Perfil de um lutador
Deixou-nos, ainda na plenitude de suas forças, em dois de junho do último ano, o ex-vereador Amadeu Côrtes Rossignoli. Laços de parentesco e profunda amizade nos uniam, e por isso ele confiou-me sua assessoria particular no que dissesse respeito à preparação de parte de sua correspondência ou mesmo de seus pronunciamentos.
Desde os tempos em que ele fora liderança comunitária, passando pelas três campanhas para vereança, pude eu escrever parte do que se apresentou ao público como proposta de trabalho. Amadeu, sempre extremado e emotivo, apresentava as ideias, e eu as redigia. Às vezes, fazia algumas observações, ponderava a necessidade de síntese, e ele, a custo, acabava aceitando. Os amigos sabíamos que tínhamos de ser pacientes quando precisávamos dissuadi-lo, pois o nosso Amadeu tinha um temperamento forte e, por isso, não convivia facilmente com o contraditório. É possível que essa faceta de seu caráter lhe tenha trazido desafetos, pois na vida, como na política, é preciso ponderar, negociar, adiar... E Amadeu tinha muita pressa... Pressa em realizar os seus projetos coletivos e pessoais. Algo talvez superior a ele lhe dissesse que tinha pouco tempo...
Assim, os amigos sempre lhe perdoaram, e eu diria que o amaram de verdade, porque sabiam que o Amadeu era corajoso, arrojado, capaz de perturbar insistentemente para solicitar algo em benefício de pessoas ou comunidades. E nisso ele era intransigente...
Quem o acompanhou sabe que seu celular estava sempre ligado e disponível às pessoas que o chamassem. E, diga-se a bem da verdade, não só nos momentos de campanha eleitoral em que há aquela cobiça de voto. Não! Amadeu era um homem disponível. É possível mesmo que isso lhe tenha valido um certo desconforto com as autoridades, pois a sua empreitada não compatibilizava bem com as funções de legislativo. E todos sabem que ele foi um vereador atuante em muitos bairros, com obras que custeou parcial ou integralmente. Talvez por isso esperasse uma reeleição tranquila no último pleito, o que não se confirmou nas urnas, deixando-o muito magoado, pois Amadeu, a par de seu lado emotivo, era também um homem racional e lhe foi difícil assimilar que trabalho não se resumisse em votos.
Passada a eleição, os amigos o vimos novamente cheio de projetos e não poucas pessoas lhe pediram que continuasse sua luta em prol das comunidades. Sobreveio, então, a nomeação para o Demlurb, e ele novamente se apresentou por inteiro a serviço do prefeito, que lhe confiara a tarefa. À distância ficamos sabendo das dificuldades e da sua presença permanente no órgão, que ele pretendia funcionasse modelarmente, chegando a levar almoço de casa e a alimentar-se na rua, acompanhando os trabalhadores.
O Demlurb lhe fora um prêmio pela dedicação a Tarcísio Delgado e ao PMDB, nas três eleições seguidas de que o atual prefeito participou. Dentre as qualidades de Amadeu, avultava a fidelidade ao partido, de cujas fileiras jamais se afastou, defendendo ardorosamente a Administração mesmo em momentos difíceis.
Amadeu era um homem determinado. Se tinha um projeto, era preciso lutar e conclamar todos a que lutassem também. E, nessas ocasiões, não aceitava esmorecimentos, exigindo a participação efetiva de quem estivesse com ele. Franco e espontâneo que era, às vezes não media palavras e costumava ferir susceptibilidades. Mas, se era alertado para o fato, ele se aproximava depois da pessoa e puxava conversa, e foi assim que muitos aprenderam a admirá-lo e a ter estima por ele.
Amadeu deixou essa lacuna para todos nós. Conforta-nos saber que ele veio e escreveu uma história que há de servir de exemplo de entusiasmo, honestidade e determinação na busca dos mais legítimos sonhos pessoais e coletivos. Conforta-nos saber que ele foi um vitorioso. Afinal, menino humilde de Mar de Espanha, Amadeu veio para Juiz de Fora, trabalhou muito, constituiu uma família a quem devotava amor extremo, ajudou pessoas e foi vereador em uma câmara de cidade grande, uma câmara recheada de doutores, que certamente lhe admiraram a escalada. Conforta-nos, também, imaginá-lo agora recompensado pelo Criador, que certamente já lhe confiou novos projetos.
Texto publicado em 9/6/2002, no Diário Regional, de Juiz de Fora