Geraldo Secundo, a Loteria e o Açúcar
- Crônica do dia 19-11-2018 -
Eu ainda estava de ressaca do dia anterior, e passando no centro da cidade.
Vejo Geraldo Secundo no bar de Darcy. Entrando e saindo, e quando saia, fazia um gesto com as duas mãos sinalizando para o céu, de forma expressiva, como quem lamentasse algo.
Eu, andando com preguiça. Estava quente que só a gota. Me demorando nos meus passos, e vendo aquela situação se repetir, acompanhado do Bola, fiquei curioso.
- Que peste é essa de Geraldo estendo os braços lá em Darcy? Será que tá brigando?
E Bola me responde:
- Tá não... Geraldo é cheio de “pantinho” mesmo... Vamos lá que vai ter motivo pra dar risada.
E fomos.
Chegando lá, Geraldo continuava no mesmo ritual. Tomava uma, de copo cheio, fazia careta, do amargo da cachaça, chupava um embu, que é sua fruta favorita, chacoalhava a cabeça e saia rumando à porta da rua com passos largos.
Chegando na porta da rua, ele sinalizava para o alto, com raiva, com as duas mãos, falava alguma coisa sozinho, que ninguém entendia e voltava.
- Bola, que diabo é isso?
- Não sei Cabeludo, vamos perguntar!
Entre um “catiripapo” e outro, encostamos em Geraldo, e, como sempre, eu fui o dono da abordagem:
- Companheiro, o que está acontecendo? Você está bem?
Geraldo, ainda com Pitu escorrendo do canto da boca, terminou de limpar, e falou:
- Cabeludo. Pelo amor que eu tenho à minha mãezinha... Você me acredita que eu faço o mesminho jogo, na Mega Sena, faz vinte anos?
- Sim Geraldo! Por que não acreditaria? Conheço muita gente que faz a mesma coisa...
Ele quase nem esperou eu terminar de falar.
- E você, Cabeludo, me acredita que esse jogo deu hoje?
Agora eu tinha entrado em êxtase!
- Sim, mas, e aí?
- E aí que eu tava me planejando, pra quando ganhar, se eu ganhasse agora, que você sabe que sempre tem a possibilidade da gente ganhar, e o ganho é uma coisa única, que quando a gente ganha tem que saber usar, porque se não, o ganho se transforma em derrota!
Quase que eu não entendi. Ele continuou:
- Pois bem... Eu não pude jogar ontem. Fui para a minha fazenda cuidar dos meus gadinhos, e dei o dinheiro para a mulher fazer o jogo.
Ele começou a me contar com um tom de desespero.
- E faltou a bobônica do açúcar em casa!
Nem precisava terminar de me contar.
- Geraldo!!!
A mulher dele chamou da varanda de casa. Que dá toda a visibilidade para o bar de Darcy. Ele nem sequer esperou ela terminar, e com uma raiva que eu nunca vi ele falar com a mulher, responde:
- Não fale comigo peste! Que eu ainda tô com raiva de você!
Graciliano Tolentino
- Crônica do dia 19-11-2018 -
Eu ainda estava de ressaca do dia anterior, e passando no centro da cidade.
Vejo Geraldo Secundo no bar de Darcy. Entrando e saindo, e quando saia, fazia um gesto com as duas mãos sinalizando para o céu, de forma expressiva, como quem lamentasse algo.
Eu, andando com preguiça. Estava quente que só a gota. Me demorando nos meus passos, e vendo aquela situação se repetir, acompanhado do Bola, fiquei curioso.
- Que peste é essa de Geraldo estendo os braços lá em Darcy? Será que tá brigando?
E Bola me responde:
- Tá não... Geraldo é cheio de “pantinho” mesmo... Vamos lá que vai ter motivo pra dar risada.
E fomos.
Chegando lá, Geraldo continuava no mesmo ritual. Tomava uma, de copo cheio, fazia careta, do amargo da cachaça, chupava um embu, que é sua fruta favorita, chacoalhava a cabeça e saia rumando à porta da rua com passos largos.
Chegando na porta da rua, ele sinalizava para o alto, com raiva, com as duas mãos, falava alguma coisa sozinho, que ninguém entendia e voltava.
- Bola, que diabo é isso?
- Não sei Cabeludo, vamos perguntar!
Entre um “catiripapo” e outro, encostamos em Geraldo, e, como sempre, eu fui o dono da abordagem:
- Companheiro, o que está acontecendo? Você está bem?
Geraldo, ainda com Pitu escorrendo do canto da boca, terminou de limpar, e falou:
- Cabeludo. Pelo amor que eu tenho à minha mãezinha... Você me acredita que eu faço o mesminho jogo, na Mega Sena, faz vinte anos?
- Sim Geraldo! Por que não acreditaria? Conheço muita gente que faz a mesma coisa...
Ele quase nem esperou eu terminar de falar.
- E você, Cabeludo, me acredita que esse jogo deu hoje?
Agora eu tinha entrado em êxtase!
- Sim, mas, e aí?
- E aí que eu tava me planejando, pra quando ganhar, se eu ganhasse agora, que você sabe que sempre tem a possibilidade da gente ganhar, e o ganho é uma coisa única, que quando a gente ganha tem que saber usar, porque se não, o ganho se transforma em derrota!
Quase que eu não entendi. Ele continuou:
- Pois bem... Eu não pude jogar ontem. Fui para a minha fazenda cuidar dos meus gadinhos, e dei o dinheiro para a mulher fazer o jogo.
Ele começou a me contar com um tom de desespero.
- E faltou a bobônica do açúcar em casa!
Nem precisava terminar de me contar.
- Geraldo!!!
A mulher dele chamou da varanda de casa. Que dá toda a visibilidade para o bar de Darcy. Ele nem sequer esperou ela terminar, e com uma raiva que eu nunca vi ele falar com a mulher, responde:
- Não fale comigo peste! Que eu ainda tô com raiva de você!
Graciliano Tolentino