Algozes?
Amanhã vou bater ponto no semáforo.
Meu crachá ninguém quer ver.
Meus patrões passam de um lado para
o outro a todo instante, mas sequer me dão
bom dia, sabe-se lá porque.
Na maioria das vezes sou pago para afastar-me
deles, como se eu fosse uma epidemia dizimadora.
Meus pés estão rachados e encardidos, trabalho e
moro a céu aberto, água em garrafa "pet" e migalhas
de pão traduzem meu ticket refeição, sem férias, sem
folgas, sem descanço, sem nada.
Sou as costas da humanidade, os pés do nômade em
pleno deserto, sou o escuro da solidão e voz da rouquidão.
A verdade, nesse caso, é uma só, sou o seu lado mais sujo,
pobre e podre, a única diferença é que faço parte de estatísticas
ditas sociais, mas nem adianta se lavar, já faço parte de
sua alma. Sou o momento silencioso do seu pensar, tão improdutivo
quanto. Sou o seu olhar atravessado e o parêntese que
interrompe seu texto, assim como na vida existem pessoas metidas
a juízes, eu sou o próprio "narciso", meu nome é esquecimento de
sobrenome social, mas costumam-me chamar de "negrinho".
E você, prefere me chamar como?