Entre choros e remédios

Eu tento evitar publicar textos que trazem à tona toda a minha tristeza. Se me julgam triste nos meus textos, peço desculpas. Mas é que encontrei na escrita - e na escrita sobre a minha convivência com um transtorno afetivo - uma forma de viver, de trazer alguma coisa de leveza para a vida e para a reflexão sobre a caminhada. Eu também busco por pessoas para partilhar impressões, tentar levantar o astral e assim quem sabe estar incluído em uma tribo.

E nesta busca de partilhar sobre meu convívio, senti necessidade de contar sobre a última crise que tive. Foi no mês passado. Era um domingo bonito, de sol. Já havia saído de manhã pra correr, e almocei bem. Então por volta das duas da tarde eu sentei na minha cama e peguei a minha “bolsa” de remédios. Eu tomo vários, e não vale a pena elencar agora, mas por esta minha condição, de cara já temos três medicamentos ligados ao controle da Depressão e do transtorno bipolar. Eu uso uma caixinha organizadora, para não deixar de tomar nenhum, então há um compartimento para cada dia. Como também tenho feito uso de vitaminas (que suplementam, pois pratico exercícios físicos regulares) e as drágeas possuem tamanho razoável, acabo utilizando dois compartimentos por dia - manhã e noite - servindo a organização dos remédios para 3 dias e meio.

Tenho uma metodologia bem peculiar: pego cada caixa de remédio e tiro da bolsa, ponho em cima da cama. Vou pegando um a um, destacando da embalagem e colocando a semana inteira na caixinha… são remédios de tamanhos, formatos e cores diferentes. A Lamotrigina combina um pouco com a Losartana, mas as cores são distintas; A Levotiroxina lembra um Laxante; As vitaminas estão em drágeas coloridas e o Carbolitium…

O Carbolitium.

Enquanto eu ainda destacava os remédios pra pressão arterial, pensava neste último medicamento. Tão recente mas de tamanho impacto.

A que ponto eu cheguei?

Aliado ao medicamento, estão as palavras de meu psiquiatra: “Você não vai vencer esta vontade de se matar com atitudes. Você precisa do remédio”.

Eu sei que pode parecer estranho isso… mas eu já tentei de tudo, e mesmo a mudança de estilo de vida, aliado aos exercícios físicos não trouxeram pra mim um melhora. Qualquer estresse que eu tenho me desestabiliza demais, e caio em pensamentos como estes.

E as palavras do médico foram muito impactantes. Não que já não tenha ouvido isso antes dele, de outras formas, mas eu tentava, tentava. Parecia que ali ele queria me fazer acordar, como que eu precisasse, mesmo que por uns meses, utilizar uma muleta para ter alguma qualidade de vida, longe de pensamentos ruins. Eu não fiquei magoado com ele e peço que não o julguem. Ele é super competente. Escrevi isto para mostrar que eu cheguei em um ponto em que eu precisei fazer algo para além das minhas forças, ou vontade. Nem sequer consegui me perguntar sobre como ter chegado até ali, a ponto de precisar de um remédio para não continuar pensando em me matar.

Continuava a destacar remédios e colocar na caixinha, ao que a primeira lágrima desce. Uma mistura de decepção comigo mesmo e a sensação de que as coisas estavam chegando ao fim. Eu já tive momentos ruins, de chorar, de me trancar no quarto… de querer morrer… mas este dia foi diferente. Eu me vi derrotado, sem ao menos perguntar o porquê de ter chegado a esse ponto, sem motivo algum.

Aos poucos o choro foi tomando intensidade.

Fui me esquivando de ser notado dentro de casa. Passos no corredor me faziam baixar a cabeça e fingir que estava tendo crise de rinite. Não consegui. Deitei e fiquei olhando para o teto branco. Por alguns momentos desejei estar internado, isolado, não sendo um peso para os outros.

Não conseguia parar de chorar. Fechei a porta e então a dor aumentou, chorei mais alto, parecia que havia perdido alguém.

Demorou muito até que a calmaria chegasse. Ao final de tudo, a caixinha repleta de remédios. Ainda chacoalhava os remédios, como uma brincadeira de criança. As drágeas verdes, a tonalidade amarelada da Lamotrigina e o formato da levotiroxina traziam uma certa calma. Uma espécie de Candy Crush em 3D.

Minha cabeça doía, meus olhos pareciam esbugalhados. Percebia-me anestesiado, dopado. Esperando somente que um dia tudo acabasse.

Respirei fundo e olhei o relógio… apaguei a luz e fechei a cortina. Já havia se passado uma hora. Um suspiro parece ter tirado de dentro de mim uma luz vermelha, um expurgo.

Uma certa calmaria.

Uma experiência que me marcou.

Talvez um dia eu continue esse relato.