monotremos e utopistas

(texto originalmente publicado em 2016)

Os monotremos são nossos ancestrais mamíferos, que surgiram há cerca de 200 milhões de anos atrás, no tempo em que dominavam o planeta os répteis, alguns enormes e vorazes predadores. Os monotremos, por sua vez, eram pequenos, alguns com menos de uma grama de peso. Acredita-se que se alimentavam de insetos, nozes e frutas. Existem ainda espécies viventes até hoje de monotremos, a mais conhecida é o ornitorrinco australiano, que parece uma bizarra mistura de réptil, pássaro e mamífero.

No tempo dos primeiros monotremos, um viajante do espaço que observasse a primitiva vida na Terra talvez imaginasse que aqueles pequeninos seres não tinham chances de sobrevivência. Além de sua pequenez, os filhotes nasciam ainda totalmente despreparados para a vida, tinham de ser amamentados e cuidados por suas zelosas mães até que pudessem enfrentar por si sós as agruras da sobrevivência, àquela época muito mais cheia de armadilhas mortais que atualmente.

Mas, quem diria, os monotremos deram origem aos mamíferos, entre os quais nós, seres humanos. E costumamos dizer que somos a espécie dominante no planeta. Será?

Não há como deixar de comparar os monotremos com os utopistas, seres humanos assim chamados por defenderem utopias, ou seja, aquelas quimeras muito evoluídas para além da cruel realidade em que vivemos hoje. Tal como os monotremos, os utopistas ainda são uma discretíssima minoria, parecem frágeis, vítimas indefesas num mundo em que os evoluídos mamíferos, nós, seres humanos comuns, mais parecemos agir como os vorazes répteis do tempo dos monotremos.

Mas talvez, bem como os monotremos, os utopistas sejam a semente de uma linhagem evolutiva que vai gerar uma nova espécie destinada a prosperar, e quem sabe até dominar, este mundo em que vivemos. Ao longo da história, os utopistas, que pregam solidariedade, amor, reverência à natureza e ao próximo, desde Cristo até Chico Mendes, têm sido incompreendidos, discriminados, perseguidos e assassinados.

Mas a lei da evolução parece ser mesmo implacável. O novo pode surgir com ares de fracasso, mas basta-lhe a prova do tempo para mostrar a que veio. A evolução é paciente, perseverante, inexorável.

No caso dos monotremos, duas centenas de milhões de anos foram necessárias para que surgisse a complexa e pensante espécie que denominamos Homo sapiens. E no caso dos utopistas? Quanto tempo será necessário até evoluírem para se tornarem a espécie mais evoluída do planeta? Com certeza terá que ser muito menos tempo. Porque se não evoluírem logo, não restará mais planeta a ser habitado.

Publicado no blog http://perrengasprincesinas.blogspot.com/2016