PESSEGADAS EM CAIXETAS
Minha avó paterna adorava fazer doces.
Do pomar enorme onde "reinei" quando em criança,vinham os mais variados frutos para o seu tacho de bronze (assim ela afirmava e tinha como garantia de que o era, a palavra da cigana que lhe vendera).
Tudo de que me lembro é que o dito não enferrujava mesmo.
As chamas ardendo em braseiro,a trempe,o tacho...
Nos terreiros sempre bem varridos,vó Maria.
Morena,magra,cambitos longos e finos,lenço à cabeça,manejando a pá de um metro e meio de comprimento num vai e vem naquele recipiente onde as peras de minha infância fundiam-se numa encorpada massa cor de âmbar.
Quase chegando ao ponto certo,eram arremessados sobre a massa um punhado de folhas frescas de figueira para realçar o sabor.
[ Aquele cheiro que incensava o quintal,em memória olfativa incensa ainda o quintal de minhas lembranças]
Uma parte daquele doce era retirado com um pouco de calda e ia para os potes de vidro para mais tarde besuntar as generosas fatias de pães caseiros assados em fornalhas.
[ Ao redor da mesa,meus primos e eu,nos deliciávamos com as iguarias de vovó,tecendo planos para brincadeiras ,falando de bocas cheias,abaixo de reprimendas,é claro ]
A parte que sobrava no tacho era depois "apurada" até que atingisse uma textura mais firme para ser armazenado nas caixetas.
[ Caixetas eram pequenas caixas de madeira,muito bem fechadas que iam para as prateleiras rústicas no sótão da casa,sob a determinação de vovó:
-Doces a serem consumidos no inverno,quando nem um fruto é produzido ]
Assim ficavam as caixetas com seus odores frutados visitadas por abelhas curiosas até que o longo e rigoroso inverno do Sul instigasse a doceira a "descer" os seus quitutes,e dar a cada um a maciez e cremosidade para passar no pão.
Todo este blá bla blá,apenas para dizer que estamos,minha esposa e eu, planejando fazer umas pessegadas.
Irati é conhecida como a cidade do pêssego.A produção é enorme e já é tradicional a Festa do Pêssego que acontece no início de dezembro,onde toneladas de frutos são comercializados.
Paralelo aos grandes pomares,na maioria das casas há sempre alguns pessegueiros dando o ar de sua graça.
Este é um dos pessegueiros de meu pequeno quintal.
Da qualidade "Branca salta caroço" é delicioso para ser degustado ao natural,embora seja possível fazer um bom doce dos mesmos.
[ Sempre detono alguns colhidos diretamente do pé.Saboreá-los ao frescor da tarde e ao som de gorjeios de sabiás,é algo que não tem preço ]
Depois vêm os "Pêssegos de natal". Amarelos,muito doces,ideais para compotas e pessegadas.
Tudo o que sei é que incorporei a saudosa velhinha dos pomares bem varridos e pilotarei numa panela algo que ao menos aproxime-se daquilo que ela elaborava com maestria.
Então, tomarei o meu café das três,com pão besuntado à manteiga e pessegada,imaginando ao meu redor a presença dos amigos recantistas que sempre têm a delicadeza de perder um tempinho com meus rabiscos.
Como não disponho das caixetas,não reservarei nada a ser consumido no proximo invermo.
Joel Gomes Teixeira
Minha avó paterna adorava fazer doces.
Do pomar enorme onde "reinei" quando em criança,vinham os mais variados frutos para o seu tacho de bronze (assim ela afirmava e tinha como garantia de que o era, a palavra da cigana que lhe vendera).
Tudo de que me lembro é que o dito não enferrujava mesmo.
As chamas ardendo em braseiro,a trempe,o tacho...
Nos terreiros sempre bem varridos,vó Maria.
Morena,magra,cambitos longos e finos,lenço à cabeça,manejando a pá de um metro e meio de comprimento num vai e vem naquele recipiente onde as peras de minha infância fundiam-se numa encorpada massa cor de âmbar.
Quase chegando ao ponto certo,eram arremessados sobre a massa um punhado de folhas frescas de figueira para realçar o sabor.
[ Aquele cheiro que incensava o quintal,em memória olfativa incensa ainda o quintal de minhas lembranças]
Uma parte daquele doce era retirado com um pouco de calda e ia para os potes de vidro para mais tarde besuntar as generosas fatias de pães caseiros assados em fornalhas.
[ Ao redor da mesa,meus primos e eu,nos deliciávamos com as iguarias de vovó,tecendo planos para brincadeiras ,falando de bocas cheias,abaixo de reprimendas,é claro ]
A parte que sobrava no tacho era depois "apurada" até que atingisse uma textura mais firme para ser armazenado nas caixetas.
[ Caixetas eram pequenas caixas de madeira,muito bem fechadas que iam para as prateleiras rústicas no sótão da casa,sob a determinação de vovó:
-Doces a serem consumidos no inverno,quando nem um fruto é produzido ]
Assim ficavam as caixetas com seus odores frutados visitadas por abelhas curiosas até que o longo e rigoroso inverno do Sul instigasse a doceira a "descer" os seus quitutes,e dar a cada um a maciez e cremosidade para passar no pão.
Todo este blá bla blá,apenas para dizer que estamos,minha esposa e eu, planejando fazer umas pessegadas.
Irati é conhecida como a cidade do pêssego.A produção é enorme e já é tradicional a Festa do Pêssego que acontece no início de dezembro,onde toneladas de frutos são comercializados.
Paralelo aos grandes pomares,na maioria das casas há sempre alguns pessegueiros dando o ar de sua graça.
Este é um dos pessegueiros de meu pequeno quintal.
Da qualidade "Branca salta caroço" é delicioso para ser degustado ao natural,embora seja possível fazer um bom doce dos mesmos.
[ Sempre detono alguns colhidos diretamente do pé.Saboreá-los ao frescor da tarde e ao som de gorjeios de sabiás,é algo que não tem preço ]
Depois vêm os "Pêssegos de natal". Amarelos,muito doces,ideais para compotas e pessegadas.
Tudo o que sei é que incorporei a saudosa velhinha dos pomares bem varridos e pilotarei numa panela algo que ao menos aproxime-se daquilo que ela elaborava com maestria.
Então, tomarei o meu café das três,com pão besuntado à manteiga e pessegada,imaginando ao meu redor a presença dos amigos recantistas que sempre têm a delicadeza de perder um tempinho com meus rabiscos.
Como não disponho das caixetas,não reservarei nada a ser consumido no proximo invermo.
Joel Gomes Teixeira