Até mais ver, Sumpalo!
Foi uma crônica para a minha amiga escritora Rosi Luna, dublê de jornalista e atriz que nem me lembro mais de quando, mas que ainda está dentro do prazo de validade, haja vista que querem tirar o papa Francisco pelos mesmos motivos que forçaram a saída de Bento XVI. E a seca continua.
Até mais ver, Sumpalo!
Amiga Rosicreide, você é minha e o boi não lambe. Aliás, a seca aqui está tão de morte que boi entrou para a lista de animais em extinção. Até o bumba-meu-boi andou morrendo de sede, só não me pergunte como, porque isso é coisa de política safada. Somente o senador continua com seus bois gordos e vistosos, por obra e graça do Divino Espírito Congresso Nacional.
Cá nas praieiras do Nordeste sinto saudades de nossos rastros desfeitos pelas brumas marinhas nas caminhadas matinais. Sei que você anda muito atribulada com seus afazeres profissionais, e que estava de viagem marcada ao Vaticano, em visita de cortesia ao papa Bento XVI. Saiu no jornal daqui. E deu na televisão. Agora entendo o porquê do Papa ter renunciado bruscamente e ter se escondido não-sei-onde. Ele sabia que não iria resistir à tentação. Mas, com tantos escândalos abalando as sacristias, um a mais ou um a menos não faria diferença. Pelo menos lavava a honra da Igreja com esse negócio de pedofilia e viadagem. Perdeu a oportunidade de entrar para a história como um papa macho, disse um vizinho meu, ateu de marca maior, quando lhe relatei o provável motivo de sua renúncia.
Estive assuntando uma visita a você, e cheguei até a selar a jeguinha, mas a mulher implicou: “Vai de avião, mané!” e eu disse: “Num vou!” Quem nasceu para voar foi passarinho, aí ela me convenceu que a comida de avião era muito gostosa, tinha uma bolacha cream-cracker maravilhosa, mas isso aí era se eu fosse pela Tam. “Pela Gol”, disse-me, “só se for de primeira classe. Passagem promocional só tem direito a copo de água de torneira”, concluiu. E quando eu estava de malas prontas e fazia planos de voo, um repórter disse na televisão que em São Paulo a polícia estava matando mais gente do que a volante dos tempos de Lampião, e que os bandidos estavam matando mais gente do que os cangaceiros do bando de Lampião, e outro repórter gritou admirado: “Duzentos por dia!” e apareceu o tal do secretário de segurança despreocupado e falante: “E isso é motivo de espanto?! Estatisticamente está dentro da normalidade.” E aí fiquei por cá matutando debaixo da sombra do coqueiro: se aqui morre um ou outro e as manchetes dizem que é o estado mais violento do mundo, por que duzentos está dentro da normalidade?
Como baiano burro nasce morto, sentei-me à beira da praia e um tubarão simpático e sorridente, vendo o meu dilema do ir e não-ir, chamou para dois dedos de prosa dentro do mar. Olhei para ele e gritei: “Vou não!” e corri para casa e fui pesquisar na internet. Estatisticamente falando, não há registro de nenhum baiano engolido por tubarão e eu não seria o primeiro. Depois eu me lembrei de que na praia aqui em frente não tem tubarão, então procurei um macumbeiro e ele desvendou o mistério sem cobrar um centavo pela consulta: “Esse tubarão é presságio para você não viajar”. E me deu uns passes mediúnicos à base de óleo de tubarão e pediu para que eu deixasse as passagens aéreas com ele, pois necessitavam de uns trabalhos de descarrego.
Assim, enquanto perdurar essa violência estatisticamente dentro da normalidade, continuo aqui com a minha jeguinha amarrado no mourão da tranquilidade praiana, soltando baforadas do meu cachimbo virtual esperando que você faça o inverso da arribação nordestina. Aqui as pessoas pacatas só morrem de morte natural ou por overdose de cocaína. E, como disse acima, você é minha e o boi não lambe. Nem mesmo o boi do senador.