Momento de Prece

De olhos fechados, em frente ao altar que já me é conhecido, buscava as palavras para iniciar a prece, que tanto ensaiara. É verdade que, ao longo do ano, quando os compromissos são enormes e a ansiedade enche o coração, abdicava do hábito, construído desde a infância, e já não guardava meus domingos à Igreja. Nas férias, entretanto, quando a alma já se recuperava e conhecia um pouco de calma, buscava os caminhos que ascenderiam a fé que, há tanto, guardava em mim. Respirava fundo compassando meus pensamentos enquanto fazia o sinal da cruz, à espera do segundo que me distanciaria de tudo a minha volta. Cabeça baixa, olhos fechados, respiração calma: eu me teletransportara e as tantas angústias agora habitavam um espaço deserto, distante dali.

Pensei em pedir a Deus um conselho, um afago, um abraço ou, até mesmo, um pouco de paz. Minha mente, entretanto, guiava-me e, de repente, lembrei-me de minha avó Zita e da saudade que contagiara o Natal. Senti-me grata por nutrir um sentimento tão doce e pedi a Deus que lhe entregasse um pouco da minha saudade transfigurada, quem sabe, num beijo ou num abraço, com todo o meu amor. Por um segundo, a dor de não tê-la por perto era, apenas, gratidão e imaginei-a ao Seu lado, com seu perfume lulu, sem nenhum cigarro. Lembrei-me da ansiedade que me tomara, há poucas semanas, e, antes que eu pudesse clamar pela cura da minha insônia, recordei-me que minha mãe havia cuidado de mim, durante todo o tempo. Vi seu rosto, tão jovem, povoar meu coração e a vi bem, mais leve, mais feliz. A minha prece era, somente, gratidão.

De repente, meus olhos enchiam-se de lágrimas e eu percebia que, pela primeira vez, não precisaria pedir nada. Pediria, talvez, para que nada mudasse mas sabia que alegria daquele instante era grande demais para se fazer eterna. Lembrei que estava ali, diante do altar que tanto me era querido, a milhas de distância de minha casa, apenas com meus pais: minha família, tão sonhada.

O mundo batia à minha porta e ouvi meu pai me chamando pelos corredores da Igreja. Alguém me procurava. Lembrei das tantas vezes que meu pai cuidara de mim, das suas constantes preocupações, de como ele me amava e disse a Deus saber que, bem ali, estava o meu anjo da guarda. E, com ele, eu não temeria nada.

Abria os olhos e, lentamente, avistava as pessoas ao meu lado, imersas em suas preces. Avistei um casal de idosos que, de mãos dadas, conversavam com Deus. Terminaria minha prece sem nenhum pedido até que me vi desejando estar ali, naquela igreja, ao lado de meu namorado, a essa altura, já idoso. Desejei que ele encontrasse seu caminho e pedi a Deus que o entregasse um pouco mais de fé. Quis contar-lhe de todas as minhas preces, de todos os meus pedidos, pois, naquele dia, eles haviam sido atendidos. Quis contar-lhe que ele, além de meu namorado, era, também, um presente de Deus e pedi aos céus que o protegessem.

Meu pai estava atrás de mim e, sorrindo, comentou que, de longe, me via rezar. “Rezar”, pensei. Uma palavra tão pequena e, nela, cabe a minha fé, cabe a fé de milhões de pessoas. Cabe a busca, o caminho, o anseio, a travessia, silenciosa, cabe, quem sabe, a paz que tanto buscamos.