CENAS COTIDIANAS - PAIS E FILHOS 2 (coletânea de mini cronicas)
A MENINA DO CELULAR
No estacionamento do prédio, 7 da manhã me deparo com a cena de um pai conduzindo a filha até a frente do prédio para esperar a van que levará ela pra creche.
O pai caminha de um lado da rua, a menina do outro. Entre eles passam os carros. Ele leva uma mochila no ombro. Ela um celular na mão e não tira os olhos do aparelho. Esta praticamente cega para o mundo e mal sabe andar. ELA NÃO DEVE TER NEM DOIS ANOS.
Passo com meu carro a 1km/h. A qualquer momento ela pode atravessar na frente do carro. Repito, está praticamente cega com o celular nos olhos. O pai, nem liga. Abandono afetivo e negligência. Talvez ele ainda vá trabalhar e nem veja mais a filha nesse dia.
Se questionado (não o fiz) ele certamente diria que está dando o que a filha quer (o celular), mas penso que nem tudo que quero convém. Uma criança de 3 anos (até menos, acho) não tem como saber o que é melhor pra ela. Além do risco do uso do celular para um cérebro em desenvolvimento e ignorar todos os estímulos do mundo.
LAMENTÁVEL. Não tive como não julgar. Entre ser pai e ser reprodutor há uma grande diferença.
(publicado originalmente no Facebook em 07/11/ 2015)
CRISE ECONÓMICA
Quando no ónibus um menino de uns 4 anos aponta pra mãe o shopping e diz "tá calo" (está caro) começo a me preocupar com a crise económica.
*Vi isso ontem. O coitado deve ter ouvido algum adulto falando isso e pensa que "tá caro" é o nome do shopping.
(Publicado originalmente no Facebook em 10/04/2016)
OBSERVANDO AS MENINAS
Ônibus parado no terminal. Segue-se uma conversa entre motorista e cobrador. O motorista repara em um grupo de meninas com shortinho e comenta:
MOTORISTA: Olha rapaz que beleza! E o povo ainda reclama do calor. Precisava de uma dessa lá em casa.
COBRADOR: Com uma dessa eu ficava na cama o dia inteiro.
MOTORISTA: Na cama eu fico com minha mulher. Precisava dessa pra lavar, passar e cozinhar. Rapaz a mulher reclama a minha menina não ajuda em nada na casa. O menino ainda lava uma louça, passa uma vassoura, mas a menina só fica no whatssap o dia inteiro.
* Enfim esse desfecho inusitado continua sendo machismo, mas já indica alguma mudança no conceito por parte de alguns homens. Ao menos não objetificou a moça sexualmente.
(Publicado originalmente no Facebook em 16/09/2017)
UMA PERGUNTA INOCENTE
Loja de roupas. Estavam pai e mãe escolhendo blusas masculinas numa arara e em um minuto que "largaram" a filha a menina aprontou. Estava as minhas costas e ouvi ela chamando a mãe por duas vezes, mas sem receber atenção resolveu gritar a inocente pergunta:
MENINA: _Mãe o que é fode-se?
Eu instintivamente me virei. Olhei pra menina. Olhei pra mãe. Ela olhou pra mim constrangida. Eu fiz a melhor "cara de pantufa" que consegui no momento.
MÃE: - Deixa isso aí!
MENINA: (Lendo a etiqueta) Fode-se levar a máquina.
MÃE: ´_É pode-se. Quer dizer que pode lavar. Vem cá!
Eu disfarcei, sai de perto e pensei: Será que sou só eu que vejo essas coisas!?
(Publicado originalmente no Facebook em 24/06/2017)
OS DUENDES*
* Essa foi uma aula de entendimento da psicologia infantil.
Entrei no corredor do supermercado em busca de uma bolacha especifica e logo reparei que um menino ameaçava uma birra. A mulher meio impaciente. O menino, de talvez uns 4 anos, insistia em tirar da prateleira um pacote de bolacha recheada (convenhamos que um pacote colorido e cheio de desenhos parece muito mais interessante pra uma criança).
MAE: Não, filho! Deixa o pacote ai _disse a mulher tirando o pacote das mãos do menino e devolvendo-o para a prateleira. _A mamãe já pegou aquela que você toma com o leitinho.
O menino com jeito de bravinho já ameaçava o berreiro. (Criança chata! – eu pensava)
MÃE: Ali ó! Você quer ajudar a mamãe a empurrar o carrinho igual o pai faz?
O menino foi na prateleira de baixo e pegou outro pacote.
A mulher tentou pegar o pacote do menino e depois simulando espanto aproximou o rosto da prateleira de cima e exclamou: Nossa! Eles existem mesmo!
O menino parou com a birra atento e curioso. Eu disfarçando no corredor pra ver o que a mulher estava aprontando.
MAE: Você viu aquilo filho? Ela pegou o menino e colocou no colo. Tá vendo ali?! O menino óbvio que não viu nada e ela acrescentou: _Tá vendo ele correu! O duende do mercado. Depois a “louca” colocou o ouvido perto da prateleira e falou com o menino: Ele tá sussurrando que só aparece pra criança que não atrapalha o trabalho deles e deixa os pacotes de bolacha onde eles colocaram.
O menino é claro ficou quietinho e eu internamente parabenizava e admirava a forma lúdica dessa mulher educar seu filho.
(Publicado originalmente no Facebook em 17/09/2017)
O MENINO DA BICICLETA
Embora eu não tenha filhos isso nunca me impediu de ter um olhar critico para a criação de filhos dos outros. Pode ser bom senso, inteligência emocional, leituras, conhecimentos de psicologia, olhar analítico ou tudo isso junto. O que sei é que as vezes me espanta como pais mal educados reproduzem nos filhos a educação errada que receberam, mesmo carregados de amor e boas intenções (assim acredito).
Eu estava sentado num quiosque na entrada do parque, local escolhido para caminhada e leitura de um livro. O casal chegou com o menino de uns 3 ou 4 anos, a mulher com uma biclicleta grande pronta pra acompanhar o menino nas pedaladas e o homem carregando uma mini bicicleta do Ben10 com rodinhas.
Pararam na minha frente (sou escolhido pra ver certas cenas). O pai pôs a bicicletinha no chão o menino subiu e ele começou a empurrar encorajando o menino: "Vai filho, pelada!"
O menino assustado desceu da bicicleta. Estava com medo.
HOMEM: - Filho, você não vai andar?
O menino não respondeu.
MULHER: - Ele tá com medo - disse para o marido. Depois falou pro filho: - A Rebeca anda. Sua irmã é mais corajosa que você e anda melhor que você.
(Pronto o estrago estava feito na autoestima do menino. Me pergunto: Pra que comparar um filho com outro? O menino mesmo que de forma inconsciente ouve aquilo e pensa " Meus pais amam mais ela do que eu porque ela é corajosa e eu sou um fracassado").
Na minha opinião qualquer revista Crescer ensinaria isso a esses pais, mas brasileiro gosta de ler? Pior, se orgulha da própria ignorância, ainda que existam exceções.
MENINO: Já quase chorando ainda tenta argumentar "Ela é mais grande que eu"
HOMEM: Você é menino. E menino tem que ser mais corajoso. Sobe aqui e vamos tentar andar.
(Me pergunto ele está criando um filho ou um modelo competitivo?) Me recuso a referenciar nesse texto esse casal como pai e mãe. Pra mim são reprodutores, embora bem intencionados, não dominam o mínimo de psicologia infantil.
SER PAIS É MAIS DO QUE TER FILHOS.
(Publicado originalmente no Facebook em 01/10/2017)
O MENINO ANSIOSO
Eu no terminal de ónibus esperando. Encosta um ónibus e saem mãe e filho. O menino uns 4 anos, camiseta machão, boné, parecia um homenzinho...
ELE: Mãe, aqui é Cecap?
MÃE: É. Aqui é onde para o ônibus o Cecap é os prédios lá pra frente.
ELE: É os prédios vermelho?
MÃE: Sim. Daqui a pouco nois chega lá. Tem que pegar o outro ônibus
O menino ergueu os bracinhos, começou a comemorar. Oba! Nós vamos no prédio vermelho.
O ônibus chegou, eles subiram e eu também. Sentei atrás deles. O menino ansioso olhando pela janela esperando ver os prédios vermelhos. Alegre em sua simplicidade. Não via a hora de chegar.
(segundo a psicólogia crianças geralmente gostam de vermelho e adultos tendem a perder esse gosto. Ter vermelho como cor favorita é um indicativo de imaturidade cognitiva/ emocional).
Enfim chegamos no prédio vermelho. Os 3. Eu moro no prédio vermelho (na verdade bege, mas com azulejos vermelhos sob as janelas)
* Queria ter também a alegria e inocência dele. Sou adulto e deixei pra trás as coisas de menino.
(Publicado originalmente no Facebook em 19/12/2018)
A MENINA TRANQUILA
*Tendemos a antecipar problemas e as vezes eles de fato nem existem.
Na casa de uma amiga, uma criança sem querer quebrou o brinquedo de outra. Aquele clima, uma menininha chorosa se sentia culpada por quebrar o brinquedo da amiguinha (a rodinha de uma bicicleta). Os pais tentando consolar uma e esconder a verdade da outra. Melhor nem falar nada pra dona da bicicletinha pra ela não ficar chateada, etc.
O que aconteceu? Minutos depois a dona da bicicleta saiu pedalando e não ligou a minima pro fato. Ensinando a nós adultos uma lição que somente com a pureza das crianças são capazes de fazer. Sem lições de moral, sem arrogância. Apenas sendo naturais e fazendo o melhor dentro das possibilidades.
Eu, um mero observador aprendi.
(Publicado originalmente no Facebook em 26/12/2018)