Adote

Continuo pensando nas lagartixas. Por que será que andam a persegui-las? Esta noite nem dormi direito, pensando na extinção das lagartixas. Por que será que andam a persegui-las? No meu sonho mal dormido, vi uma delas e como acontece ultimamente, tive a impressão de que seria pela última vez, que elas andam se esvaindo, vitimadas por estílingues, vassouras, quatro rodas e até por armas de fogo.

As lagartixas estão sendo procuradas dia e noite, vivas ou mortas. Há alguns anos era fácil encontrá-las por aqui, em União e nos quintais de nossas casas. De lá para cá, a cidade cresceu, pavimentamos quintais, compramos carros... e as lagartixas foram sendo engolidas pelo progresso. Quando foi a última vez em que você viu uma? Lembra? Não se espante se não lembrar.

Por onde andam as lagartixas, que nas paredes há muito não estão? Por que andamos a persegui-las? Há motivos para isso? Por que tanto pânico? Afinal que mal podem nos causar uma lagartixa? Por acaso possuem veneno letal? mandíbulas afiadas? uma Taurus? A resposta é não. Então por que será que tantos humanos andam a perseguir esses seres amáveis e pacíficos? Por que andam matando lagartixas?

Eu vou na contramão: em vez de caçar lagartixas, adotei uma. Adotei uma lagartixa, e tem sido uma de minhas poucas felizes decisões que fiz ultimamente ante a azar na loteria e investimento em chimbras usadas. Lagartixas são seres que geralmente locomovem-se nas paredes, não ocupam muito espaço; não fazem barulho; são educadas e graciosas; não precisam de banho; comem pouco e geralmente insetos indesejados, como baratas, mosquitos, moscas; não precisam que as levemos para passear; não precisamos alimentá-las todos os dias, pois procuram seu próprio alimento; não é preciso construir banheiro para elas nem levá-las a veterinário, que geralmente são saudáveis. Criar uma lagartixa não dá trabalho e tem custo quase 0. Adote uma você também.

Sempre as admirei pela versatilidade e perspicácia, hoje ainda mais, que são versadas em diversos idiomas e assuntos; podemos entabular assuntos diversos com elas, que se mostram muito receptivas. Pode-se falar com elas sobre filosofia, literatura, crise no oriente médio, inflação, culinária sem contestações, que são seres assertivos e gentis. Por isso resolvi criar uma lagartixa, embora ela ainda não saiba disso, pois para ela eu disse que ela é quem me cria. E, assim, andamos: um auxiliando ao outro na busca pela preservação da espécie.

Damião Caetano da Silva
Enviado por Damião Caetano da Silva em 14/03/2019
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