De Emília e de Burro Falante todos nós temos um pouco
(texto postado no Facebook em 23.10.2014, por ocasião do segundo turno eleitoral. Pelo que se lê, é da época em que eu tinha paciência para escrever, e cabe perfeitamente neste momento, em que nada de essencial no texto mudou: continuo tentando me manter calma e racional, ao mesmo tempo em que administro o pavor e a tristeza, porque me recuso a correr da raia ou a morrer nela.)
Enquanto tento me manter calma, frente a pilha considerável de trabalho, também observo (apavorada e entristecida - e nem sei qual dos dois sentimentos é mais forte!), postagens de amigos e conhecidos, indicativas de suas preferências quanto à escolha para o poder executivo federal. Dentre uma imensidão de formas, nesse inexorável veículo de propaganda, há publicações irônicas, escrachadas e sérias, links de jornais, charges e montagens, e os manifestos opinativos (pretensamente) embasados em pesquisas e notícias variadas.
E penso no quanto gente honesta pode ser enganada, pois faz parte de sua natureza esperar o melhor dos outros, já que os decentes também são, em geral, generosos (lembrando: generosidade, nessa terra brasil e incendiada de calor quase humano, é artigo confundido com tolice, portanto, só tem valor para quem lucra com ela).
Mas quando pessoas honestas perdem o senso de lucidez e racionalidade, e se deixam cegar por paixões políticas (ou ódios políticos - porque o contrário de paixão é indiferença, que cega para a estesia e para o sonho) a teia de enganação aumenta em raio de escala geométrica. E aí vemos pessoas decentes se tornarem não confiáveis - execráveis, portanto.
Pois é: enquanto tento ainda mais me manter calma, frente ao desconforto de ver pessoas decentes escolhendo fechar seus olhos à racionalidade e à sensatez, penso que cabe a cada um analisar informações de forma responsável, antes de repassá-las como verídicas, emitir opinião embasada nas informações, pedir um milagre de joelhos, fazer despacho aos orixás ou se descabelar aos gritos, porque cabe a cada um zelar por sua decência.
E não digo mais nada, só penso.
E lembro duma frasezinha de Emília, a boneca mais macunaímica que já foi criada, em 'Reinações de Narizinho': "De tanto pensar morreu um burro".