Já disposto a permanecer uns dias em Pirapora, acabei descobrindo que tudo o que eu precisava estava ao longo da Avenida Brasil, uma espécie de point onde apreciava o desfile das meninas, morenas de longas tranças e cabelos cacheados, desfilando suas magrezas e sensualidades ao cair da tarde. Foi então que pensei em Vinicius de Moraes e anotei no meu diário de viagem:

“Mais do que poeta, mais do que compositor, ele tinha certa sabedoria prática. Capaz de olhar com fervorosa concupiscência para todas as mulheres, de todas as idades, de todas as raças, de todas as belezas, nas quais se inspirava, distraído, praticando a sua sedução maior: agradá-las. Ele sabia que o som mais erótico para o ouvido das mulheres é o elogio, é dizê-las belas e únicas, pois às mulheres não basta ser deslumbrantes, é preciso também não ter rivais. Ele sabia dizê-lo de modo quase despretensioso e, premeditada e fingidamente assexuado, estabelecia uma relação de igualdade que soava, a elas, como um fino galanteio. E, mais, fazia-o sem demonstrar perversão: a conquista era mais entrega do que dominação. Ele era capaz de falar um poema com a plena convicção de que os poemas não são, jamais, coisa fora de moda[1]. Pois Vinicius teria adorado viver em Pirapora. Será que ele não o fez? Será que nunca lhe disseram que Pirapora era a sua cara?” 
 
[1] Os tempos mudaram, evidentemente. Em sua época, parece que as mulheres ainda se deleitavam com suas palavras de cânticos misteriosos e de elogios sensuais.