Vida perfeita
Vida perfeita
Eu queria ter a vida perfeita. Quando criança, quando me questionavam o que eu queria ser quando crescer, eu dizia que queria ter um bom emprego, uma casa e um carro. Queria ser feliz. Mas nunca falei que queria me casar (o que é estranho, visto que você é incentivada a sonhar com esse tipo de coisa: casar, cuidar de casa e filhos. Afinal, sempre brinquei de casinha. Todavia, confesso que as minhas bonecas eram empoderadas – nem existia esse termo na época).
No entanto, a vida nem sempre segue os planos. Aos 18 anos já queria estar dirigindo. Aos 20 anos já queria ter meu carro, estar na faculdade, ter minha própria casa, numa cidade grande de preferência (nasci e me criei numa cidade pequena, o que não é tão ruim), talvez algum bichinho de estimação, ter um emprego legal (quem sabe, eu viveria de arte – escrevo essas singelas palavras desde a adolescência), alcançar meus sonhos.
Não tenho nada disso e já passei dos 18, 20 anos há um tempinho.
Ok. Eu tenho um emprego que gosto (e não me paga muito, mas é o que temos). Estou faculdade, porém não é o meu curso dos sonhos (mas era o que eu poderia estudar dentro das minhas circunstâncias e é o que a vida faz contigo: te dar um limão e espera que tu faças uma limonada aguada). Não sei dirigir (já tentei e nada). Ainda moro com os meus pais. E continuo sem planos de casar, até porque a minha solteirice já virou solitude.
Quando eu era criança, me falavam que a gente cresce rápido demais e que quanto mais nova se é, melhor é a fase da vida. Não entendi na época. Agora entendo.
Sempre fui uma criança traquina, feliz, leve. Com as bochechas queimadas do sol e cabelos bagunçados. Fui uma adolescente que se trancou em livros e palavras (eu era considerada estranha porque eu simplesmente lia como quem respirava). Foram épocas boas. Entendo o querem dizer com essa de que a melhor fase é a infância.
Agora entendo que a vida adulta não é tão fascinante assim. Agora entendo o peso e a responsabilidade que os anos trazem. Agora entendo as cobranças, as frustrações, as angústias, os medos e a falta de preparo. Agora entendo a dificuldade de tomar decisões, porque querendo ou não, essas decisões definirão quem somos e toda nossa vida. Não dar simplesmente para errar, fazer birra e alguém vir consertar (ninguém pode consertar as burrices que se faz sozinho). Eu não sei vocês, mas parece que eu caí de paraquedas na fase adulta e foi de cara no chão. A vida cuspiu na minha cara todos esses deveres e responsabilidades e eu não tenho o menor preparo para montar esse quebra-cabeça. A vida me disse “te vira” e eu não sei me virar.
A vida adulta é pura ilusão. É tudo mentira. Não seremos felizes, perfeitos, jovens o tempo todo. Seremos angustiados, chorosos e dramáticos a maior parte do tempo. Não tenho nada construído. Não tenho nada encaminhado. Não tenho mais sonhos fantasiosos. Só metas que não sei como cumprir. Matéria acumulada que só cresce e falta me engolir. A netflix não me prende mais. Os memes são cada vez mais sinceros e menos engraçados (não é só eu que estou perdida no mar da vida adulta).
Nada tenho nada. Não sou nada. Talvez eu tenha amanhã. Talvez eu seja algo daqui a dez anos. Eu não sei. Não sei de nada. Ou talvez eu não tenha nada. Vai saber.
O mundo parece muito grande para mim agora e eu me sinto cada dia mais minúscula. Eu queria descobrir quem criou essas regras e dá-lhe um tapa. Eu ia bater o pé. Usar a minha cara feia, ser teimosa como só eu sei ser e respondona e demonstrar minha total insatisfação.
A questão é que talvez não tenha o que dizer, afinal estou seguindo essas regras “estúpidas” ultimamente. Eu não costumo ir na direção esperada, nunca fui de seguir a multidão. Sou do contra. Mas eu tenho tentado me encaixar. Eis o meu erro.
Eu sou aquela que não segue padrões. Se todo mundo ama o sol, eu danço na chuva (meu cabelo ama água). Eu só quero liberdade. Talvez eu só sinta que não me encaixo nos padrões e quero me libertar da sombra deles. Eu não sei o que está acontecendo muito bem e como saberia? Eu sou nova ainda para entender um monte de coisas.
Eu só quero viver, como todo mundo. Então por que deveria me preocupar em agradar? Eu quero descansar e relaxar, curtir o sol que faz lá fora sem me preocupar em tomar qualquer decisão que não me deixe feliz.
Eu quero me descobrir primeiro antes de descobrir o mundo.