separei algumas palavras muito usadas em livros de assentamentos dos séculos 17, 18 e 19 na Bahia.

Termo: “africano livre” por ter sido apreendido após a proibição do tráfico pela Lei de 7 de novembro de 1831, mais conhecida como “Lei Eusébio de Queirós” (Eusébio de Queirós Coutinho Matoso Câmara) “determina a todos os escravos que entrasse no país ficariam livres e quem participasse do contrabando seria severamente punido”. Esta mesma Lei dava o direito ao Estado de deportar para a África. O que não ocorria, só por outros motivos. O tráfico continuou muito forte nos anos que seguiram. Entraram clandestinamente várias étnicas as mais conhecidas foram: Jeje, Mudubi, Mina, Haussá, Tapa, Bournon, Angola, Cabinda, Filamim, Moçambique, Barbá. (Livro nº220 Assentamento de escravo da Santa Casa). O Estado usava os escravos para serviços em obras públicas e muitos prestavam serviços a instituições religiosas com responsabilidade do Governo. Era o caso da Santa Casa de Misericórdia na Bahia. “Escravos livres matriculados na Santa Casa concedidos pelo Governo para os serviços gerais em 1862”. (Conforme consta no Livro de Relatório de Despesas do mês de outubro de 1864). Os africanos que serviram em estabelecimentos públicos tiveram o direito à emancipação apenas em 1864 com o Decreto de 3310 de 24.09.1864. Essa medida só fora cumpridas após pressão da Inglaterra através da Lei “Bill Aberdeen” de 04 de agosto de 1850 com poderes de fiscalizar os mares da proibição do tráfico de escravos. Forçou o Governo Regente a tomar medidas duras. Como também foi conhecida “Lei Diogo Feijó – só para inglês vê”. Aqui na Bahia veio um navio para fiscalizar o porto, ficaram três dias. Mas o tráfico correu para o Recôncavo baiano.

Termo: “escravo alforriado” - quer dizer; escravo livre que comprou a sua Carta de Alforria, liberdade. Obtido a carta o liberto é chamado de “negro forro”. Existiram dois tipos de Carta de Alforria: as pagas e as gratuitas. Está última, teria que ter bom relacionamento entre o escravo e o senhor, reconhecido durante todo o período de convivência e confirmado no testamento. Mas muitos deles preferiram ficar com o seu senhor e com a sua família. A maioria trabalhava em seus ofícios e eram chamados de “trabalhos de ganhos”. Outros vendedores ambulantes.

Termo: “Crioulo ou Crioula” – designação de diferença; escravo ou escrava nascido no Brasil e que eram filhos de africanos escravos, alforriados ou libertos. Subentende também cor. CRIOULO – escravo não mestiço que nasceu na terra, brasileiro sem ainda ter a sua real identidade.

Termo: “Negro Boçal” – Refere-se ao escravo negro ainda não latino, recém-chegado da África e desconhecia a língua portuguesa e os costumes. Era rude, grosseiro.

Termo: “Cabra” mestiço ou mulato, pejorativo do português para o nativo brasileiro para diferenciar a cor.

Termo: “Nagô” – designação linguística muito comum na Bahia nos séculos 17, 18 e 19. Significa todos os africanos que falavam a língua yorubá. Não era uma etnia. Em geral, os nagôs vindos do centro da Costa dos Escravos, os de Oyó, Ilorin, Ijêsa, Otu, Benim etc. Era a maioria na Província da Bahia.

Termo: “escravo latino” ou “negro latino” refere-se ao escravo que falava o português e conhecia os costumes da terra. Era uma mistura de negro com europeu, denominado pessoa esperta.

Curioso Batismo – Conforme registro no Livro da Paróquia de Santana Batizado no período de 1871 a 1896 – “No dia vinte e nove de dezembro de mil e oitocentos e setenta e hum nesta Freguesia de Santana do Sacramento da Bahia. Batizei Fiel, pardo, nasceu a vinte e oito de outubro do corrente ano, já livre em virtude da Lei de vinte e oito de setembro deste mesmo ano, cuja mãe chama-se Cândida, também parda, escrava do Major Antonio de Sousa Vieira. Foi padrinho Alcino Alves Ribeiro, morador na rua do Convento da Sé, e madrinha Anna Joaquina Ribeiro, filha, familiar, por procuração que apresentou Constantino Ferreira Machado Junior. E para constar, fiz este assento em que eu assino. Cônego Joaquim Cajueiro de Campos. (Livro da Paróquia de Santana – Batizado em 1871 a 1896).

A Lei nº2040 de 28 de setembro de 1871, conhecida como “Lei do Ventre Livre” ou “Lei Rio Branco”. Esta Lei considera Livre todos os filhos de mulheres escravas nascido a partir da data da Lei. Mas permanecia sobre a custódia do dono até completar 21 anos. Um passo tímido para o fim da escravidão em 1888.

Note Bem: Os livros de Batismo dos séculos 18 e 19 em várias paróquias os vigários registravam o Batizado com os nomes dos pais quando era filho legítimo ou seja do casal e quando fosse natural só assentava o nome da mãe, o pai ignorava e não colocava o nome completo da criança ou adulto no livro. Só o primeiro nome constava Maria, Paulo, Mario, etc. Outro abaixo:

“Batizei, Pedro, crioulo, filho de Francisca, escrava de D. Claudete Lobão da Mata Pires, foi padrinhos Carlos Libório e Maria Pia Libório casados tocou na Coroa. Vigário, João Machado da Cruz. (Livro nº 15 da Paróquia de Santo Antonio Além do Carmo – Batizado em 1883 a 1891).

O termo: “tocou na Coroa” significa que os padrinhos tocaram com os dedos na Coroa de NªSª de Santana do Sacramento, este ato confirma a Fé no Sacramento do Batismo e a legitimidade. Procedimento normal em todo o Batismo da época.

Termo: Meirinho – Oficial de Justiça de hoje, termo de origem português muito usado nos séculos 17, 18 e 19 no Brasil.

Termo: Cidade de São Salvador Bahia de todos os Santos. Assim foi encontrado em documentos nos séculos passados (1847). Já havia este nome deste a sua fundação por Thomé de Sousa.

Termo: “enjeitado” ou “exposto” muito comum as expressões usadas na Santa Casa de Misericórdia da Bahia nos séculos 17, 18 e 19- Criança encontrada na “Rota” para ser criada sobre a proteção da Misericórdia. Tão logo pego a criança é avaliada no seu estado físico e cor por ex: Se era bem vestida ou não, discriminava os trajes, se tinha algum objeto de valor e se havia carta ou bilhete com recomendações ou viria somente com o 1º nome. O sobrenome geralmente a criança recebia no batismo em que acrescentava Mattos em homenagem a João de Mattos Aguiar, o grande benfeitor do Asilo das Crianças e Mulheres Desamparadas. (Livro nº2 da Roda ano 1865 a 1867).

Quando já adolescente de 10 anos acima, alugava-se menino ou menina para determinados serviços domésticos a pedido de senhores que pagavam a Santa Casa. E ao termino do serviço o adolescente voltava para a Santa Casa que providenciava outro serviço para o mesmo. Quando completava a maior idade deixava a Santa Casa e geralmente ele ou ela recebiam um dote para custear a sua vida. Caso fosse mulher o dote seria entregue no casamento ao marido e a noiva recebia o vestido de noivado aprovado pela Mesa. Este procedimento só era para adolescente branco ou pardo o negro serviria a Santa Casa ou era negociado. Na Roda não colocavam crianças negras, ficava com a mãe escrava que tinha senhor como dono. É BOM QUE SAIBA, o dote era o dinheiro do pagamento referente aos serviços prestados do “exposto” que a Santa Casa depositava na Caixa Econômica para render juros até a maioridade do adolescente que teve merecimento nos serviços que fez para os senhores. (Livro nº1192 Lançamento dos capitais pertencendo a diversas recolhidas da Santa Casa – Retirada da Caixa Econômica a cargo da Santa Casa) E quando não havia Bancos o dinheiro e jóias eram guardados nos cofres. O “dote” tinha algumas destinações na Santa Casa de Misericórdia da Bahia, por ex: “Recebeu o dote de 500$000 mil réis Firmino Mattos do legado do Conde Pereira Marinho na verba 44 do seu testamento”. (Conforme consta no livro 4 da caixa dos depósitos em 11 de agosto de 1882/1892).

Havia caso que o exposto recebia a metade do dote no termino do contrato com a Santa Casa, por ter havido despesas na sua permanência antes do contrato e o mesmo se aplica com a mulher antes do casamento.

A criança abandonada era um problema social. Principalmente no período da epidemia do Cólera morbus em 1855 a 1856 quando morreram crianças e adultos. A criança órfã geralmente ia para as Casas Pias. E depois veio a guerra do Paraguai em 1864 a 1870 cujo governo obrigou a força para que os homens fossem a guerra. Causando com isso, muita desarticulação familiar, ficando a mãe com vários filhos sem meio para o sustento e a miséria assolando. A viúva recorre ao Governo para obter ajuda financeiro é negado mas indica a Santa Casa ou outros recolhimentos já existente. Poucas mães tinham de volta os seus filhos e outras abandonavam a sorte da criança.

Muitos garotos de 12 e 13 anos vão para a Escola de Aprendiz Artífices da Marinha e não mais retorna a Santa Casa. Outros são contratados por comerciantes e alguns são adotados por famílias ricas para fazerem serviços domésticos sem despesas para a Santa Casa de Misericórdia. (Fonte: Livro nº1216 saída dos expostos de 1870 a 1895).

Termo: Banguê, padiola para transportar cadáveres, bagaço de cana, materiais diversos. Constitui de duas varas de paus roliços presos nas laterais da lona ou tecido grosso, resistente, formando uma cama de abrir e fechar, transportado por duas pessoas. Era o transporte de indigente e escravo defuntos, muito usado até o final do século 19 na Bahia. Consta no livro “Banguê” de José Lins do Rêgo.

Termo: Carroça – No Período Colonial do Brasil era comum este meio de transporte; a carroça é uma caixa de madeira sólida, aberta ou fechada colocada sobre eixos entre rodas de madeira. Puxada por tração animal, podendo ser bois, cavalos ou jegues. Muito usado nos Engenhos, fazendas, chácaras e nas cidades para o transporte de mercadorias e uso geral. Hoje é mais frequente no meio rural. Foi daí que surgiu o transporte de passageiro.

Termo: Cadeira de Arruar – Assim chamado por escravos e senhores como transporte. “Era carregada suspensa por dois negros africanos bastantes fortes, alguns bem vestidos conforme o luxo do veículo. Havia assento para uma ou duas pessoas. Por muito tempo a “cadeirinha de arruar” constituiu o único meio de condução, entre os baianos nos ombros dos africanos chamados de “carregadores de cadeira”. A princípio era a cadeira privilégio dos fidalgos, magistrados, médicos clínicos, professores notáveis, senhores de Engenhos, comerciantes, cônegos e vigários, enfim, tornou-se o distintivo do poder financeiro. Nem todos podiam manter certo número de escravos, reservados para o serviço exclusivo da “cadeirinha” eles custavam hum conto de réis. As cores vivas e os ornatos da libré dos carregadores, já dizia quem ia ali. ( Fonte: Livro “Cantando e Rindo”- Lulú Perola – 1866 á 1942 pub. Em Salvador/ Ba. Em 1952.

Termo: Presiganga – Navio presídio, antiga fragata encalhada no mar. Utilizado pelo Governo luso-brasileiro na década de 1830 e administrada pela marinha. Era local de castigo aos presos e aos recrutas encaminhados a força entre a população mais pobre. Nesta masmorra do mar, foi preso o lendário revolucionário “Cipriano Barata”- Cipriano José Barata de Almeida (nasceu na Bahia em 26.09.1762 e morreu em Natal em 07.06.1838) era médico e político brasileiro o mais atuante em sua época em combate em favor da Independência do Brasil. “O presídio era um local infecto, imundo, quente e salubre em maré cheia o navio ancorado enchia as dependências de água até a cintura dos presos em convivência com caranguejos e mariscos peçonhentos o que levava a muitos à loucura.”

Termo: Aljube quer dizer prisão ou cárceres do Foro eclesiástico – local de prisão dos padres que pertencia a Miltra Metropolitana. Mas, esta exclusividade foi extinta e o presídio abrigou condenados de várias procedências sociais.

Termo: Bonde, assim chamado pelo povo. Era o transporte popular responsável pelo tráfego em determinadas ruas. Veículo movido a tração animal, depois criaram outro sistema em atração elétrica, mas permaneceu o mesmo nome.

Termo: Archote: - Facho de palha grossa, tipo funil, transparente ou qualquer outro recipiente que conduz luz, cordão untado de breu ou óleo de mamona, muito usado na época para iluminação, o povo carregava em acompanhamento de préstito de cortejo religioso.

Termo: Pendão – Bandeira, estandarte; carregado por pessoas nas procissões e nas festas cívicas Termo: Tostão, moeda divisória em cunhagem de cobre, foi circular em 1918 para facilitar o troco cujo valor era de 100 réis.

Termo: Vintém, moeda que valia vinte réis, cunhagem de níquel.

Termo: Ex- Voto significa milagre alcançado pelo devoto, objeto expostos na sala interna das Igrejas, ver na Igreja do Bonfim e outras Igrejas tradicionais.

Termo: Castiçal, utensílio de prata ou de alumínio para carregar vela, usado em Igreja e residência particular.

Termo: Pataca, moeda que circulou em mais tempo no Brasil em 1695 a 1834 de prata do valor de 320 réis.

Termo: Tina, recipiente de madeira para armazenar água. Utensílio doméstico.

Termo: Caixão, mortuário.

Termo: Vigário ou padre da paróquia, párago.

Termo: Chapéu de sol ou guarda-chuva de pano de seda.

Termo: Caixeiro, vendedor de loja em balcão.

Termo: Tamanco, calçado grosseiro de madeira mole com tira de couro.

Termo: Coveiro, aquele que faz cova no cemitério.

Termo: Chilique, desmaio, ataque nervoso.

Termo: Camisola, camisa longa para dormir.

Termo: Gás; combustível querosene. Muito usado na época.

Termo: Caloteiro; aquele que não paga.

Termo: Rapazola, rapaz crescido; garotão.

Termo: Baticum, batida no tambor ou em qualquer lugar que produza som.

Termo: Lorota, mentira, pessoa avesso a história.

Termo: João Ninguém, pessoa que não faz nada e não tem nada como viver.

Termo: Tinteiro, recipiente de vidro que contém tinta para escrever. Geralmente molhado no “bico de pena” ou de “bico de aço” chamado também de “bico de escrever”.

Termo; Caiação, pintura na parede ou no teto da casa com brocha e cal virgem diluído na água, forma a tinta.

Termo: Samba arrojado, com pratos de louça batendo com os cabos das colheres ou com a faquinha de cortar fumo. As negras e crioulas dançavam com os pés descalços levantando a poeira do chão. Balançando a saía rodada no giro dos movimentos. É samba de roda e os negos assanhados tocando as suas músicas.

Termo: Vexame, momento difícil em que a pessoa não pode se expressar, embaraço.

Termo: Chibante, pessoa que se mostra com muito orgulho.

Termo: Sarau, festa noturno, reunião festiva em casa particular com amigos ou entre as sessões de teatro.

Termo: Almotacés; pessoa encarregado de controlar a qualidade dos produtos vendidos nos mercados populares e nas ruas vendeiras. Os preços e medidas e as condições de higiene e limpeza, funcionário da Câmara Municipal.

Termo: Trabalhos de Ganhos, escravo liberto que fazia serviços gerais por conta própria.

Termo: Artífice, profissional que trabalha na profissão especializada ou seja; artesão, carpinteiro, pedreiro, marceneiro, funileiro, ourives, mecânico, pintor, calafetador, ferreiro, armador etc. Deveria ser um artista com registro na Câmara Municipal.Abrangia o Ofício como função do trabalhador profissional, barbeiro, alfaiate, sapateiro, vendedor(a).

Pesquisa - Álvaro B. Marques

batacoto
Enviado por batacoto em 28/04/2019
Reeditado em 07/05/2019
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