Já estamos acostumados!
Já estamos acostumados!
Já ir se acostumando faz parte do nosso povo! As costas largas e lanhadas pelo chicote da escravidão mostram a resistência e a força para continuar seguindo, recebendo mais açoites, porém, seguindo e apanhando mais, contudo, seguindo.
Já ir se acostumando é da nossa pele. Sobreviver com o mínimo para suprir as mínimas necessidades. Faltando o básico e sobrando esperança.
Já estamos acostumados com o dedo em riste, com uma saúde à base de receituário do mesmo. Com uma educação que rascunha os objetivos. E com empregos com carteira provisória.
Já ir se acostumando é para brasileiro. Canta no carnaval e comemora no dia de Finados.
Estamos adaptados ao pouco ornado de muito. Familiarizados com racismo e com todo tipo de preconceito. Somos fortes e vamos continuar nos acostumando com o que virá, veio e está.
Estamos habituados com heróis de ontem que se repetem hoje e vão continuar proliferando. Tudo para suprir nossas faltas; tudo para mostrar e provar que ontem é sempre hoje.
Já ir se acostumando faz parte da nossa história. Misoginia é palavra que tem como sinônimo o silêncio e a covardia. Preguiça é adjetivo para população proscrita. Expurgar é a mesma coisa que higienização social.
Já ir se acostumando, meus caros, é para brasileiro. É para aqueles que constroem a nação com o suor e recebem a pecha de dolentes e indolentes. Acostumados estamos todos.
Estamos sempre habituados a esperar. Esperar o sol brilhar para todos; esperar uma justiça justa; esperar o afago da Pátria; esperar o trem da vida passar; esperar, esperar, esperar, esperar.
Já ir se acostumando é gerúndio que vai mostrar que o texto não para; que a esperança não cansa de esperar; que o sonho não fique sempre acostumado em ser simplesmente sonho.
Já ir se acostumando é para aqueles que pagam o que nunca deveram; para alguns que dão o que nunca tiveram; é para brasileiro.
Já ir se acostumando... já estamos acostumados... já nos acostumamos.
Mário Paternostro