Os desblocados
Luís Gazarinne Sayon, ou Gaza, como se tornou mais conhecido era uma personagem riquíssima, dono de rara picardia, flanava ali pelo centro velho da cidade de São Paulo.
Extremamente tímido, amava carnaval, porém, como tende acontecer aos tímidos, jamais externava este amor, exceto quando tomava uns goles a mais; bebericava uma Serra Malte e aí falava um pouquinho dessa consolidada paixão. Ansiava por sair num bloco, citava trechos de sambas e marchas, cantarolava até, mas, douto que era, contentava-se em ver o carnaval passar. Sambava internamente, dizia-se membro do bloco dos desblocados!
Sua vida era defender os incautos, os ofendidos, os desmiolados e brincava dizendo ser o defensor dos “frascos e comprimidos”, daqueles que sabiam ter tão poucas chances que, após tomar todas pra ganhar coragem – tranquilizantes, calmantes, garrafadas de catimbozeiros variadas – o procuravam solertes, queriam o impossível que ele nem sempre prometia, mas por vezes ousava dar.
Fino, intelectual raro, oferecia o melhor de si, entregava-se à causa, à luta. Tinha além do carnaval, outra paixão, a pescaria. Paixão esquisita para um pensador do seu porte, carnaval, vá lá, mas pescaria!
Saia nas manhãs e ia ao mar, ao rio, ao pesqueiro jamais. E foi assim, sem nunca ninguém saber ao certo, que um belo dia desapareceu num turbilhão. Quereria saber o que de tão trágico lhe aconteceu, mas talvez tenha sido melhor assim. Esteja quem sabe onde o rio encontra o mar e as estrelas cadentes sambam num paradoxo de flutuar.