[Fatos e Trapos] Um dia nem tão bosta assim...
Não sou de acordar feliz, sorridente e arrotando “bons dias”. Até quando transo o dia começa uma bosta só por ter começado. Todavia, hoje foi uma tremenda merda!
A BR-116 estava cheia. Horário de pico pela manhã. Pneu do carro estourou... “tudo bem” – foi o que pensei. Coloquei o carro na esquina de uma rua e tome força. Afrouxa os parafusos, bota o macaco, roda e roda... Meu suor feminista se mistura ao meu ódio matutino e o ápice ocorre quando o pneu não sai. Ferrugem. Deitei no chão e tome chute, mas nada do pneu sair.
Desisto. Esse pneu só vai sair com um anticorrosivo.
- o senhor conhece alguma borracharia por aqui?
- tem uma naquela rua.
Chegando já bem cansada, suja e mal-humorada, o borracheiro disse que não tinha um anticorrosivo mas se ofereceu pra tirar o pneu. Enquanto o borracheiro trabalhava chega um senhor de idade e bem falante, aparentemente, amigo do borracheiro. Pediu pra por um “arzinho” no pneu do carro dele. O carro dele tinha um adesivo, ainda da campanha presidencial de 2018, rasgado até a metade. Só aparecia o número 17.
“Cassetada” – pensei. “É certo que nada está tão ruim que não possa piorar...”
Conversa vai e conversa vem, o senhor comenta com o borracheiro:
- Macho, tu botou um anticorrosivo ai?
O borracheiro ficou calado. Na verdade, o borracheiro não disse nem oi pra o senhor que chegou, simplesmente, levantou e entregou a mangueira de ar.
O visitante continuava falando...
- As coisas estão difíceis como esse pneu, viu? E vão ficar pior. Aquele desgraçado do Bolsonaro disse que ia mudar isso e mudar aquilo. Agora ninguém nem vê mais o homem. O homem sumiu! Coitado dos meus netos que vão segurar esse reforma ai, cara! Uma covardia! Nem a porra do Lula faria isso!
O borracheiro permaneceu calado, mas eu dei meu primeiro sorriso do dia. Aquele era um “bolsominion” arrependido! E falava mal do Bolsonaro, falava da vida dele, falava da vida dos outros e também do pneu, mas o borracheiro permanecia calado. Colocava óleo e batia. Solvente e batia. E já estávamos assim por 1h: o borracheiro tentando sacar o pneu, eu rezando pra ele conseguir sacar e o visitante falando sem parar.
- Macho, tu botou um anticorrosivo ai? – pergunta o visitante, 1h depois, mais uma vez.
O borracheiro ficou calado, mas já transpirava impaciência e ódio.
- Macho, isso só vai sair com um anticorrosivo... tu não colocou? – depois de falar da mãe de fulano que se separou de beltrano, o visitante tentou mais uma vez.
- CARA, VAI EMBORA DAQUI! VAI EMBORA! – o borracheiro gritou! - Estou há uma hora batendo na porra desse pneu e tu só falando merda esse tempo todo. É cara! É! O Bolsonaro te enganou, otário! Agora vai embora daqui! Para de atazanar meu juízo, porra! Se eu tivesse a porra do anticorrosivo eu teria botado já, porra! Desculpe ai, minha filha, mas é que perdi minha paciência com esse ai já!
O visitante fez uma cara de susto, baixou a cabeça, foi até o carro e voltou com uma sacola...
- Oxe! Tá irritadinha, sua velha! Eu tenho anticorrosivo no carro. Tá ai! Peça perdão!
- Perdão pelo o quê? Por isso na tua mão não ser uma arma ou por nenhum neto nosso se aposentar? A culpa é sua, seu porra! Me dá isso aqui, caralho! – disse o borracheiro pegando o anticorrosivo.
Eis o meu segundo sorriso do dia, que antecedeu uma pequena gargalhada e o início de um bom dia.