CÚPULA DO ANTIABUSO
 
            O Papa Francisco convocou os presidentes das Conferências Episcopais da Igreja Católica do mundo inteiro para a realização de uma cúpula com tema específico a ser tratado: a ação pecaminosa e criminosa da pedofilia na Igreja. Encontrando-se a Igreja sob constantes acusações de atos de pedofilia praticadas por clérigos, o Papa quer adotar medidas urgentes e concretas para combater essa prática considerada crime, tanto pelo direito canônico quanto pelos ordenamentos jurídicos dos estados nacionais.
               Os primeiros escândalos surgiram há 35 anos e desde lá a hierarquia da Igreja vem pedindo desculpas, adotando medidas preventivas, aprovando leis, anunciando condenações, sem, contudo, extinguir com o que é denominado de “cultura de acobertamento”, isto é, o silêncio e a proteção aos autores e à Instituição. O documento “Crimen Sollicitationes” de 1962 dá instruções aos bispos de como lidar com alegações de abusos sexuais de menores contra padres.
               Em comunicado da imprensa vaticana referente ao caso do arcebispo americano Theodore Edgar McCarrick, a Santa Sé manifestou que “seja os abusos, seja seu acobertamento, não podem mais ser tolerados e um tratamento diferenciado para os bispos que os cometeram ou os acobertaram representa, de fato, uma forma de clericalismo não mais aceitável”. E em 2018 escreveu o Papa em sua Carta ao Povo de Deus: “Com vergonha e arrependimento, como comunidade eclesial, assumimos que não soubemos estar onde deveríamos estar, que não agimos a tempo para reconhecer a dimensão e a gravidade do dano que estava sendo causado em tantas vidas. Nós negligenciamos e abandonamos os pequenos”.
            Esta é a primeira vez que o Papa reúne os líderes religiosos para debaterem o crime que tem abalado a credibilidade da Igreja. Na abertura do encontro histórico foram lidas as seguintes palavras de uma vítima de abuso sexual: “Nem os meus pais, nem os oficiais da Igreja ouviram o meu clamor e me pergunto: Por que Deus também não me ouviu?”. Sensibilizado pelo apelo disse o Papa aos bispos: “Eu os convoquei para que juntos escutemos o grito das crianças que pedem justiça”.
            A Carta Apostólica do Papa Francisco com o título “Como uma mãe amorosa”, de 2016, já determina a perda de ofício por parte dos bispos e outros responsáveis devido a negligência com os casos de abusos sexuais cometidos sobre menores e adultos vulneráveis previstos na Carta Apostólica “Sacramentorum sanctitatis tutela”, de São João Paulo II. Pesa, portanto, a responsabilidade pastoral e eclesial dos bispos que poderão responder por negligência.
            Na Arquidiocese da Paraíba, onde há casos de pedofilia denunciados, o arcebispo Dom Manoel Delson Pereira baixou o Decreto n° 003/2019 proibindo aos clérigos a companhia de menores e de adultos vulneráveis, desacompanhados de seus pais ou responsáveis na casa paroquial, no carro da paróquia e em outros ambientes reservados. Porém, isto só não resolve o problema. As medidas devem ser mais ágeis e aprofundadas.
            As consequências desses abusos sexuais são mais extensas, pois elas ultrapassam os limites da esfera de relacionamento dos autores e das vítimas. Elas alcançam a própria comunidade católica, posto que abalam os alicerces da crença dos fiéis. Como crer numa Igreja em que seus sacerdotes são lobos vestidos de ovelhas? Como guardar as palavras de um celebrante que se conduz contrariamente ao que prega? Como dar valor a Eucaristia quando se é recebida por mãos impuras?
            Diferentemente de grupos ativistas que queriam a adoção de uma política de tolerância zero ou de desligamento automático do sacerdócio para os padres pedófilos e bispos protetores destes, o Papa concluiu a cúpula declarando que dará combate à pedofilia na Igreja com a máxima seriedade e que a Igreja colaborará com o Poder Judiciário de todos os países “sem acobertar ou subestimar”.
          Ponto muito positivo foi a admissão dos critérios da Organização Mundial da Saúde como norma da Igreja, o que significa que o princípio do “segredo pontifício” será eliminado, encerrando assim a cultura de acobertamento na Igreja. O pacote de medidas INSPIRE, com suas sete estratégias para erradicar a violência contra menores norteará as ações das Conferências Episcopais. Com isto, o Papa direciona a Igreja para novos tempos, para um caminho de verdade, justiça e reparação.
            A Igreja se confessando culpada de abusos e ocultação foi a única instituição que teve a coragem de admitir seu erro. Porém, se não for capaz de cumprir os propósitos que anuncia não terá jamais recuperada a sua credibilidade, nem moral alguma para propagar a mensagem do Evangelho.
Ailton Elisiario
Enviado por Ailton Elisiario em 25/02/2019
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