Lua Vermelha II
Era prisioneira de um pedaço de céu nublado, havia um mar dentro de si, a fusão de sua inconstância com minha tempestade a trancafiou em muros altos, com portas de aço. Jurou não retornar, pois jugou-se vítima dos meus feitos. O veneno de sua taça se espalhou por nosso recinto, quebrada, empoeirada, com a marca dos seus dedos, as mesmas que ficaram no meu avesso. Ela levou a minha lua vermelha, ser dançante, ainda lembro do seu sorriso em um amanhecer, seu ego inviolável dominava meus instintos com seus olhos de oceano. Ser testemunha de suas confissões sombrias era quase um privilégio, gravei suas palavras jamais repetidas, mergulhei no fundo onde jamais ninguém ousou chegar, aquela aventura mortal feriu minha alma, rosas espinhosas em meus lençóis, preço por ser hóspede em seu coração negro, que flutua no espaço em busca de servos sem voz. Traí minha liberdade para ser sua sombra fiel, dias cinzas contrastado por suas cores, em seus dias artísticos, atuava com veracidade para manter seu palco intacto, redenção pelos meus pecados desconhecidos, pelo meu amor gratuito e escravidão. Cada migalha era uma peça de quebra cabeça da suíte encantada onde habitávamos, deusa do meu altar. Já faz um tempo que as luzes se apagaram, e com ela se foi todo o universo que conheci, voei sem direção em busca dos pedaços que compunha quem um dia fui, seu rosto tornou-se um fantasma que só existiu em minha mente criativa, sua memória desonrosa trouxe um luto sem mérito, visita indesejada nas noites por quatro estações, repudiada e amada em silêncio, e a cura é meia gota de antídoto em um tempo quase eterno.