DA VELHA JANELA
Da velha janela eu contemplava
Um mundo, vivo, real.
Parecia-me tudo um sonho
Mas não era sonho;
E as musas que ali havia
Comigo segredavam noite e dia.
Por sobre nuvens eu andava
Leve como uma pluma;
Sim, eu podia voar e não sabia,
Eu era noite, eu era dia,
Era chão e,me comovia
Com a leveza duma libélula
Quando sobre a água do rio repousava,
E não submergia.
Mendigos por ali não havia
Perto ou longe da velha igreja,
Eu, baixinho, então dizia:
Louvado seja Nosso Senhor,
Que mata a fome ao agricultor
Que rega a terra com seu suor.
Para não dizer que mendigos não havia
Havia o ti Zé “malagueta” do pé torto
Com seu saco roto cheio de nada,
Sobre o qual a cabeça repousava
À sesta,
Sob a velha romãzeira,
Da porta da sala de meu bom avô Lourenço.
Agora, já de estômago a repimpar
De sopa de broa e do bom vinho
Que meu avô lhe ofertava,
Até sorria;
E as velhas mágoas que ele carregava
Eram coisas de outro dia.
Graças às artimanhas do maroto Baco
Que até a um velho de saco roto
E pé torto,
Ainda que por fugaz instante,
Trás um pouco de felicidade
A quem a vida negou esse direito.