Suco de Caju

Concordo que há assuntos sérios que sempre devem ser preocupação de quem escreve, mesmo o escrevinhador sendo um mero caçador de ticacas como é o meu caso. No entanto, como sou um sujeito insistente, um matuto chato, meio rude, prefiro às vezes ceder a minha vontade de contar causos do passado. Coisas de véio que tá quase variando. Mass que posso fazer se sou viciado em divulgar as minhas recordações?!!!!!! Vamos a uma delas.

Quando era funcionário do BNB, sempre na agência de Pesqueira, também sempre na carteira rural, tinha um colega que trabalhava comigo que tinha - e tem - o apelido de Carlos Gabiru (o motivo é que era um "rato"no jogo de bola de gude). Numa casa vizinha ao banco, um chalé muito bonito, morava o dono de uma farmácia que nas quartas-feiras mandava assar acho que uma manta de carne de sol (a família era mais ou menos grande). Quando a carne começava a assar o cheiro exalava e chegava justamente onde ficava a carteira rural do banco. O gabiru ficava em êxtase, não conheci quem goste tanto de comida. Quando dava onze horas das quartas-feiras, ele parava tudo que estava fazendo ficava perto de uma espécie de janela somente aspirando cheiro da carne de sol. Não tinha outro assunto, só elogiar a carne de sol, acho que comia mentalmente um pedação da carne. Era auma graça.

Vamos ao cerne (gostaram da palavrinha?). O prefeito da cidade, João Leite, que passava horas conversando com a gente sobre o Rio de Janeiro onde vivera na mocidade, às vezes até dormia na cadeira, era nosso cliente, tinha város empréstimos. Certo dia, era uma quarta-feira, ele chegou logo cedo ao banco, oito horas quando abriu ele entrou, queria levantar a segunda parcela de um empréstimo e tinha apalavrado pagar a uns fornecedores de Caruaru à tardinha. Acontece que para liberar a parcela era preciso um laudo de vistoria constatando a aplicação da primeira parcela. Detalhe: o fiscal estava de folga. Seu João ficou triste, mas descobri um meio de resolver o problema: investir alguém nas funções de fiscal e ele ir à fazenda e elaborar um laudo. Como eu não podia ir porque ia atender vários clientes, investi o Gabiru, mesmo sabendo que ele não sabia diferenciar um boi de uma vaca e nem um pé de palama de um de capim. Mas notei que ele ficou meio em dúvida. Esclareci a seu João o motivo: o cheirinho da carne de sol da casa de Seu Carlos Silva. Seu João dsse a ele: - Baiano de Chorrochó (só chamava o Gabiru assim), você não vai se arrepender, mandei guisar uma galainha de capoeira em panela de barro, você vai raspar até o cororó, além disso o feijão tem umas toras de charque. Os olhosde Gabiru brilharam.

Na volta deixamos o caixa aberto até as quatro da tarde, eles cegaram às três, Seu João estava rindo e o Gabiru meio encabulado. Enquanto fazíamos o laudo e a liberação da parcela, Seu João contou que o fiscal não sabia distinguir um bode de uma cabra, mas era muito comedor raspou com farinha o cororó da panela. Disse mais, afirmou que havia uma jarra na mesa com um líquido meio escuro parecendo suco de caju, o Gabiru botou um copão, tomou metade, lambe os beiços, mas fez uma observação: - Seu João, o suco de caju tá nos trinques, mas parece que sua secretaria esqueceu de botar açúcar. Seu Joao disse que entalou de tanto rir e disse a ele: - Baiano de Chorrochó onde foi que você viu pé de caju por aqui? O que você bebeu foi água do barreiro que o banco financiou. Nunca esqueci esse causo, nem eu nem Gabiru, nem os colegas e nem a rua porque a história vazou. Seu João enquanto viveutoda vz que me encontrava relembrava o causo. Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 13/04/2019
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