Até Que a Morte os Separe

Aquele parecia ser apenas mais um dia como outro qualquer; um dia comum para os habitantes desta nossa Cidade Maravilhosa, que mais maravilhosa está, ao completar seus 450 anos.

Mas aquele dia acabou não sendo um dia como outro qualquer. Era uma terça-feira; uma manhã da segunda terça-feira, da segunda semana do mês de março do ano de 2015.

Mas o que aconteceu de tão especial naquela manhã de terça-feira?

Aconteceu o seguinte:

O relógio deveria estar marcando cerca de quinze minutos para o meio dia, quando um cidadão, entre tantos outros anônimos, caminhava apressadamente pela tumultuada calçada da Avenida Vicente de Carvalho, no bairro do mesmo nome, em direção a um supermercado, que fica bem ao lado de uma agencia bancária, localizada nas imediações de um conjunto habitacional.

Acontece que a tal agência bancária, está em uma esquina muito movimentada, e aquele cidadão teve que dar uma paradinha, para aguardar a passagem de alguns automóveis que entravam por aquela rua, para só depois então, poder atravessar com segurança. E foi justamente naquela pequena pausa, naqueles breves momentos, que uma cena em especial lhe chamou a atenção; ele viu um simpático casal de velhinhos, cuja soma de idade poderia tranquilamente ultrapassar os 180 anos, saindo tranquilos e sorridentes da tal agencia bancária.

Formavam um belo casal; ambos eram baixinhos e muito esguios. Ele com cerca de pouco mais de 1,60 e ela um pouquinho mais baixa que ele. Estavam vestidos como se fossem a um almoço festivo; ele com uma alinhadíssima calça branca e camisa polo, azul-claro, enquanto ela trajava uma moderna saia jeans e uma finíssima blusa, tipo seda, também azul-claro, sendo que tinha como detalhe. uma linda imagem de Nossa Senhora de Fátima desenhada na altura do lado esquerdo de seu peito... Até ai nada de muito especial.

Mas o que mais atraiu a atenção daquele observador ocasional, foi o fato daquele simpático casal de velhinhos formar, o que se poderia chamar de um par perfeito, porque além da sua alegria -irradiante e contagiante- eram também muito falantes e tinham uma beleza toda especial para as idades que demonstravam ter; uma beleza salutar, parecendo que ambos estavam de bem com a vida. Nenhum dos dois demonstrava ter a mínima preocupação quanto à sua posição na 'maratona da vida', e note-se que, pelas idades que aparentavam, já deveriam estar se aproximando da 'linha de chegada'. Mas eles não estavam nem aí... Curtiam-se, um ao outro, simplesmente ignorando o que se passava ao seu redor. Simplesmente não davam a mínima para todo aquele rebuliço que acontecia naquela calçada infernal. Não demonstravam nenhuma preocupação ou atenção especial para o perigo que nestes tempos ronda as pessoas, quando saem de uma agência bancária. Até parecia que estavam dentro de uma invisível 'bolha de felicidade' que os protegiam, e que apenas eles viam.

Aquela agência bancária foi recentemente reformada. Construíram uma pequena rampa para facilitar o acesso de deficientes e pessoas idosas como eles. Mas o casalzinho enamorado, preferiu 'aventurar-se' pela pequena escada também ali existente que, embora com poucos degraus, poderia dificultar a sua locomoção. E foi justamente naquela escadinha que aconteceu aquilo que mais encantou aquele, já então observador, que até alguns instantes atrás, era apenas mais um apressado cidadão.

Aconteceu o seguinte; talvez se utilizando de todo o seu conhecimento na arte da conquista, aquele mui simpático sênior cavalheiro demonstrou ali, uma bela performance, ao se colocar sempre um degrau abaixo de onde estava a sua amada, ao mesmo tempo lhe estendendo a sua mão direita -um pouco trêmula, é verdade- amparando-a naquela sua pequena odisseia; gesto este que era sorriso apaixonado, emoldurado por uma dentadura perfeita... Sorriso que parecia iluminar aquele rostinho suave de sua amada...

E aquele olhar tão vibrante, dirigido à sua amada; foi um olhar tão apaixonado e penetrante, que por muito tempo não saiu da memória daquele solitário observador...

Era como se uma cortina do tempo se abrisse ante os seus olhos, e ele visse ali, na imagem daquele casal de velhinhos, algo muito além da sua visão; algo que talvez pudesse representar aquilo que seria o ápice da mais profunda demonstração de amor e carinho entre dois jovens apaixonados.

E mesmo estando a alguns metros daquele simpático casal -pois ainda se encontrava do outro lado da calçada- ele pode, naqueles breve espaço de tempo, absorver; sentir no ar, a força e o poder daquele amor tão profundo e singelo, que nem o tempo, muito menos a idade avançada daquele casal, foi capaz de arrefecer... E ele teve o discernimento de perceber que ali sim; naquele simpático casal de velhinhos, certamente se cumpriria aquela célebre promessa que os apaixonados costumam fazer diante de Deus no momento sublime do Sacramento do Matrimônio: "Até que a morte nos separe"...

ERCalabar
Enviado por ERCalabar em 21/03/2019
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