A HORA DO "ÂNGELUS" !
A HORA DO "ÂNGELUS" !
"A Arte não é um espelho para
refletir o Mundo, mas um martelo
para forjá-lo".
VLADIMIR MAIAKÓVSKI
Provavelmente ninguém com menos de 50 anos de idade imagina o que possa ser "a hora do Ângelus". Eu não estaria exagerando se afirmasse que se trata do "Hino Nacional" da Santa Madre Igreja ! Num tempo em que todo mundo era católico -- encontrar 1 evangélico (chamados de "crentes") era raro -- a chegada das 18 horas era o momento para uma prece geral, em todos os cantos e regiões da nação. Parava-se o que se estava fazendo, homens tiravam o chapéu, item masculino indispensável e, quase perfilados, contritos, ensimesmados, cada um rezava a seu modo a Ave Maria", o sinos de cada igreja ou capela "cumprindo a partitura", ou melhor, anunciando o instante solene. Essa conversa com Deus encerrava o dia definitivamente, no interior pelo menos e nos dava a todos estranha melancolia. Nada mais restava a fazer... até a manhã seguinte !
Todo escritor que se propõe lançar seu livro enfrenta essa "hora do Ângelus", esse indefinível "frio na barriga" que cantores e artistas confessam ter. Se aproximando o dia e HORA da tarde ou noite de autógrafos ou, mesmo sem ela -- dispendiosa e de pouca venda -- já na data acertada para pegar na Gráfica a encomenda contratada começam os temores (e tremores), o peso da responsabilidade de repassar sua obra se apresenta em toda a magnitude. E se o livro não saiu a contento, como fôra programado ou, pior, se nem sequer saiu das máquinas impressoras ? Já li sobre casos em que o lançamento foi adiado porque a Gráfica atrasou o serviço !
Belém traz um histórico de vários "desastres" parecidos... e por Gráficas diferentes e de renome, para não se concluir que se tratou de uma tipografia de subúrbio, cujos tipos de metal ("caixetas") e movida a pedal ou coisa semelhante. Acompanhei de perto 2 casos interessantes, quase da mesma época (1989/91), além do sofrimento do poeta e blogueiro RUI "Baiano" SANTANA em fev./2008, não por problemas na gráfica, mas por falhas no pagamento de alguns poetas de sua coletânea "A POESIA CONTEMPORÂNEA DE ANANINDEUA - A Poesia Urbana na Amazônia". Rui foi um herói... bancou sozinho as parcelas que faltaram, mas a tiragem foi bem reduzida e o lançamento se deu num bar da periferia do bairro Cidade Nova, com 2 ou 3 autores.
Entretanto, como "recordar é (re)viver", relembro aqui os "causos" de uma amiga e de um conhecido, ambos "vítimas" da mesma Gráfica, caríssima e com um baita nome na praça, prédio enorme e catálogo maior ainda. O baiano do interior foi funcionário por muitos anos de uma petroleira nos confins do Pará e, tempos depois, reuniu suas memórias em calhamaços manuscritos, salvo engano. À Editora coube ajustar e revisar tudo aquilo. Com a empresa patrocinando a obra, êle a citava a cada 3 ou 4 frases. "Limparam" do texto aquilo tudo e foram além: mexeram até no título das memórias do azarado autor, que mandaram editar 1000 livros, eu acho. De caatingueiro, como queria, virou "catingueiro" que -- para êle -- ligava a obra ao mau cheiro, fedor. Estive no lançamento, de noite, num ancoradouro de barcos mal iluminado, outra idéia infeliz.
Ainda jovem embora perto dos 50 anos, não aguentou o baque: findou na cama de um hospital no dia seguinte, por motivos que prefiro calar. Dizem que a diretoria da Gráfica apressou-se em visitá-lo, "para tirar a bronca"... êle se mudou da cidade pouco depois. Nunca mais ouvi falar do sujeito !
Minha amiga mineira estreou também com memórias uns 2 anos depois do citado acima, já ciente do acontecido. Insistiu na mesma Gráfica... tentei convencê-la a editar só 300 exemplares, "livro NÃO VENDE no Brasil", argumentei. Não me ouviu ! Me apresentei pra fazer as ilustrações da cidade natal dela, de graça, a partir de "xeroxs trabalhadas" das fotos. Recebi outro não ! Preferiu pagar uns 30 reais (era a época do Cruzado, 1990) por "rabiscos" a meu ver horrorosos. Por fim, a tal Gráfica só entregou a metade da tiragem contratada. Ela nunca fez o lançamento, desconheço se vendeu algum exemplar, contudo se via embaixo da cama do casal volumes fechados do seu sonhado livro. Fim da história !
Se aproxima a minha "hora do Ângelus" e conhecer tais fatos não me ajuda em nada. Cada escritor parece ter que passar por tal inevitável "calvário"... não quero ter que me vestir de JABUTI -- com todo o respeito ao Autor, que admiro -- para vender meus livros, embora esteja bem ciente que vou penar para divulgar meus escritos em livrarias, shoppings, escolas, etc. Como se diz em Paris..."ALLONS-Y" !
"NATO" AZEVEDO (em 9/jan. 2019)
OBS: farei 300 exemplares porque sai "mais barato" (?!) cada livro e porque acho que meus 3, 5 ou 8 sobrinhos -- se não surgirem mais até lá -- ajudarão o tio genial a revender sua obra de estréia.