“Quando Nietzsche Chorou”
Rir é o melhor remédio. Mas a vida parece um coco daqueles bem grandes e difíceis de apanhar. Imagine aquele que fica aquém de nossas mãos e além das nossas possibilidades. Isto parece conversa fiada e provavelmente seja. Em verdade a vida é como uma ferida que muitas vezes não sara e ainda dá casca.
Provavelmente eu seja um cascadura, um ser de outras planícies, um ponto de interrogação que fica na cachola de muitas pessoas que andam por aí. Ou quem sabe um ponto de exclamação? Este é o meu preferido, ando enlevado com tudo. Meu encantamento é meio maluco, não merece muitos cuidados. Minha perplexidade aumentou quando li em um ponto de ônibus: “Quando Nietzsche Chorou”. Confesso de pés juntos e bunda virada para Meca, que ainda não li o livro de Irvin Yalom. Se Nietzsche chorou onde é que eu estava que não ouvi? Esta pergunta tem abalado meus alicerces que não são lá essas maravilhas. Muito provavelmente eu também teria chorado, hoje em dia chorar é uma dádiva.
Fico imaginando o que teria feito Nietzsche chorar. Não sei se você sabe; ele foi um bom pianista, certamente previu o boom da música sertaneja. Este pode ser um dos motivos que o levaram a cair em prantos. Somos criadores e criaturas. Estas prerrogativas me permitem afirmar que sou um deus e um vassalo ao mesmo tempo. Mas isto não é o bastante para que eu sinta pena dele, até porque se estivesse por aqui neste exato momento, iria ensiná-lo a cantar uma bela canção que diz, entre outras coisas: “doente de amor procurei remédio na vida noturna”.
Não sei o que se passava na cabeça de Nietzsche quando escreveu O Anticristo, mas uma coisa é fato: ele sentia o esvaziamento da alma humana através da inutilidade das pessoas, da dificuldade em se manterem como gente. Todas essas maluquices me fazem lembrar do maluco Cazuza quando cantou: “ideologia eu quero uma para viver”. Isto é muito engraçado! Chega a me fazer cócegas, quando na verdade deveria chorar. Cada um de nós está a procura de uma ideologia ou um deus que seja exclusivamente nosso.
O que mudou de Nietzsche a Cazuza? Para mim nada, a não ser a água de coco que agora é vendida em caixinhas de papelão. Continuamos os mesmos: recebemos as mesmas notícias, comungamos nas mesmas igrejas, pagamos os mesmos dízimos. E a vida continua. E vamos que vamos...