EDUCAÇÃO e COMPORTAMENTO... e sua relação com a violência

A semana termina marcada pela violência como tema mais discutido. Entre as múltiplas relações que são possíveis de extrair dos dois episódios centrais (Suzano-SP e Mesquitas na Nova Zelândia) estão três que estão presentes em muitos dos comentários e análises mais sérias sobre os ocorridos: armas, educação e comportamento. Sobre estas relações, hipotéticas ou reais, tento construir um pensamento sobre o cotidiano por meio de uma perspectiva singular, uma crônica que está permeada de outras ‘crônicas’.

Para deleite próprio e consideração de outros que se arriscam de me ler, eis uma pequena síntese pessoal. Sobre meus pensamentos – sempre egoístas e em formação – aqui publicizados. Pondero análises que podem ser entendidas de diferentes perspectivas e diversas vistas de pontos e pontos de vista. Reflito focando sobre a relação entre o comportamento e a educação. Comportamento como ritual que expressa o sujeito, de fato, e educação como componente que define e engendra nossos (todos) comportamentos.

A base da minha experiência com este discurso, hoje, tem diversas bases e relações. Certa e verdadeira? Espero que não. Assim, tenho chances de mudar de opinião – única forma de evoluir no discurso.

Considero que todos os nossos atos, também os apenas pensados, são educativos. Podem educar e deseducar. São exemplos em diferentes níveis, principalmente níveis desconhecidos. Primeiro, para mim mesmo, depois, para os demais. Qualquer que seja meu comportamento ele pode servir para alguém segui-lo, desdenhá-lo e afirmar que nunca fará o mesmo. Para mim – egoisticamente – isso é educação. Assim estamos sempre educando e ao mesmo tempo permitindo que o sujeito mesmo se eduque seguindo, ou não, nossos modelos.

Humanos são sociais. Sociais porque humanos. Humanidade e sociabilidade não são componentes dados ao homem e mulher por meio de sua genética ou outro viés natural ou ‘metanatural’. Precisam ser engendrados em cada um de nós. Precisam ser ensinados por meio da educação. Ser humano e ser sociável só podem ser caracterizados usando-se elementos do discurso para analisar e classificar o comportamento expresso. Ainda não se julga ninguém pelo simples fato de pensar em ser, ter ou promover atitude antissocial. Ainda. Assim, virtudes como ser bom, mau, saudável, patológico, ético, antiético, violento, comedido são expressões atitudinais que só podem ser caracterizados observando-se o comportamento dos sujeitos ou indivíduos.

Nesta perspectiva, minha, todos os comportamentos tem, pelo menos, alguma relação com a educação. Pode-se discutir se são determinantes ou não. Igualmente podemos concordar ou discordar se o indivíduo é ou não educável. O fato é que nesta perspectiva – outra vez para mim – para um indivíduo tornar-se sujeito social de uma cultura ele precisa assimilar e manifestar os valores da educação e se comportar de acordo com eles. Caso contrário a sociedade cobra-lhe a falta de relação entre sua educação e seu comportamento de acordo com o aprendido e manifestado. Assim, e se assim o for, comportamentos são ensinados, aprendidos, em casa, na sociedade, nas escolas, em todos os lugares.

Logo alguém pode questionar: e se a família e escola querem ensinar, mas o indivíduo não quer aprender? É culpa daqueles que este vira antissocial? A querela pode gerar opiniões diversas, abertas, nunca resolvidas em absoluto. Entendo, hoje, que a) o indivíduo não é educável; não é possível educar o ser humano, embora a educação seja um ‘mal necessário’ à possibilidade de vida social (Freud); b) ‘ninguém educa ninguém’, educamo-nos em relação (Freire); c) a educação é um processo pelo qual o indivíduo passa de ser imaturo para sujeito sociável de acordo com o processo de humanização e socialização, sendo o homem produto da educação (Charlot) e d) a ‘essência’ humana é o conjunto das relações sociais (Marx). Em todas estas fontes o homem precisa ser ‘educado’, mesmo ele não querendo sê-lo. Quem aceita a educação, ou não, é o próprio indivíduo. Aceitando, sendo assim educado, espera-se que tenha comportamento adequado ao que se considera saudável em termos de comportamento social. Não aceitando a educação, torna-se ou continua sendo apenas um indivíduo sobre quem se diz não ter ‘educação’. Mas ele tem educação, foi ‘educado’, apenas não a aceita...

Quase sempre, quando um indivíduo – alguém que se torna violento não é mais sujeito, pois tal qualificação implica aceitação de componentes comportamentais socialmente impostos ou convencionados – torna-se alguém violento gerando prejuízos sociais, a discussão centra na psicopatia com relações ora na educação, ora no comportamento ou a relação entre os mesmos e ainda na possível culpa da própria sociedade em relação à maneira como ocorre a formação das exigências sociais em termos de comportamentos (fixos, dinâmicos, rebeldes, tradicionais, abertos, enfim...). Se os autores acima estão certos este indivíduo tem educação sim, mas distorceu a mesma promovendo uma educação singular em desacordo com o que a sociedade indica como adequada. Nesse sentido pergunto eu: podem nossos atos de educar ser de forma positiva e negativa? Podem os produtos da nossa forma de educar e ensinar resultar em comportamentos inadequados, mesmo violentos e agressivos em relação aos nossos objetivos? Minha resposta é sim. Outra questão: estaríamos envolvidos com os comportamentos inadequados? (...).

Todo comportamento é: a) comunicação de algo; b) fruto de uma relação que envolve educação.

Educação está no centro de toda manifestação social. Só existe sociedade a partir da educação para o social. As sociedades primitivas também educavam. Não no sentido de uma finalidade para uma sociedade e sim à sobrevivência (Educação difusa). A educação que não alcança seus objetivos acaba em comportamentos antissociais. A diferença das sociedades primitivas e ‘modernas’ é que naquelas o indivíduo que não aceitava a educação não sobrevivia e na sociedade atual quem não aceita a educação como padrão comportamental é marginalizado – às vezes eliminado.

A educação ‘social’ tem o objetivo de inserir e adequar os comportamentos (sujeitos só podem ser definidos a partir de seus comportamentos) em um determinado tipo de sociedade (cultura). Assim, somos ‘sujeito’ professor se temos comportamento de professor; ‘sujeito’ médico se agir como tal; um sujeito até ontem normal, torna-se ‘sujeito’ psicopata a partir de um comportamento classificado como antissocial e doentio. São classificações e convenções em torno do sujeito a partir da educação, regras, normas e ordenações vigentes.

Alguém poderia perguntar: e o psicopata é fruto de uma educação? Se avaliarmos a partir da classificação médica, não. Embora educação e doença possam ser relacionadas, há doenças que não dependem de educação nem de comportamentos para se manifestar. Não sei se a psicopatia podem ser enquadrada em tal reflexão. Porém, se comprovadas a ausência de distúrbios doentios, pondero que sim – nem todo comportamento considerado psicopata é de fato doentio. O ser ‘humano’ tem como uma de suas faculdades/habilidades representar para o bem e para o mal. Nesse caso, penso eu, que o comportamento humano pode ser confundido com manifestação patológica. Nossos comportamentos podem ser falseados. Nossos comportamentos não indicam nossos desejos. Indicam desejos de outros...

Finalizando – não concluindo – minha incipiente reflexão pretende tecer ‘conexões’ pensadas e pensáveis sobre a relação da educação/comportamento com a violência.

Confesso que tenho dificuldades em separar atos de bondade e atos de violência de comportamentos. Ser bom ou ser mau, ser social ou ser antissocial são situações que somente são possíveis de definir a partir do comportamento. É o comportamento que indica a qualidade ou virtude social. Também me é complexo dissociar a relação entre a educação como geradora dos comportamentos. Os atos educativos não são neutros, mesmo que não resultem em mudanças nos comportamentos. Manter a posição diante de mudanças defendidas pela educação e ensino também é uma posição que se define por um comportamento.

Compreendo também que a educação em sentido amplo é complexa e pode gerar os mais extremos entendimentos e defesas sobre suas finalidades e resultados que alcança ou não.

Cada sujeito que teve acesso aos dois eventos da semana sobre a violência formula ideias, pontos de vista ou se expressa de acordo com sua especialidade. Não podia ser diferente. Cada um interpreta os fatos de acordo com a sua capacidade de refletir e pensar sobre. Assim, diferentes habilidades levam a diferentes resultados analíticos. Portanto, a minha posição pode ser diferente da sua, de outros, mas encontra ressonância em algumas. E... pode ser equivocada.

Grosso modo, as justificativas estão em dois extremos: Deus – ou a falta Deste – até a família ou sua ausência permeando valores, princípios, culturas, políticas. Todas estão ‘certas’ ou ‘erradas’.

Entre as ideias que circulam algumas são mais interessantes que outras. Algumas captadas: ‘a violência, nestes casos, tem gênero: é masculina’. Poucas situações são noticiadas em que mulheres cometem crimes contra grupos. Isso não significa que mulheres não tem relação com a violência. Menos que homens? Sim.

Entre as que defendem relação com educação, uma chama a atenção: ‘educação das emoções’. Pode-se ampliar esta perspectiva para a percepção de que as crianças, adolescentes e mesmo adultos não sabem mais lidar com as frustrações, dimensão onipresente na vida social vigente.

É fato que não se educa para o controle das emoções e sensibilidades. Talvez seja possível afirmar que uma educação adequada e produtiva para tornar o sujeito dono de suas emoções seja utopia. A educação emocional, mesmo necessária, não interessa muito aos que pensam os objetivos da educação. O sistema fomenta produtividade aliada com alienação. A emoção faz pensar e pensar pode dificultar a produção do sujeito. Por outro lado sabe-se que ter um bom controle sobre as emoções possibilita uma vida mais ‘feliz’ em todos os sentidos. Fatores que podem dificultar ou mesmo impedir o comportamento emocional podem ser elencados sem fim. Está claro também que quem não tem controle mínimo sobre suas emoções pode ser capaz de produzir comportamentos inadequados de qualquer espécie.

A Educação pode contribuir por meio da educação emocional para qualificar comportamentos e sujeitos sociais? Sim. Freud já dizia que a convivência social implica em dividir com outras pessoas as angústias pessoais. Ser sujeito implica em comunicação. Das emoções, dos problemas, das dificuldades... Os jovens atuais resolvem seus problemas emocionais ou nas redes sociais, nos jogos virtuais ou ainda trancados em seus quartos – os santuários que formam parte da personalidade juvenil na atualidade. Isso só pode gerar mais individualismo.

A educação emocional deveria formar para a resiliência, componente fundamental para enfrentar os desafios sociais. A frustração está em todas as esquinas da vida. Sem controle sobre a emoção ou mesmo o desequilíbrio da personalidade devido a uma inadequada afetividade familiar, estes tornam-se fatores ‘gatilhos’ para comportamentos violentos e agressivos. A educação, seja ela familiar, social, escolar ou outra tem papel fundamental na formação de um sujeito pleno. Ela é fundamental para crianças, adolescentes, mas é necessidade para toda vida.

Outro enunciado destacado relaciona-se a ‘terceirização da educação dos filhos’. Fato. Depois dos anos 1960, no Brasil, avança-se sobre a participação de todos os membros nos processos empregatícios, produtivos e sociais. O resultado é que as famílias se modificaram ou ‘desestruturam-se’ como desejam alguns. A sociedade muda e com as mudanças mudam maneiras de ser, pensar, viver e agir. A mudança no papel da família e na educação dos filhos gera problemas que reverberam nos processos escolares. O enunciado de que a ‘família educa e escola ensina’ remete a esta realidade. Entende-se que a escola só pode ensinar se a família educa. Isso está se tornando um conflito difícil de solucionar não âmbito escolar.

Analistas encontram no histórico dos sujeitos envolvidos na tragédia de Suzano razões para defender a tese problemática da educação terceirizada. Embora socialmente ‘nada justifica a violência’ deve-se pensar que para quem a comete há uma justificativa. Mesmo que não seja válida socialmente. Porém, em tempos em que a individualidade é mais ‘importante’ que a sociabilidade deve-se, também, refletir em que medida o indivíduo pensa a partir dele mesmo (seu individualismo promovido socialmente) antes de decidir sobre o que vai fazer para expressar sua raiva ou contentamento com situações e fatos sociais. A família tem um papel a desempenhar nesta realidade. Mas... que família?

Outro fator que me permite pensar/refletir é a associação dos motivos a Deus ou a sua ausência. Gosto de refletir sobre ‘deus’ de diferentes formas. Resumidamente penso na relação Deus e o medo de uma punição que pode ser desencadeada no futuro. Nos meus tempos de ‘menino’ o medo do castigo de Deus era tão grande que mentir sobre qualquer trivialidade cotidiana gerava uma angústia que só terminava na confissão mensal quando se contava ao padre a mentira. O medo não deixava fazer muitas coisas que a vontade juvenil desejava. Esse medo, claro, era ensinado pelos meus pais. Esse medo desapareceu entre crianças, adolescentes, jovens. Isso, para muitos é positivo. Fazer as coisas certas por causa do medo, dizem, é imposição. Fazê-las sem considerar o menor medo de consequências, seria o quê? Fazer por meio da consciência é tarefa difícil de análise quando se sabe que a consciência e a própria personalidade das pessoas está em formação a vida inteira. Se todos os atos humanos têm consequências, não ter medo destas pode influir o comportamento.

E o último fator que quero trazer para esta reflexão é a relação com as armas. Entre as diferentes opiniões encontram-se facilmente nas redes sociais duas situações extremas: ‘as armas não matam’ e os ‘discursos formam opiniões e comportamentos’. É notório que por si só, uma arma não mata. Isso é relativo, pois ela pode disparar ‘acidentalmente’. Por outro lado, nenhuma arma é fabricada sem outro objetivo que não seja o de matar. Nesse sentido, a simples presença de uma arma em qualquer espaço, subjetivamente indica que alguém pode usar a mesma para matar.

A formação de opinião é hoje uma análise complexa. Parece-me que as opiniões e especialmente sua formação estão diluídas em uma realidade muito confusa: as redes sociais. Desconfio que elas têm mais poder de formar opinião do que minha presença em sala de aula. Não é comum o aluno usar conteúdos de redes sociais, e apenas estas, para ‘enfrentar’ o desafio científico. Isso é perigoso, porém não invalidável em si. O perigo é quando nossas opiniões estão fundamentadas somente em redes sociais e sem os devidos discernimentos sobre os fundamentos acadêmicos, científicos e mesmo religiosos que regem e validam os conhecimentos. Percebe-se com um pouco de boa vontade para pesquisar que a violência com armas em locais públicos é maior nos contextos em que formadores de opinião, mídia e redes sociais e mesmo governos enfatizam a presença de armas como necessária. O contrário é também verdadeiro.

Em síntese...

Como humanos não nos é facultado, em absoluto, saber se qualquer ato nosso não serve de exemplo para outra pessoa. No sentido positivo e/ou negativo. Isso é educação. Fazer nada, também é fazer algo. Atuar, e educar, não significa necessariamente realizar movimentos externos. Pensar também é agir.

Para mim não existe ato humano ausente de educação...

Pronto. Pensei.

Mas... quem mandou matar Mariele?

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