QUANDO PENSO QUE JÁ VI TUDO...
- Senhora, bom dia!
O homem me cutuvava no ombro (odeio), falando baixo. Olhei para ele, que seguiu:
- É que eu trabalho no La Maison e vinha no ônibus, né... aí procurei meu passecard, não encontrei e o cobrador mandou eu descer. Preciso ir trabalhar e já estou atrasado... será que a senhora pode me ajudar?
Imediatamente minha consciência acionou o alerta para a malandragem alheia. Mas não lhe dei confiança. O homem usava trajes de garçom, aquele bem clássico: calça escura e camisa branca, pano passado, e a gravatinha borboleta. Dessa vez havia um engano, a coisa era séria e a necessidade real. Estávamos no corredor da Avenida Bezerra de Menezes, na estação Padre Frota, sentido Centro.
Catei na bolsa algum trocado, mas a menor nota era de dez reais, além de duas moedas, uma de vinte e cinco e outra de cinco centavos. Perguntei-lhe:
- Qual ônibus você vai pegar?
Imaginei como solução irmos no mesmo ônibus e, assim, eu poderia pagar sua passagem. Para minha surpresa ele respondeu:
- Vou para o terminal do Antônio Bezerra.
Imaginei “pronto, a mentira.” Minha expressão de desconfiança poderia ter sido notada se ele me olhasse firmemente. Ora, se ele ia para o La Maison, por que Antônio Bezerra? E mais, estávamos na estação cujos ônibus seguiam para o lado oposto. Enquanto a cabeça fervilhava tentando entender a tramoia do sujeito, ele insistiu:
- Qualquer ajuda serve!
Apesar da desconfiança, me desprendi dos meus trinta centavos. E ele, agradecendo, dirigiu-se a outra pessoa. Fiquei observando a abordagem, ainda pensando em como chegaria ao La Maison, via terminal Antônio Bezerra... estranho. Será que abriu um restaurante da rede em Caucaia? Ou na Barra do Ceará, no Vila Velha, no Autran Nunes?
Após abordar mais uma pessoa, o homem, saindo do corredor de ônibus, seguiu a pé no sentido Centro, pela Bezerra de Menezes. Ou seja...
Ainda estou em choque. Estamos, então, diante de uma nova modalidade de pedintes? A pessoa se fantasia de garçom e conta uma historinha dessas, me engana e vai pra casa? Gente do céu!
E pensar que cogitei investir meus dez reais numa boa ação. Francamente!