esperança

(texto originalmente publicado em junho de 2017)

O Brasil é um país singular, talvez por este motivo tenhamos tanta dificuldade de deixar de ser o país do futuro para nos tornarmos uma nação do presente, com justiça, qualidade de vida e soberania. Temos uma dimensão continental, um povo miscigenado, o que, se não chega a eliminar segregações, muito às reduz em comparação com outros países, somos riquíssimos do ponto de vista de recursos e maravilhas naturais, nosso povo fala uma única língua e tem índole alegre, amistosa, pacífica e otimista.

Mas sabemos muito bem que virtudes despertam a cobiça e a inveja. Por isso, é preciso saber proteger as virtudes. É possível que em primeiro lugar, neste momento que vive o país, seja necessário proteger a índole amistosa, pacífica e otimista de nosso povo. Estas virtudes serão essenciais para que possamos defender as demais.

A índole amistosa e pacífica parece andar estremecida pela polarização em torno de escolhas ideológicas e partidárias. É antiga a máxima de que com amigos não devemos discutir religião, futebol e política. Mas agora diferenças de opinião sobre política resultam em inimizades e mesmo hostilidades e agressões. Se refletirmos desapaixonadamente, constatamos que erros e acertos existem nas várias tendências políticas e partidárias, mas como nunca antes lados opostos acusam-se mutuamente de corruptos, bandidos e entreguistas, ao mesmo tempo em que se consideram donos da verdade e da santidade. O que teria conduzido o povo amistoso e pacífico a essa agressividade? Estaríamos sendo vítimas da disseminação de uma planejada discórdia, atendendo ao aforismo “dividir para governar”? E, se assim for, quem quer nos governar?

A alegria e o otimismo do povo brasileiro parecem também estar em crise, junto com a índole amistosa e pacífica. Um dos indícios da falta de confiança no país tem sido demonstrado pelos jovens talentosos e idealistas, que se qualificam profissionalmente em nossas universidades. Assim que obtêm o diploma, cogitam obter colocação profissional em Portugal, no Canadá, na Inglaterra, na Austrália... Dizem que o Brasil não oferece bons postos de trabalho, e, principalmente, o país não oferece perspectivas de um futuro seguro no que concerne ao trabalho, à justiça, à dignidade, à liberdade... E assim preferem ir-se embora.

Já houve época, lá pelos anos 1960-70, que jovens talentosos e idealistas abandonavam o país. Naquele tempo, exilar-se era questão de sobrevivência. Se ficassem, não poderiam manifestar suas ideias, não poderiam nem conversar sobre elas, sob risco de serem tachados de terroristas subversivos, e serem presos, torturados e até “atropelados” ou “suicidados”. Até os dias atuais ainda pagamos tributo àqueles sombrios tempos, pois muitas das mentes mais brilhantes do país ou evadiram-se para não mais voltar, ou foram caladas, ou calaram-se sob o peso de traumas inimagináveis. E deixaram um vácuo de idealismo humanista e patriótico que influencia até hoje as novas gerações.

Agora as razões para a desesperança no país são outras. Não é possível acreditar na construção de uma nação com os poderes todos tão corrompidos. Se não encontrarmos um caminho para que a ética e a solidariedade voltem a orientar os brasileiros, povo e autoridades, em breve o país estará entregue a uma quadrilha enraizada no poder e seus vassalos.

Publicado no blog http://perrengasprincesinas.blogspot.com/2017/