adolescência prolongada

Conta-se que, em sociedades antigas, e também em atuais sociedades ditas tradicionais ou primitivas, é comum que aos doze anos de idade os jovens, meninos e meninas, sejam submetidos a rituais de passagem, pois essa idade marcaria a transição da criança ao adulto. Na maioria das vezes, a essa idade os jovens já teriam seus corpos adultos delineados, preparados para a reprodução. E os interesses aos poucos já transitariam de infantilidades egocêntricas para a atenção com emparceiramentos, com a sobrevivência de si, da família e do grupo, com o adestramento nas artes de desvendar e conviver com os desafios do mundo à sua volta.

Hoje em dia, discute-se o prolongamento da adolescência, o retardamento da chegada da idade adulta. É cada vez mais comum que jovens que, dir-se-ia, de há muito adultos, já beirando os trinta anos, ainda mostrem dependências e hesitações que em outros tempos eram típicas dos teenagers, os adolescentes com menos de vinte anos.

Discute-se muito a causa desse retardamento. Seria o crescente bombardeio por uma estonteante enxurrada de informações que vem pela televisão, pelas redes sociais, via computador ou os cada vez mais descolados celulares? Seria a exagerada falta de limites de uma geração de pais egressa de uma época de opressão, e que, no afã de não repassar os mesmos sufocantes autoritarismos aos seus filhos, acabou por não repassar-lhes nem mesmo os limites mais elementares para o desenvolvimento da responsabilidade? Seria o crescimento da criança numa realidade cada vez mais artificializada, virtualizada, alienada, em que a percepção do mundo exterior e do outro é cada vez mais atrofiada? Seria a somatória de todas estas, e ainda sabe-se lá quantas outras razões? Elas parecem ser tantas que os jovens sucumbem perante a dúvida e a confusão, tomam tempo demasiado para desvencilhar-se num tal emaranhado de ideias, valores, caminhos...

Mas o resultado é que a nossa sociedade vem sofrendo não só de retardamento, senão também de alheamento, de falta de discernimento e de senso de vida em coletividade. Viria daí o exagerado deslumbramento e apego a valores ilusórios, tais como a ostentação da posse de bens supérfluos, o status, a notoriedade, o poder... Daí a incapacidade de relacionar-se responsavelmente com o planeta que sustenta nossa vida moderna, cada vez mais insustentável. Daí o duvidoso refúgio nas tribos urbanas, nas extravagâncias, nas drogas... Daí a crescente violência, que já nem se sabe se necessária ou gratuita. Daí a proliferação de conflitos e guerras com motivações inconfessas, ou confessadamente sórdidas.

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Esta semana, numa aula sobre os solos agrícolas e o que temos feito deles, um grupo de alunos iria falar sobre o plantio de árvores exóticas, suas vantagens e possíveis impactos indesejáveis. Por coincidência, pela manhã, antes da aula, nos meus exercícios matinais no Campus da UEPG, deparei-me com sementes de pinus espalhadas pelo chão. Estamos no final de maio, época em que estas sementes, estrategicamente aladas, alçam voo e alcançam terras muito distantes da árvore-mãe que as gerou. Sem dúvida um artifício engenhoso da mãe natureza, que assim habilita a árvore a espalhar seus descendentes por grandes áreas. As sementes assim aladas literalmente voam por grandes distâncias, carregadas pelo vento que sopra forte nesta época do outono.

Sabia que os alunos deveriam mencionar o pinus como uma das principais espécies exóticas, com suas vantagens, entre elas esta astuciosa capacidade voadora das sementes. Mas também com muitos impactos indesejáveis, caso a irresponsabilidade humana não seja capaz de bem administrar-lhe os talentos naturais.

Então, recolhi algumas daquelas belas e delicadas sementes aladas, com cuidado coloquei-as entre as páginas de um caderno, para mostrá-las aos alunos que porventura ainda não conhecessem tais prodígios voadores.

Como era esperado, o trabalho apresentado pelos alunos em aula falava muito do pinus, destacado entre as espécies exóticas. Ao final da discussão, também como era esperado, constatei que vários alunos não conheciam as tais sementes aladas, que fazem do pinus uma espécie com particular potencial para tornar-se invasora. E que, por este e outros motivos, demandava especial cuidado e discernimento dos plantadores, para que seu uso não acabasse trazendo quem sabe mais malefícios que benefícios.

O que eu não esperava era a reação de Bruna, uma das alunas da turma que ainda não conhecia a semente, surpreendentemente uma das com mais idade na classe, já com trinta anos completos. Talvez por isso mesmo ela tenha tido o desprendimento de fazer tal observação tão imprevista, espantosa, reveladora:

- Que bonitinho! Parece as asas da Sininho!

Publicado no livro "perrengas princesinas" (2015).