viagens psicotrópicas
As substâncias ditas psicotrópicas, entre elas a maconha, são aquelas que agem sobre o sistema nervoso central e alteram nosso psiquismo, ou seja, a forma como pensamos, fazemos, percebemos, reagimos e, sobretudo, sentimos. Entre os tipos de drogas psicotrópicas, a maconha é incluída no grupo daquelas que são perturbadoras da atividade do sistema nervoso central. Trata-se de uma mudança qualitativa, o cérebro passa a funcionar fornecendo uma leitura perturbada da realidade.
Por isso o uso das drogas psicotrópicas proporciona as faladas “viagens”. A mesma realidade vista e sentida de uma forma alterada pela droga é como se fosse o descobrimento de uma nova realidade, como aquela que é buscada numa viagem a um outro lugar, um outro país. Mas seriam estas duas viagens comparáveis? Ou seria uma delas a fuga de uma realidade inconveniente, muitas vezes cruel, e a outra um alargar de horizontes que acrescenta à visão que temos do mundo real e da humanidade?
O uso das drogas psicotrópicas para as “viagens” que elas propiciam é crescente, principalmente entre nossos jovens, nas escolas, universidades, festas e lazer. Talvez porque a realidade que estejamos oferecendo aos nossos jovens seja por demais decepcionante e frustrante, e as drogas ajudem a criar a temporária ilusão de uma realidade menos dura. Então a atração pela droga de fuga torna-se por demais tentadora.
Mas a que custo? As drogas trazem grande risco de dependência física ou psíquica, de abertura do caminho para drogas ainda mais nefastas e, o pior, de encarceramento dos jovens na implacável rede do tráfico. De consumidor a devedor, de devedor a “avião”, de “avião” a traficante, deste a presidiário ou um nome no obituário é uma trajetória muito provável. Jovens talentosos e promissores seduzidos para a fuga da dura realidade perdem o foco, desacreditam da sociedade e de todos os caminhos ditos “normais”, passam a cometer pequenos delitos, e muito frequentemente acabam por percorrer o lamentável caminho que os levará até o ceticismo, a criminalidade e suas drásticas consequências.
O caso das faculdades e universidades, se não o mais crítico, é alarmante. Nessa época os jovens encontram-se particularmente vulneráveis à sedução da droga. É no curso superior que os jovens deixam de ser adolescentes e tornam-se adultos. Uma transposição de muitos conflitos e inseguranças íntimas, agravadas atualmente pelos desatinos de nossa civilização. E é uma etapa em que em tese os jovens estão adquirindo a qualificação na profissão que virão a exercer. No caso das universidades públicas, toda a sociedade, desde o mais humilde até o mais ilustre e abastado cidadão, estão investindo, com seus impostos, na formação de um profissional de quem se espera uma retribuição para o bom funcionamento da comunidade em que vivemos. Que tem muitos problemas a serem resolvidos. O desvio destes objetivos, a fuga da realidade, no caso, configura a quebra da responsabilidade de fazer bom uso de todo esforço na formação de um bom profissional.
Como alertar, ou melhor, convencer os jovens de que, apesar dos muitos reveses que certamente sobrevirão, enfrentar a crua realidade pode ser um caminho mais promissor, seja para transformar esta nossa deteriorada sociedade, seja para a realização e emancipação pessoal? O que dizer a eles? Que as drogas enganam, criam uma ilusão, mas o seu caminho é o do fracasso e do encarceramento? Ou que mais vale um franco confronto com as muitas iniquidades cotidianas, cujas ainda que raras vitórias compensarão largamente as inumeráveis derrotas, graças à sensação de uma lenta mas consistente transformação da bizarra civilização que vivemos?
O caminho que o sistema tem encontrado para coibir o uso das drogas psicotrópicas é a lei e a repressão. A produção, o porte, o uso, o tráfico são crimes punidos com penas severas. Apesar disso, parece crescer o número de adeptos e defensores do uso das drogas, como se elas pudessem libertar o indivíduo e modificar a realidade. Será? Preferiria conseguir convencer os jovens que, sim, empenhem-se firmemente em modificar a realidade, revolucionem-na! Mas não fujam dela, transformem-na, com revoluções verdadeiras, e não fugazes e químicas ilusões de mudança.
Publicado no blog http://perrengasprincesinas.blogspot.com/2016/