Circos da Minha Vida
Ai que saudades que eu tenho
Da minha infância Querida
Que os tempos não trazem mais.
Crescemos, evoluímos, e Tudo ficou para trás.
Parece que ainda estou vendo os vultos
de vocês, queridos Palhaços. Pois sei
que tudo está acontecendo agora.
Mas a realidade, nunca neguei.
Quando vocês partiram, também minha infância foi embora.
Como começar uma crônica que tanto tem povoado a minha mente? Parece que foi ontem que eu, um garoto de 7 anos, esperava a banda do senhor Joaquim, ali na viradinha da Rua Pereira Lima. Essa banda todas as noites tocava algumas músicas, antes de entrar no circo que estava montado num terreno plano, há uns 100 metros dali. Ai, os 10 músicos da banda entregavam as partituras a algum garoto para que este pudesse entrar de graça para assistir ao espetáculo.
E olhem que a concorrência era muito grande. Porém, eu tinha o privilégio do maestro, Sr. Joaquim, ser colega do meu pai, nas oficinas da Cia Mogiana de Estradas de Ferro. Então, eu não perdia um espetáculo, pois eu entrava sempre carregando as partituras do Sr. Joaquim. Ai foi uma imensidão de circos. Alguns só de espetáculos variados. Outros com a parte dramática, também, como ponto forte. Porém todos tinham palhaços e muito bons. Dos que eu me lembro bem e dos quais tenho saudades, o primeiro foi o Juriti, que fazia dupla com o Nicolau. Isto foi em 1940, no Circo Teatro Rosário.
Depois, no Circo do Nhô Sebastião, do circo do mesmo nome, tinha uma dupla humorística. O Firmino e o Espantado. Os dois vinham pintados, mas sabiam fazer rir a todos. Foram tantos circos que eu faria injustiça de não me lembrar de algum. Mas uma dupla que me marcou muito foi o Zico e o Rabanete, no Circo e Teatro Di Lauro, muito bom Circo, com dependências seguras e muitos artistas. Mas eu gostava era dos mágicos.
Que pode ter algum truque no trabalho deles, mas eu vi coisas de perto que não tinham explicação. Foi no Circo Romano e o Mágico encantava a todos. Certa vez, mister Ricardo, o mágico, ia fazer uma mágica, mas alguém da plateia precisaria emprestar um relógio, mas precisava ser dos bons, senão a mágica não daria certo. Mas mister Ricardo garantia que em caso de qualquer dano com o relógio, o circo ficava responsável. Ai um senhor que estava próximo de mim, tirou da cinta o seu relógio de bolso e deu-o ao mágico. E acrescentou: “Este relógio está na minha família há 80 anos, veja lá o que o senhor vai fazer”.
O mágico mostrou o relógio para todo o publico e subiu ao palco. Pegando um pilão, pegou o relógio e o colocou dentro, quebrou dois ovos e começou a socar o pilão, e mostrava ao publico. Víamos pedaços de vidro e do maquinário do relógio. Cobriu com um pano preto e foi fazer outras mágicas. Quando terminou o seu ato fez menção de agradecer ao público, sem mencionar nada sobre o relógio. Ai o homem que havia emprestado o relógio ficou desesperado e chamou o mágico. Ai o mágico se desculpou e disse:
“É verdade, eu havia me esquecido do seu relógio. Vamos lá ver o pilão”. E lá só estavam os ovos inteiros, não os que haviam sido quebrados. Ai o cidadão dono do relógio não sabia o que fazer, com toda a plateia do circo olhando para ele. Então o mágico, lá mesmo do palco, disse: “acidentes sempre acontecem, mas da próxima vez eu irei acertar”. E completou: ”Eu já estou passando do meu tempo de apresentação. Por favor, quem tem hora certa?”. E todos, instintivamente levaram as mãos em seus bolsos para responder, até o homem que emprestara o relógio. E para sua surpresa, seu relógio estava no seu bolso, bem preso à cinta. O que aconteceu que todos os que estavam no circo viram o homem dar o relógio ao mágico?
O correto é que o relógio nunca saiu do bolso do assistente, mas como todo o publico que estava ali viu-0 entregar o objeto ao mágico, fica muito difícil aceitar um truque desses.
De outra feita, isto aconteceu no antigo Teatro Municipal de Campinas, atrás da catedral Metropolitana de Nossa Senhora da Conceição, eu tinha 16 anos e um senhor que era freguês do bar e café onde eu trabalhei, na Rua 13 de Maio me viu olhando o cartaz da noite, do teatro, e me disse: “Laércio, entre!”
Ai eu notei que era o senhor Camargo, porteiro do teatro. Agradeci à sua bondade. A entrada era um pouco cara para o meu bolso. A atração era o Dr. Cecarelli, um famoso artista italiano, que tinha um programa fabuloso, que trabalhava com a ajuda do público e devia ser ilusionista.
O Dr. Cecarelli chamou um senhor da plateia e lhe disse: “O senhor é músico? Sabe tocar algum instrumento?”. O cidadão disse que não. Então o Dr. Cecarelli pediu um violino à orquestra que acompanhava o espetáculo e deu-o ao senhor, e disse: “Toque uma valsa de Strauss”. E o homem tocou Vozes da Primavera, e O Danúbio azul, muito bem, e foi aplaudido de pé pelo público.
Depois do sucesso com o violinista, o senhor devolveu o violino à orquestra, mas deu demonstração de não ter conhecimento do que acabara de tocar.
Então, o Dr. Cecarelli chamou outro senhor, de cerca de uns 40 anos, e lhe perguntou sua profissão. O homem respondeu: “Sou motorista de uma ambulância em São Paulo”. Então, o Dr. Cecarelli lhe disse; “Muito bem”. E apanhando várias coisas de pintura (pincéis, tintas e um sobretudo para não se sujar com as tintas) lhe disse; ‘Pinte uma Mona Liza!”.
Então o homem começou a pintar, como se fosse um famoso pintor. Via-se que tinha jeito para pegar nos pincéis e nas tintas, como os profissionais dessa arte. Em 10 minutos o homem terminou a obra. Enquanto o Dr. Cecarelli distraia o público com outras coisas. Ai ele chamou uma senhora e também perguntou sua profissão. Ela disse; “Sou enfermeira num hospital daqui”. E ele perguntou: “a senhora conhece alguma coisa de poesia?”. Ao que ela respondeu: “Não. não conheço nada de poesia, tampouco poetas. Não fazem nada do que eu gosto e não tenho tempo para isso”.
Então, o Dr. Cecarelli estalou os dedos e mandou que ela escrevesse uns 10 versos. O que a senhora fez com muita perfeição.
Terminado o espetáculo, o Dr. Cecarelli mostrou o que os três haviam feito. Eles não acreditavam que tivessem feito tudo aquilo.
E nós, da plateia, ficamos mais admirados, ainda, do que eles.