Viva sua excelência, a Picanha!
No episódio que ficou conhecido como “Milagre dos Andes”, um avião da Força Aérea Uruguaia , com 45 pessoas a bordo, levava o time de rugby uruguaio para uma partida amistosa contra um time do Chile, em Santiago. Em meio à viagem, um acidente faz com que o avião caia em plena neve. Devido ao péssimo tempo, após inúmeras tentativas, as equipes de salvamento desistem de procurar por sobreviventes. Após semanas sem comida, os sobreviventes da queda do avião passam a viver um dilema: ou se alimentam de carne humana dos que já faleceram, ou também irão morrer.
Dois dos sobreviventes, munidos de apenas água, cápsulas de carne humana e sem equipamentos especiais, aventuram-se na imensidão do Andes com o intuito de procurar ajuda, deixando o restante do grupo na fuselagem do avião. Pasmem, esses homens corajosos e destemidos cumpriram uma jornada épica de 100 km, escalaram grandes montes durante um período de aproximadamente 10 dias, tudo isto debaixo de um frio avassalador, até que conseguiram, milagrosamente, estabelecer um contacto com um montanhista. Água e carne mantiveram a vida dos sobreviventes por um bom período de tempo, mais precisamente, 72 dias em um ambiente considerado um dos mais inóspitos do planeta.
Eu não vou entrar no mérito do tabu, ou seja, a prática do canibalismo. Eu vou me referir a "carne humana", simplesmente como "carne". Como isto é possível? Com relação a água, todo mundo sabe da sua importância para a manutenção da vida. Não existe vida sem água. Não existe água sem vida. A sua ausência em pouco tempo provoca a desidratação, comprometendo uma série de funções do organismo, e se o reabastecimento de fluídos não ocorrer no prazo de 4 a 7 dias, a pessoa pode morrer. Muito bem! O que tem a carne de tão especial?
Antes de respondermos a esta pergunta, vamos entrar no túnel do tempo e viajar para um tempo em que os nossos antepassados se comunicavam com gestos. Um tempo em que os dias eram muito frios. Um tempo em que a natureza não perdoava os menos capacitados, os menos habilidosos. Um tempo em que a comida era a mais natural possível. Um tempo em que as ferramentas eram de pedra, madeira ou osso. Um tempo em que as paredes das cavernas eram pichadas com cenas do cotidiano. Enfim, um tempo em que os seres eram fortes e destemidos.
Imaginem a cena: Gritos, gemidos, sons onomatopéicos, bando de hominídeos correndo em disparada, confusão generalizada, perseguição, feras alucinadas encurraladas, paus, lanças, pedras, tudo o que estivesse ao alcance das mãos, ansiedade, medo, sangue, muito sangue, morte anunciada e êxtase.Todo esse esforço monumental para atender há uma necessidade essencial: "comer carne".
Se nossos ancestrais não tivessem um dia preferido o bife à alface, você não estaria lendo este texto agora. Foi o aumento no consumo de gordura e proteína animal, ocorrido há 2 milhões de anos, que possibilitou o crescimento do nosso cérebro poderoso até chegar ao tamanho atual, segundo Rui Murriela, professor de antropologia biológica da Universidade de São Paulo. Que me perdoem os vegetarianos de plantão, mas não existe um substituto à altura para esse "manjar dos deuses". Viva sua excelência, a Picanha!