Uma Crônica Sobre Bloqueio Criativo
Funciona mais ou menos assim...
Uma ideia revolucionária vem à sua mente. Com ela você se sente capaz de mudar o destino da humanidade com um conhecimento inédito, algo que transcende o convencional, capaz de deslumbrar até mesmo a mais cética e tediosa das almas. Tudo parece bem, até o momento em que você se senta frente ao notebook encara a página em branco e digita poucas palavras e... Apaga tudo porque aquilo consegue traduzir a ideia, mas não a empolgação, a emoção que ela causa. Tem uma xícara de café que já está pela metade e parece te desafiar em silêncio "você não vai conseguir escrever antes que eu chegue ao fim". Você a esvazia porque está frustrado e ansioso, mas não importa: há uma garrafa térmica cheia de café e uma longa madrugada pela frente. Você agradece a Deus por ser praticamente impossível ter uma overdose de café.
Quando estamos dando nossos primeiros passos na escrita, esse fato não é tão incomodo. Temos expectativas e não tanta "responsabilidade". Escrever sobre qualquer coisa acaba sendo a tarefa mais importante e empolgante do mundo e tudo indica um futuro promissor na literatura. Entretanto, você amadurece. Começa então a ter que levar uma vida dupla de Clark Kent que precisa trabalhar e cumprir suas responsabilidades de ser humano e de ser o Superman e usar seus dons Kryptonianos para proteger a terra. Enquanto escritores, somos criaturas fantásticas, capaz de criar mundos e destruí-los com um estalar de dedos (entendedores, entenderão), mas somos humanos e precisamos trabalhar para comprar livros e pagar a internet para manter nossos blogs no ar. E não, não temos o mesmo vigor do Superman.
Como se não fosse o suficiente ter que escrever exausto, voltamos a questão do bloqueio. Não importa quais palavras possam vir a mente, nem a ordem em que elas possam ser organizadas: tudo vai sempre parecer melhor em seu pensamento do que no papel. Isso gera frustração. Como é que eu tenho uma ideia incrível, mas não consigo expressá-la? É como descobrir um planeta feito de ouro no sistema solar e não conseguir trazer um pouco pra terra ou então como ter os números certos da loteria sem ter feito a aposta. Faltam recursos e energia. Acredite quando eu digo que seu cérebro está se esforçando ao máximo. É preciso respeitar os limites então normalmente damos um tempo.
Vão-se horas, dias, meses... A luta continua, mas os inimigos estão mais fortes. É fácil se distrair com videos aleatórios no Youtube, algum projeto paralelo ou qualquer outra coisa que seu cérebro usa como desculpa para não escrever. Mas a desculpa não te livra da culpa de não conseguir aproveitar uma boa ideia. Procurar dicas para superar o tal bloqueio é natural, mas mesmo elas não parecem tão eficazes. Por fim, você se rende. Escreve algo ruim e é obrigado a lidar com isso. O único alívio então é imprimir as folhas (isso quando se consegue ir além de três laudas) e visualizar ela virando cinzas. O cheiro do papel queimado faz com que você se questione porque não começou a fumar, mas a tosse causada pela fumaça depois logo te lembra da verdadeira razão. O pior de tudo, é que até pra pegar fogo o material é ruim. Contudo, já passou, você está livre da pressão, mas ainda sente o bloqueio.
Sem perspectivas, sem esperanças, você se senta frente ao notebook, seu único companheiro na solitária tarefa de escritor. Toma um gole da xícara de café enquanto sua mente entra no ritmo do tic-tac do relógio em plena madrugada. Uma ideia despretensiosa começa a brotar na sua mente como a nascente de um rio. As palavras vão fluindo na página como um pequeno córrego, aumentam seu fluxo como um rio de parágrafos e segue em progressão aritmética. Onde irá desaguar não importa, é para lá que estamos indo...