NILO MORAIS PINHEIRO (MORTO EM COMBATE HÁ 79 ANOS) 7 fevereiro de 1945.

Memorial escrito por: Wilde Aquino

Exatamente no dia 7 de fevereiro de 2024, fazem 79 anos da morte deste herói esquecido, que serviu nos campos de batalha da 2ª grande guerra mundial. Leia na crônica de Wilde Aquino e consulte na internet sobre os Pracinhas da FEB – Força Expedicionária Brasileira.

Nilo Morais Pinheiro

Era a noite do último dia do ano de 1941.

Por sorte da gente da terra, a chuva havia cessado de cair, depois de tantos dias de chuvarada inclemente.

Nas ruelas da cidade, viam-se poças de água lamacenta, onde, apesar do embaçamento, refletiam-se, acanhadamente, os brilhos de um tímido clarão de lua em fins de quarto - crescente.

O céu estava claro. Parecia que os céus decidiram enfeitar aquela passagem de ano, para augurar melhores dias ao povo de Conselheiro Pena.

Era apenas uma quarta-feira. Porém, com o fato de que o dia seguinte seria o feriado universal de 1º de janeiro, ninguém se importava em procurar o aconchego dos lares, preferindo, doutra forma, esperar pela chegada das primeiras horas do ano de 1942.

O bar do Guedinho era o ponto onde a sociedade se concentrava mais maciçamente em animadas conversações, em grupos que se separavam, à ordem dos assuntos abordados nas rodas de conversas amigas.

Guedinho e os empregados de casa se desdobravam no atendimento, enquanto confortavelmente sentada numa cadeira do lado de dentro do balcão, D. Bibi observava a animação sadia dos presentes.

O motor que acionava a máquina de sorvetes e picolés emitia seu ruído cadenciado, que o alarido dos fregueses não chegava a abafar totalmente.

No interior do bar, viam-se, numa das mesas, cujas estruturas era de ferro e tampões em pedra de mármore branco, as moças Dilma Jório, Silima Barreiros e Olímpia Serrão. Em outra, estavam, Heloísa Freitas, Ilda Raminho e Jacira Pereira do Vale. À frente de cada uma das moças, uma brilhante taça em aço inoxidável, transbordante de um sorvete colorido. A mistura das cores do sorvete presumia tratar-se de sabor côco, banhado em pequenas cascatas de groselha, pois, misturavam-se as cores branca do côco e leite, com o vermelho do xarope. Ladeando as taças, para cada uma delas um copo de límpida água gelada.

As mocinhas bem vestidas e de cabelos caprichosamente penteados, e perfumados, conversavam animadamente possivelmente abordando os assuntos que envolviam os rapazes da cidade.

Próximo a uma das portas de entrada do bar, ocupavam lugares, tomando cerveja Teotônia, Henrique Raggi, Tuta, Neguinho Quitita, Gê e Domingos Carlomagno. Ali, falavam-se dos assuntos do momento, e, ao fundo, em ponto mais discreto, Zé Floro, Lalato Gregório e Zé Dentista, falavam também dos temas diversos que a época oferecia: guerra, futebol, festas de fim de ano, as belas moças da terra. Miguel Raggi acabava de chegar e se juntava aos amigos.

Em outra mesa, localizada aos fundos, estavam reunidos, em conversa aparentemente, mais séria, Luiz Raggi, Orlando Vítor, Najem, Augusto Machado e Lilito Jório. Sobre a mesa do grupo, três garrafas de cerveja Teotônia, de cascos verdes, duas delas já vazias.

À frente de Luiz Raggi, uma carteira de cigarros Odalísca e perto de Lilito Jório, um maço de Selma, marca mais sofisticada. Um Grande cinzeiro metálico compunha os objetos sobre a mesa. Luiz Raggi fumavam tranquilamente.

Nesta última mesa, girava o tema “Segunda Grande Guerra”. Dizia o Lilito:

- “Os alemães, desta vez, abusaram. Torpedearam mais um de nossos navios”.

- “E, olha, que só bombardearam, até agora, navios mercantes. O Brasil não está nesse conflito. É um absurdo!” – comentou Luiz Raggi.

-“ O Getúlio vai acabar perdendo a paciência. Vamos ter que participar dessa guerra louca, que o “Bigode de Mosca” inventou.” – disse Orlando Vítor, referindo-se, por último, à Hitler.

- Augusto Machado e Najem ouviam sem comentar. Sorviam calmamente seus goles da Teotônia gelada. Augusto Machado, após esvaziar o copo, escolheu o cigarro Selma de Lilito Jório, acendeu o seu, após usar o seu inseparável isqueiro Vospic, de metal amarelo.

De fato, naqueles tempos, o Brasil vinha sendo alvo de ataques aos nossos navios mercantes, já se contando seis, o número de barcos atacados e afundados em águas neutras, embarcações que ostentavam bandeiras brasileiras, portanto, fora do conflito que se alastrava pelos quatro cantos do mundo.

No interior do bar, iluminado pela vacilante luz produzida pela usina de Aziz Baruqui, o movimento era intenso.

Afinal, era a noite de ano novo.

Num vai e vem agitado, entravam e saiam pessoas, dentre elas era visto o Otávio Vela, o Zé Chagas, o Waltair Barreiros, o Wilton Castro, Nelson Josué, Tote Gregório, Algumas crianças, às vezes acompanhadas, movimentavam-se em bandos alegres e barulhentos.

Fazendo o “footing” das imediações, cuja área ia do Bar do Guedinho à frente do Cinema de Argemiro Teixeira, moças e rapazes passeavam em bandos distintos, notando-se que os grupos de amigos e amigas se separavam.

No Bar do Alidelmo – cidadão que vivia dias de susto e apreensão, com a participação dos italianos no conflito mundial -, a movimentação era grande, porque, situado ao lado do cinema, além da cerveja e a cachaça, servia também café, leite, doces e quitandas variadas, o que fazia convergir, para seu interior, adultos de todas as classes sociais e menores. E era ali servidos pelo Otávio Carlesso, que estavam reunidos, naquela noite de ano novo, Jair Mamede, Antero Nogueira, Luiz Plácido, Nilo de Paula, Silvino Borges e Tietre de Paula, num animado bate-papo sobre o jogão do dia 4 de janeiro, entre o Ipiranga e Getúlio.

Andando de um lado para o outro, pela área iluminada, viam-se: Sazita, Arlinda e Filinha; Geralda Vasconcelos, Nenem e Tunguinha, Um grupo de rapazes, composto de Hamilton de Castro, Marcelinho e Chaquib andavam calmamente, iam risonhos, estridentemente risonhos, sinal de que o caso contado era divertido.

Na esquina, frente à venda do Zé Nogueira, um outro grupo conversava; era, este último, composto de Geraldo Muniz, Leontino Máximo, Antônio Laudelino - o famoso Garrancho, Fagundes e Murilo. Ali o assunto era também o jogo de domingo, 4 de janeiro.

Lá no interior do bar do Chico Bernardes, onde os fregueses eram servidos pelo proprietário e seu filho Américo, à volta de duas pequenas mesas juntadas, ocupando cadeiras e bancos, estavam o Ivo Lúcio, Antônio Muniz, com violão, Julinho (cavaquinho); Geraldo Lúcio (banjo); Benedito Lino (pandeiro); Reims cantava e Tinim batucava numa caixa de fósforo. Tocava seu trombone mágico, o Chico Aleixo; Nenem Ribeiro soprava clarineta da qual tirava sons divinais. Era o gupo de boêmios da cidade, alguns também alistados no exército, mas que não se deixavam ligar ao problema da guerra.

No Cine Teatro Aparecida, estava anunciando para aquela noite, o faroeste “Rei do Gatilho” estrelado pelo Tom Mix.

Na bilheteria do cinema, Argemiro Teixeira, ostentando vaidoso o seu bigode negro, vendia os ingressos. E, entravam já, para a sala de projeção, os que assistiriam a fita, pois pela segunda vez, a sirene do cinema havia sido acionado.

D. Nazinha, despachava, pelo corredor, entre a residência da família Teixeira e o cinema, os moleques vendedores de pipocas no interior da sala, com suas caixas cobertas por papeis coloridos. Vender pipocas e balas dentro do cinema, era a forma prática dos moleques não pagarem seus ingressos.

Voltando ao Bar do Guedinho, onde se encontravam Luiz Raggi e os amigos já citados, vamos encontrá-los falando da terrível guerra que fazia tremer a humanidade.

Os exércitos de Hitler devastavam os pequenos países da Europa. Já contava, o louco ditado alemão, com as forças militares do Japão e da Itália, formando um avassalador rolo de destruição que incendiava o mundo.

Nos ataques, os navios brasileiros, reconhecidamente barcos da marinha mercante, de tripulações numerosas, eram mandados para o fundo dos mares em torpedeamentos covardes; as emissoras de rádio nacionais, em notas repetidas e angustiantes, dava conta da grande preocupação que invadia as salas do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro; onde, em conversações que varavam as madrugadas, o Presidente Vargas se fazia cercar de seus Ministros, com especialidade Eurico Gaspar Dutra, Ministro da Guerra; Luiz Raggi, Najem, Orlando Vitor, Lilito Jório e Augusto Machado, perdiam-se em considerações, concordando, todos eles, com a hipótese inevitável da participação do Exercito Brasileiro no conflito que já pesava sobre os países aliados, a América do Norte, país mais amigo e irmão, que aliado à Grã Bretanha de Winston Churchil e à França de Gaulle, defendia a humanidade dos sonhos enlouquecidos do Fuherer.

Argemiro Teixeira, logo após encerrar as vendas de ingressos em seu cinema, dirigiu-se à residência do advogado Lívio de Freitas Silva, onde já se encontravam, à beira de um rádio, entre doses de wisky servidas pela esposa do anfitrião, D. Eunice, o João Ventura Pinto, Manoel Maria, Nhonhô Carlos, Cesário de Barros, o prefeito Dr. Sebastião Anastácio de Paula, Manoel Calhau, Gustavo Pereira do Vale, Jacinto Lopes e o dono da Casa Dr. Lívio.

O grupo acompanhava as notícias que vinham em boletins de minuto a minuto, dando conta da destruição que assolava, principalmente, os países europeus.

Ali na sala da casa do advogado Lívio de Freitas, longe do burburinho alegre da juventude que se espalhava pelas poucas ruas iluminadas da cidade, os líderes da comunidade mostravam o temor de que o Brasil viesse a se meter no conflito. Considerava-se, então, a sequencia, de afundamentos de navios brasileiros, supostamente atacados pela temida esquadra de submarinos alemães, espalhados pelos mares do mundo.

Na residência de José Carlomanho, na Rua de Baixo, próximo à estação da E.F.V.M., estavam também reunidos, falando sobre a guerra e bebendo wisky, o dono da casa, Carlomanho, Jó Raminho, Domingos Abelha, Pedro Jorge, os irmãos Leandro, Walter e Ataulpho Barreiros, Edmundo Bittencourt, Honório de Castro e Clarismundo Morais.

Lá na cozinha da residência, D. Marieta atendia às senhoras, D. Maria Francisca, esposa de Clarismundo, D. Maria Bichara, D. Bireca, enquanto crianças da vizinhança circulavam correndo pela casa.

A cidade, como todo Brasil, estava tensa, apreensiva. O Brasil vivia então, sob o signo da expectativa, embora o medo não chegasse à classe jovem que irremediavelmente se incorporaria às forças aliadas, possivelmente nas montanhas da Itália de Benito Mussolini. Os jovens estavam tranquilos, despreocupados. Quem andava mal, naqueles dias, eram os comerciantes Alidelmo Campagnaro e Arnaldo Hoffman, descendentes de italianos e alemães.

A noite de Ano Novo foi comemorada festivamente. O ano de 1941 entrava para a história. Já, agora, vivia-se o ano de 1942, com as famílias de Conselheiro Pena dando sequencia à sua vida normal, pacata, vivendo seus problemas, mas, sentindo sobre suas cabeças, as ameaças da guerra que prometia arrastar os brasileiros para os campos de batalha.

Nossos brios continuavam a ser fustigados pela audácia daqueles misteriosos ataques aos navios mercantes. Já não havia tranquilidade nas partidas de nossas embarcações pelos mares do mundo, ainda, que esse “mundo” se limitassem às águas do Oceano Atlântico.

Confirmando as notas assustadoras das emissoras de rádio, os jornais da Capital Federal davam a relação dos navios brasileiros atacados.

A juventude brasileira, os portadores de Certificados de Alistamento Militar, se agitavam na expectativa de partir em defesa da Pátria.

Dentre os jovens alistados militarmente em Conselheiro Pena, um havia que alardeava sua vontade de partir em direção ao já famoso 11º Regimento de Infantaria. Era o Jovem Nilo Morais Pinheiro, membro de importante família da sociedade local.

Nas conversas que mantinha nos locais públicos da cidade, Nilo dizia-se sedento em enfrentar os “covardes alemães”, os “traidores italianos”, os “loucos japoneses”, estes últimos, tidos como fanáticos, que acreditavam ressuscitar instantes após a morte, fanatismo que os tornava, não homens corajosos, mas, temerários suicidas no confronto com a própria morte.

Nilo, comentava sempre, na “venda” do Aristóteles Gregório, o Tote, que iria mesmo participar da guerra, ainda que, como voluntário. Se ofereceria, se fosse necessário. Provaria que não era uma fantasia sua, mas seu verdadeiro desejo, combater pelo Brasil.

Nilo era um rapaz de pequena estatura, filho de classe média-alta da sociedade de Conselheiro Pena; para muitos, não passava de um inconsequente, um autêntico gabola.

Baixinho, rosto sardento, saudável, usando sempre um chapéu de lebre preto; no bolso da calça, um brilhante relógio, preso a uma corrente de ouro, que ligava, a extremidade, a uma carteira de notas; uma caneta-tinteiro num dos bolsos da camisa, e, num dos dedos da mão esquerda, um anel com uma vistosa água-marinha ou outro com um vermelho rubilito. Nilo era a típica figura do fanfarão. Dentro de si, entretanto, carregava a certeza de que seria capaz de acabar com um punhado de inimigos alemães, japoneses ou italianos.

Exibicionista que sempre foi, Nilo não convencia a rapaziada da época, que o considerava, com sua postura de dândi, uma ameaça constante aos seus namoros e às suas namoradas. Outros jovens estavam alistados no exército e na inimência de serem chamados a integrar as tropas da Força Expedicionária Brasileira, caso o Brasil se decidisse participar do grupo de países aliados; dentre tais jovens, o Nozinho, o Jair Mamede, Gerson Lima, Geraldo Muniz, Leontino, Antônio Laudelino e muitos outros. Nenhum deles, entretanto, se mostrava empolgado com a possibilidade de embarcar num dos navios que possivelmente conduziriam nossos “heróis”.

- “Esse Nilo é um bom “faroleiro!. Isso é o que ele é!” – disse certa vez Chaquib.

Tal foi a onda de bravatas que Nilo espalhou pela cidade, em conversas de bares, esquinas, campo de futebol, pescarias, nas rodas de conversas com moças, que seus planos, até então tidos como fanfarronices pelos demais rapazes, acabaram por chega ao conhecimento do velho Clarismundo, seu pai.

E, foi no almoço de domingo, dia 4 de janeiro, data marcada para o grande jogo de futebol entre as equipes de Getúlio Vargas Esporte Clube e o Ipiranga, que a família do dentista Clarismundo Morais Pinheiro se encontrou unida.

Na sala de refeições da casa da Rua Benedito Valadares (hoje o nº 1.160), encontravam-se à mesa, o velho Clarismundo, D. Maria Francisca Braga, sua esposa, e os filhos do casal, Nelson, Nilton, Nilo, Narciso, Nazira, Noeme e Nora.

No ar, podia-se sentir a gravidade do momento. Havia uma expectativa dos irmãos e da própria D. Maria, às palavras do patriarca.

- Então, senhor Nilo, o senhor anda dizendo por ai que se oferecerá para servir, caso o Brasil participe da guerra, hein! (começou o velho Clarismundo). Saiba, valentão de merda, que com esse tamanho nanico que você tem, jamais serviria, sequer, para bucha de canhão. Uma guerra é coisa muito mais séria do que o senhor imagina. Deixa de ser idiota, rapaz! Pare com esses comentários bestas que o senhor anda espalhando pelos botecos da cidade. Vá trabalhar mais e vadiar menos. Cuide de suas compras de pedras, torne-se um homem primeiro. A cidade inteira já zomba de suas bobagens. Às vezes, me sinto até humilhado na frente das pessoas, quando me dizem que o Nilo Morais Pinheiro, o filho do Clarismundo, é o primeiro voluntário do Brasil. Que herói! Que beleza de herói! Pare com isso, rapaz! – arrematou o velho, irritado.

- O Brasil, caso entre nessa guerra, papai, precisará de todo mundo; o senhor sabe disso. Não serei o primeiro a me esconder como um covarde. E, quanto à minha estatura, saiba o senhor que nenhum país do mundo abre mão de nenhum soldado. Irei sim, meu pai. Caso o Brasil seja obrigado a participar. – foi a maneira como Nilo respondeu ao velho Clarismundo.

mediatamente como um gesto de estranha rebeldia, Nilo levantou-se da mesa.

- Perdi o apetite. Até logo.

Irritado, Nilo desceu a ladeira da Rua Benedito Valadares e seguiu em direção à sede do Ipiranga, time pelo qual torcia.

No centro da cidade, o alvoroço dos torcedores agitava os bares, as esquinas, os açougues, os botequins dos cantos de rua.

O pessoal que residia na Rua de Baixo, já se movimentava em direção ao campo de futebol, onde as duas melhores equipes da cidade se defrontariam dentro de poucas horas.

Nilo de espírito machucado pelas palavras do pai, seguia nos seus passos, pensando consigo: “vou provar ao velho Clarismundo que meu tamanho não impedirá que eu ajude o Brasil. Ele vai ver! Na primeira oportunidade, digo adeus á Santa e vou embora.” – Quanto á Santa, Nilo se referia à sua noiva, Santa Barateza.

Nosso herói passou pela sede de Getúlio Vargas Esporte Clube, em cujas imediações o técnico Zé Raggi se movimentava agitadamente, às voltas com seus jogadores. Os torcedores do time de Zé Raggi estavam risonhos. Confiavam na vitória do time, naquela tarde.

Nilo seguia em frente. Estava agitado, nervoso. Precisava juntar-se aos seus amigos, torcedores do Ipiranga.

Na sede de seu clube, a movimentação era também grande de torcedores, jogadores, moças integrantes da torcida feminina e muita criança.

Observou Nilo.

Naquela tarde, quem dirigiria o time seria o Luiz Raggi, o popular “Carijó”, que, na falta do titular, assumia sempre o lugar de goleiro.

E Carijó, era, na verdade, um bom gol-keeper. Com sua categoria de jogador e treinador, já escalara o time para aquela tarde. O Ipiranga formaria com sua força máxima. O melhor do Ipiranga entraria em campo. O objetivo era arrasar o time do Getúlio.

Nilo incorporou-se à sua torcida. Em poucos minutos havia esquecido o incidente com o velho Clarismundo.

À tarde, quando os dois times, fortes adversários, entraram em campo, formavam com os seguintes jogadores:

IPIRANGA ESPORTE CLUBE

Nelson Mazzoni;

Augusto Foratini e Lilito Jório;

Brito, Zimper e Zé Pretinho;

Quarenta, Afonso Jório, Alcindor, Zé Teodósio e Orlando Vitor.

No time de Getúlio Vargas Esporte Clube, Zé Raggi mandou a campo os seguintes craques:

TININ;

Geraldo Muniz e Joaquim Muniz;

Fagundes, Murilo e Antônio Garrancho;

Tião, Jair Mamede, Nilo de Paula, Ciro e Antônio Muniz.

As margens do campo apinhavam-se de torcedores. Alguns exaltados, provocavam discussões. Outros, muitos deles, formavam escores da partida, às vezes em exagero:

- O Ipiranga ganha hoje de 4 a 0!

O Getúlio vai dar de goleada: 5 a 1 pra nós!

E os ânimos se exaltavam. Naquele ambiente de agitação, Nilo deixou-se perder em emoções, torcendo calorosamente pelo seu Ipiranga.

Azar do Nilo.

Em que pese o belo gol marcado pelo Orlando Vaz, numa arrancada pela esquerda, ao final, o time do Zé Raggi ganhou a partida, com um gol marcado pelo Ciro, de cabeça, numa bola cruzada de corner, e outro, feito numa cobrança de pênalty pelo Murilo, penalidade marcada pelo Carijó, que acabou sendo o juiz da partida.

Nilo, naquele dia 4 de janeiro de 1942, estava sem sorte.

As noticias da Grande Guerra continuavam a chegar pelos rádios e pelos jornais. Os navios brasileiros atacados, já chegavam a 31, com o número de tripulantes mortos chegando aos 970 e o Governo de Getúlio Vargas já não suportava a movimentação popular que cobrava uma reação do Brasil às agressões sofridas.

Ante a essa onda clamorosa de pressões do povo brasileiro, Getúlio chamou ao seu gabinete o Ministro da Guerra, General Eurico Gaspar Dutra e decidiram, de comum acordo, assinar a Declaração de Guerra à Alemanha. Tal declaração, se deu a 18 de agosto de 1942, numa histórica terça-feira.

Era a vez de nossos jovens alistados entrarem no “corredor das expectativas”, pois que, segundo as normas adotadas pelo Governo brasileiro, as convocações se dariam por sorteio, para que não houvessem reclamações de parte alguma, de qualquer camada da sociedade brasileira. Sorteado o jovem teria que seguir para os campos de batalha.

Nilo Morais Pinheiro, dentre os jovens de Conselheiro Pena que serviam o Exército Brasileiro, não foi sorteado. Sentiu-se frustrado. Seu desejo de enfrentar os “covardes inimigos” ardia em seu peito de suposto fanfarão.

Surgiu, contudo, uma oportunidade para Nilo. Se se oferecesse como voluntário, seria imediatamente aceito pela FEB. Assim o fez Nilo.

Embarcando num dos navios que levavam os escalões de pracinhas, Nilo viu-se incorporado às forças que agiram na Itália. O comando de seu grupo enviou-o à região ocupada pelos alemães. Era o noroeste da Itália, onde estavam concentradas frentes de combate nos Montes Belvedere, Gorgolesco, Corona, Quercíola, Carson di Poldo e Montilocco.

Os tempos passaram, com os soldados brasileiros enfrentando situações dramáticas nas frentes de combate.

Era já o ano de 1944. Nilo Morais Pinheiro era agora 3º Sargento. Dono de uma coragem indômita, característica que viria confirmar os seus comentários de rapaz nas ruas de Conselheiro Pena, quando fora tido como um fanfarão, Nilo tornou-se um campeão de patrulhas. E, foi nessa condição de bravo estrategista, que, no dia 29 de dezembro de 1944, comandando uma patrulha de sete homens, que saiu em reconhecimento, qual, tendo conseguido aproximar-se oitenta metros da posição inimiga, avistou uma seteira que denunciava a existência de uma casamata. Resolveu atacar essa casamata e manobrou com perícia sua patrulha, conseguindo aproximar-se, sem ser pressentido, atacando-a pela retaguarda, aprisionando um sub-oficial, dois cabos e um soldado das tropas alemãs. Por esse feito, o Sargento Nilo Morais Pinheiro recebeu de seu comandante as Medalhas de Campanha e Cruz de Combate.

O Comandante da Força Expedicionária Brasileira, General Euclides Zenóbio da Costa, tinha, na pessoa de Nilo, um dos mais valentes e inteligentes soldados sob o seu comando. Era naqueles dias sangrentos, um dos mais requisitados para as mais perigosas missões do grupo a que pertencia, estando sempre disposto ao cumprimento de ordens de seu comandante, para avanços sob infernais bombardeios de morteiros, através de campos minados e na chuva incessante e inclemente dos projéteis da artilharia inimiga.

Nilo Morais Pinheiro, indiscutivelmente, nasceu para ser um dos grandes heróis da Força Expedicionária Brasileira. Foi uma das peças mais importantes contidas na história de nossos bravos soldados nos campos de batalha na península italiana, onde deixou gravado com tinta de seu sangue, o nome de Conselheiro Pena, a terra brasileira que o adotou, vindo da vizinha cidade de Ipanema.

No livro do destino, estava escrito: Nilo Morais Pinheiro não retornaria ao Brasil e a Conselheiro Pena para dizer, pessoalmente, que não fora fanfarão.

Dos registros pessoais do Sargento Nilo, consta a citação de seu comandante: “...Em 3 de fevereiro de 1945. Desde o anoitecer daquele dia, que o inimigo bombardeava periodicamente e tenazmente as posições da 7ª Companhia do 11º Regimento de Infantaria, na frente de combate, em particular, a região de Montilocco. Progredindo em silêncio, aproveitando o castanhal e os fossos, às 22 horas, os alemães surgiam, nas proximidades de um Posto de Combate. A 200 metros do P.C., que tentavam envolver. Apenas decorreram 5 minutos e já o Sargento Nilo partia, sob pesado bombardeio, para colocar nos postos os homens de seu grupo, de modo a fazer face a uma possível investida adversária, nesse ponto de sua responsabilidade. Em meio caminho foi gravemente atingido por estilhaços de granada, vindo a falecer dias depois.”

Nilo Morais Pinheiro, o bravo soldado conselheiro-penense, que aguardava a sua promoção a 2º Tenente, morreu vítima dos graves ferimentos sofridos na frente de batalha em Montilocco, num dos leitos do Hospital da cidadezinha de Valdibura, ao noroeste da Itália.

Era o dia 7 de fevereiro de 1945.

Texto de autoria de: Wilde Aquino

Oferecido a André Almeida em 17.03.98

Na Câmara Municipal de Conselheiro Pena

Quando da viagem ao Cuieté Velho para

Continuidade dos levantamentos históricos do Cuieté Velho.

Aniversário de morte do Nilo:74 anos (em 07 de fevereiro de 1945)

Wilde Aquino
Enviado por André Almeida em 07/02/2019
Reeditado em 29/01/2024
Código do texto: T6569383
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