Falando da minha orfandade
Meus pais já morreram. Portanto, sou órfão de pai e mãe. Palavra pesada, difícil de falar, difícil de ouvir. Apesar de ter enterrado ambos, eles não deixaram de ser meus pais e eu filho deles. Tiveram sua trajetória física, o corpo e a mente pararam de cumprir suas tarefas e deixaram de viver. O nosso vínculo mudou de roteiro, mas a nossa liga continua existindo, viva e forte. O tempo vai apagando certas lembranças, mas com outras, curiosamente, acontece justamente o contrário. Cada um lida com o falecimento de pessoas queridas a seu modo. Tem gente que incorpora o luto anos a fio, não conseguindo se desprender daqueles que foram pra outro plano e sofrem demais com isso. Outros cumprem os ritos que sua religião estabelece nessa situação e tocam o barco. No meu caso foi diferente. A perda do meu pai, Gerd Silbiger Z"L foi repentina (sou judeu e estas duas letras correspondem à abreviatura em hebraico "de abençoada memória") e isso causou impacto tremendo há 17 anos. Já a minha mãe, Rosalina Silbiger Z"L, estava com vários problemas e faleceu na UTI em 2/1/19. Foi algo mais esperado, deu tempo pra despedir. E até pedir pra ela mentalmente, na véspera da morte, que se quisesse partir, que partisse. Mas que fosse sem sofrimento, em paz, tranquila. Perder os pais faz parte do curso normal da vida, a não ser que a gente morra antes. Apesar de ter o rótulo "oficial" de órfão e não negá-lo, me sinto em outra categoria. Eles continuam a ser meus pais, só que agora estão em outro departamento. Pra ficar com eles, o tempo que quiser, basta mentalizá-los e ambos virão na hora - exatamente como está acontecendo agora. Sinto o papai e mamãe ao meu lado agora, de verdade, sinto sua presença, sua alma, seu carinho. Se quiser vê-los, farão parte do meu próximo sonho e de todos os sonhos que forem necessários. É desse jeito que quero viver minha orfandade. Assim meus dois queridos ao invés de terem partido, estarão vindo pra ficar. E ficarão mais próximos de mim como nunca os tive antes.